People Watching: Você não está sozinho nessa

Por Áthila Lopes de Freitas.

A websérie de animação People Watching (2017-2018) foi exibida pela CBC, no Canadá, e no canal de Youtube Cracked no resto do mundo. Criada por um autor de pseudônimo Winston Rowntree, apresenta, em 2 temporadas e 20 episódios, as vidas de jovens adultos na faixa etária dos vinte e poucos anos aos trinta, que tentam lidar com diversas situações do dia a dia enquanto observamos seus triunfos, dúvidas e anseios sobre o que é estar vivo hoje.

 Winston é extremamente recluso e sua única imagem na internet é uma foto embaçada presente em seu site Subnormality, em que faz postagens esporádicas de webcomics desde 2007. Seus quadrinhos têm uma forte influência sobre a série e em sua animação mais cartunesca. A narrativa audiovisual é fluida e repleta de detalhes e referências à cultura pop em cada espaço disponível na tela. O diálogo dos personagens bem poderia ser um dos grandes balões de falas comuns nas tirinhas do autor.

Essa influência de diálogos longos, mas rápidos e até mesmo verborrágicos não são um demérito, e sim uma qualidade aos moldes de um filme de Richard Linklater ou Quentin Tarantino, em que os personagens têm grandes discussões entre si, geralmente envolvendo questões filosóficas ou pessoais, enquanto andam por algum cenário. Em qualquer livro sobre roteiros, o uso excessivo de palavras com longos monólogos discursivos seria desaprovado, mas Winston é bem-sucedido nisso ao apresentar seus pontos de vistas, aliados de várias piadas e referências que dão individualidade para cada personagem.

 Na dinâmica seguida pela série, há sempre um ou mais personagens em alguma situação de confronto com aspectos da sociedade contemporânea. Sejam situações fantasiosas ou não, sempre há espaço para debate e reflexão: uma noite de encontros-relâmpago que sai dos eixos quando todos resolvem ser honestos; um confessionário não religioso no meio da rua; uma conversa com versões alternativas de si mesmo em um museu; uma simples conversa com o irmão, ou uma grande discussão na sala de cinema que logo envolve todos os presentes no espetáculo. O ponto em comum é que todos esses recortes servem de palco para conversas interessantes de se observar e à reflexão.

Apesar de algumas das situações serem mais absurdas e engraçadas, também há espaço para temas mais sérios. Existem vários episódios focados em lidar e debater temas contemporâneos e importantes na sociedade atual, como depressão, ansiedade, suicídio, questões de identidade de gênero, feminismo, preconceito, amor, morte etc.

Por ser uma websérie com distribuição pelo Youtube, observam-se no formato da narrativa algumas características que já são comuns em mídias atuais feitas para consumo na internet. Não existe uma narrativa específica que conecta cada episódio, ainda que seja possível identificar uma continuidade que presenteia o espectador mais ávido, que assiste a todo o conteúdo na ordem cronológica. Este espectador percebe pequenos momentos que demonstram a existência de um universo em evolução. No entanto, com acontecimentos concretos dentro da trama o maior foco fica em cada episódio por si, de forma quase antológica, com atenção ao tema que vai ser discutido ou vivido pelos personagens.

Os personagens podem não ter uma grande evolução – uma característica negativa do formato que não parece ter tempo para grandes desenvolvimentos em espaços pequenos de tempo –, mas cada um tem sua própria identidade bem realizada e seu ponto de vista. As divergências entre as opiniões e pequenas características de cada personagem vão beneficiar o espectador que vê diferentes pontos de vista sobre vários temas. É bem comum os personagens passarem o total de dez minutos apenas conversando entre si e, para essa dinâmica funcionar, é muito importante uma boa construção de suas personalidades, e nisso a websérie tem grande êxito.

O sucesso da série está em seu próprio nome: dentro do simples ato de se observar a vida de algumas pessoas ficcionais, o espectador tem a capacidade de, sem dúvida, se identificar e se sentir visto. Ao abordar as expectativas sobre a vida adulta do século XXI, a obra estabelece vínculos com o público e demonstra aos espectadores que, principalmente nas dificuldades com o caos do mundo atual, eles não estão tão sozinhos quanto imaginam.

Foto/Reprodução: Reddit

Referências:

https://viruscomix.com/subnormality.html

https://viruscomix.com/page335.html

https://www.imdb.com/title/tt6565886/

People Watching – Série Completa. (Canada, 2017). Youtube.

Direção e Roteiro: Winston Rowntree

Elenco: Natalia Bushnik, Chantale Renee, Bracken Burns, Frederick Gietz, Scott Garland, Jon Blair, Frank Philips, Kate Conway, Andrew Knobbs, Hannan Younis, Neil Torrie, Jamie Spearman

Duração: 20 episódios de cerca de  5 a 14 minutos

A série se encontra disponível nessa playlist no Youtube

Trabalho produzido para Narrativas seriadas, do curso Cinema e Audiovisual.

athilalf@gmail.com

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