Por Agnes Lara.
Sucesso na TV japonesa há mais de 30 anos, Hajimete no Otsukai chega ao Brasil como Crescidinhos. Inspirado no livro ilustrado de mesmo nome, a premissa do reality show infantil é simples: acompanhar uma criança no desafio de completar uma missão pela primeira vez. As tarefas são corriqueiras, vão desde de preparar um suco até ir ao mercado sozinho, mas que, ao serem enfrentadas pelos pequenos, mais parecem jornadas de perseverança e superação. Com uma narração divertidíssima, embarcamos juntos a cada episódio e é impossível não se emocionar com as eventuais intempéries que os pequeninos enfrentam ao longo do caminho.
Apesar de parecer que as crianças estão sozinhas, uma equipe gigantesca as acompanha durante todo o trajeto e, por inocência da infância, elas nem notam que estão sendo seguidas e filmadas. A tarefa é dada verbalmente pelos pais e cabe à criança se lembrar de todos os passos para cumprir a missão com sucesso. E, para auxiliá-las durante o percurso, elas ganham um amuleto com uma palavra de incentivo para não se sentirem sozinhas – talvez isso seja apenas uma desculpa para camuflar o microfone. Caso a criança se confunda ou apresente muita dificuldade, o programa intervém de maneira didática. Foi o caso do garotinho encarregado de preparar um suco de tangerina: por alguns minutos, ele se esqueceu da tarefa e preferiu ficar brincando, até receber um telefonema de sua mãe o alertando sobre sua missão.
Ver crianças tão pequenas sozinhas pelas ruas é de arrepiar os cabelos. Sobretudo para os espectadores estrangeiros, que podem ficar desconfiados com a segurança do Japão e estranhar a cultura do país de incentivo à independência dos filhos. Para quem tem sobrinhos, irmãos e, principalmente, para quem é pai ou mãe e já estão acostumados com a imprevisibilidade das crianças, o reality é de partir o coração. Como não se emocionar com o menininho que deixou os peixes caírem duas vezes no chão durante a ida ao peixeiro? E a menininha que voltou chorando porque não encontrou o relojoeiro?
As crianças acabam recebendo ajuda da vizinhança que, muitas vezes, conhece os pais e acaba auxiliando os menores na tarefa. Mas não pense que isso tira o brilho da execução do desafio. Há de se impressionar com a expertise dos pequenos na hora de contornar os problemas que encontram no caminho, mesmo que a nossa vontade seja de levantar do sofá e ajudá-los naquela empreitada. Muitas crianças desenvolvem habilidades e quase sempre precisam fazer escolhas para resolver um ou mais problemas que não estavam previstos no roteiro. E é aí que está o objetivo do programa: apoiar a autonomia das crianças. Além de percorrer diferentes regiões do Japão, a série nos convida a refletir sobre a relação de pais e filhos.
Depois de acompanhar a tarefa que mais parece roteiro de cinema, é chegada a hora de voltar para a casa. A chegada das crianças é um momento mais emocionante, seja pelo alívio por completar a missão ou pela emoção dos pais pela volta dos filhos. Para aqueles que cumpriram com êxito, os pais rasgam elogios e olhares de orgulho. Mas, mesmo que elas não consigam cumprir todas as tarefas, não faltam palavras de incentivo. Os pais ficam aflitos até a chegada dos pequenos em casa e acabam sorrindo e cumprimentando seus pupilos cheios de orgulho depois da tarefa completa. As crianças visivelmente transbordam de alegria e se não conseguem, enchem os olhinhos de lágrimas.
A primeira tarefa é um ritual de passagem na primeira infância. Errar, passar por problemas e pedir ajuda faz parte do processo e todas elas são estimuladas pelo programa e pelos pais a tentar de novo. Antes mesmo de seguir em frente com o desafio, algumas crianças já caem no choro. O medo de fracassar e de ficar sozinha são pensamentos que passam pela mente de qualquer pessoa, ainda mais uma criança de 2 a 6 anos. Mas depois de uma conversa com os pais, elas são convencidas. Um deles, diante da dificuldade dos filhos em falar japonês, visto que a família mora no Japão há pouco tempo, chega a acompanhar o casal de irmãos até o ônibus de compras que perambula pelas ruas da vizinhança. Quando as crianças vencem o medo diante do fracasso, recomeçam o processo e conseguem realizar a tarefa, seus olhinhos brilham, seu corpo inteiro transborda alegria. O show não só apoia as crianças a se virarem sozinhas, mas também oferece aos espectadores a oportunidade de repensar o relacionamento ideal entre pais e filhos e educação infantil.
Com um tom bem-humorado e recheado de momentos fofos, a série é um convite a todos que admiram as peculiaridades da cultura japonesa como o respeito das crianças e adolescentes pelos mais velhos, a solidariedade dos cidadãos, a educação daquele país, o respeito às suas principais tradições, a repensar nossa educação familiar.
Crescidinhos já está no catálogo da Netflix, até então com 20 episódios de 10 a 20 minutos.