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A imagem é uma colagem com diversos elementos que se relacionam com o tema da matéria. Podemos observar uma imagem ampla do aglomerado como pano de fundo, sobreposto por um escrito "menos violência?" em letras variadas simulando um papel colorido. Também temos a presença de uma imagem de um homem de capacete preto e vestindo uma farda militar segurando um rifle em sua mão. Uma fotografia de uma pichação com "tá na paz de Deus" escrito, em uma mureta. Um megafone desenhado branco e grande colado na imagem e próximo dele temos uma fotografia de uma viatura da polícia em preto e branco.

Sentimento de segurança aumenta no Aglomerado da Serra

Terceira reportagem da série “Aglomerado da Serra: (In)segurança Pública” busca entender os fatores que levaram a essa percepção

No vídeo acima, Renato Rios Neto, Ten. Cel. Gilbran Maciel, Rogério Rêgo e Luiz Flávio Sapori falam sobre a diminuição de mortes no Aglomerado da Serra.

É consenso entre lideranças comunitárias, especialistas, jornalistas e policiais que os homicídios e a violência diminuíram consideravelmente no Aglomerado da Serra, na região Centro-Sul de Belo Horizonte, pelo menos desde o final da década de 2010. Antes disso, especialmente entre 2003 e 2008, tiroteios e mortes violentas eram rotina para os moradores da região. A morte de dois moradores não envolvidos com o tráfico, pelas mãos de policiais militares, em 2011, foi um ponto-chave para essa mudança. Mas com a escassez de dados específicos sobre a região, é difícil precisar o que aconteceu no Aglomerado da Serra. Se não é possível apontar apenas uma política pública que tenha sido efetiva no combate às mortes violentas, especialmente de jovens, na região. Esta reportagem busca compreender o que levou a essa maior sensação de segurança.

Quais os motivos?

Matar não é bom para os negócios

Não está claro o motivo pelo qual o aglomerado se tornou um lugar menos violento nos últimos anos, nem se teria realmente se tornado. Fato é que hoje há relatos de maior sensação de segurança. Uma das hipóteses levantadas é a de que o tráfico de drogas é mais responsável pela diminuição das mortes do que qualquer outro ator envolvido na Serra. Segundo especialistas e jornalistas que cobrem a área há anos, os gerentes das bocas e os líderes de gangues podem ter percebido que não é bom para o negócio de venda de entorpecentes resolver qualquer disputa com a morte do rival.

Renato Rios Neto, Vinícius Araújo e Luiz Flávio Sapori opinam sobre o porque da diminuição dos homicídios no Aglomerado da Serra.

Policiamento especializado

Já a resposta da Polícia Militar (PM) para o motivo da redução nos homicídios é a atuação especializada da corporação no aglomerado. A diferença da presença policial no complexo para outras regiões é o Grupo Especializado de Policiamento em Área de Risco (Gepar). A unidade, criada em 2002 e introduzida na Serra em 2003, é composta por 25 policiais que estão 24 horas por dia dentro da comunidade. 

Esses militares recebem treinamento para policiamento comunitário, conhecem bem a região, convivem com os moradores e percebem diariamente a dinâmica dos grupos criminosos. Segundo a PM, isso cria um senso de pertencimento, o que permite maior proximidade com a população. Por isso, as pessoas se dispõem a contribuir com informações que ajudem no combate ao crime e a trazer demandas que orientem a atuação da polícia. Segundo o capitão Mauro Lúcio, comandante do Gepar Serra, os agentes chegam até a ultrapassar as funções de prevenção e repressão, próprias da PM, e fazem as vezes de investigadores iniciais das ocorrências, chegando com mais facilidade à autoria e motivação dos crimes. No áudio abaixo, o militar, que também é morador do aglomerado, conta como a atuação do grupo em ocorrências de homicídio foi mudando ao longo dos anos.

Capitão Mauro Lúcio, comandante do Gepar Serra e morador do Aglomerado, sobre a mudança da atuação das forças de segurança em ocorrências de homicídio na região
Enquanto dava a entrevista o Capitão Mauro Lúcio,  vestido com a farda marrom da Polícia Militar e de máscara preta, sentado em sua mesa de escritório branca e sentado em sua cadeira acolchoada azul, ao lado de um computador ligado, conversa fazendo gestos.
Foto: Victor Silveira

Soma de esforços

A PM aponta o Gepar como uma peça dentro de uma dinâmica maior de coordenação entre as forças de segurança e as instituições. As informações apuradas inicialmente pelos militares ainda são trabalhadas pela Polícia Civil e pelo Ministério Público. Se o Judiciário julgar as conclusões válidas, concede mandados de busca e apreensão e de prisão contra os autores dos homicídios, o que auxilia por sua vez no trabalho das policiais. As autoridades de Segurança Pública veem que esse círculo vicioso funcionou no caso do Aglomerado da Serra. Na visão da polícia, a partir do momento que as lideranças do tráfico percebem que as disputas violentas têm consequências perante a lei, passam a resolver as disputas de outra forma. 

No vídeo a seguir, é abordado a atuação da polícia dentro do aglomerado pelo Ten. Cel. Gilbran Maciel e pelo Major Renato Quirino.

Um dos representantes e líderes comunitários da região, o vereador Gilson Guimarães, concorda com as forças de segurança. O parlamentar também vê o Gepar como essencial para a retomada da confiança na polícia por parte da população, o que por sua vez contribuiu para diminuir a violência.

Vereador Gilson Guimarães, eleito pelo Aglomerado da Serra, sobre o Gepar

Por outro lado, há quem pense que nenhuma política de segurança pública é responsável pela redução das mortes. Seja porque o único diferencial da atuação do Estado esteja justamente em como a polícia aborda os moradores, como pensa o líder comunitário Rogério Rêgo. Ou porque a criação do Gepar da Serra é bem anterior à diminuição dos homicídios, como na visão do especialista em segurança pública Luiz Flávio Sapori.

Luiz Flávio Sapori e Rogério Rêgo discorrem sobre as políticas de segurança pública do Aglomerado da Serra.

Projetos sociais e preventivos

Os projetos sociais que nasceram dentro da comunidade cumprem o papel de evitar que muitos desses jovens sejam atraídos pelo mundo do crime em primeiro lugar e tenham oportunidade de emprego mesmo em uma situação social difícil. Moradores com algum tipo de talento – no esporte e na dança –  tiveram a ideia de ensinar isso para as crianças e adolescentes. E essas iniciativas evoluíram para projetos coletivos.

O líder comunitário Rogério Rêgo aponta quais e as importância de alguns projetos sociais para o aglomerado. 

Fica Vivo!

A Secretaria de Justiça e Segurança Pública (Sejusp) indicou uma servidora da área de Política de Prevenção à Criminalidade para falar em nome da pasta sobre a redução da violência no Aglomerado da Serra. A secretaria preferiu comentar exclusivamente sobre o papel do Fica Vivo!, que é uma das principais iniciativas de prevenção a violência entre jovens desenvolvidas pelo governo de Minas. Instituído em 2002, inicialmente no Morro das Pedras, na região Oeste de Belo Horizonte, o programa busca combater os homicídios entre os jovens de 12 a 24 anos. 

O projeto atua principalmente fortalecendo a proteção social e oferecendo alternativas para as crianças e adolescentes de regiões mais vulneráveis. Os profissionais do projeto oferecem oficinas de esporte e de cultura e cursos profissionalizantes para esses jovens. Além disso, a equipe busca conversar individualmente com os jovens para tentar entender a realidade deles e propor soluções específicas para cada um. Há também projetos que levam os meninos e meninas a circular pela cidade, o que tem como objetivo que eles se apropriem dos espaços públicos. 

A base dessa metodologia é a mesma em todos os 28 territórios em que o projeto está presente, inclusive no Aglomerado da Serra. Segundo a diretora de Proteção da Juventude, Michelle Gangana, pelo fato do aglomerado ser muito extenso, cada vila demanda atividades que condizem com o contexto local. A diretora faz a comparação entre a Vila Fazendinha, que se assemelharia a uma cidade do interior, e a Vila Marçola, mais urbanizada e que por isso teria uma rede mais estruturada. Gangana afirma que o Fica Vivo! teve papel relevante para que menos jovens morressem na Serra, ao mostrar que tem como resolver desavenças sem ser matando, como explica no áudio abaixo.

Michelle Gangana, diretora de Proteção da Juventude da Sejusp, sobre o papel do Fica Vivo! na redução dos homicídios.

Apesar de reconhecer a importância do programa, o especialista em segurança pública e professor da PUC Minas, Luiz Flávio Sapori, não vê o Fica Vivo! como decisivo para a redução da violência, no caso específico do Aglomerado da Serra. Tendo atuado como secretário adjunto de Segurança de Minas entre 2003 e 2007, Sapori acompanhou de perto a expansão do projeto além da região inicial, o Morro das Pedras.

Não acredito que o Fica Vivo tenha impacto decisivo. Nunca teve relevância expressiva na região da Serra. O público atendido sempre foi muito restrito e não há nenhum outro projeto de prevenção social, seja estadual [ou] municipal que também tem destaque. [A Serra sempre foi] uma região que a gente não conseguia resultados tão expressivos em termos de redução da violência, como nós conseguimos em outras regiões, [depois] da implantação do Fica Vivo.

Luiz Flávio Sapori, especialista em segurança pública e professor da PUC Minas

Dados imprecisos

A sensação de que os crimes violentos diminuíram no aglomerado não se reflete necessariamente nos números de homicídios na última década, pelo menos de acordo com a Secretaria de Justiça e Segurança Pública (Sejusp). Em 2012, foram pelo menos oito assassinatos. Em 2021, sete. Esse número se mantém relativamente constante ao longo dos anos.

Com exceção de 2015, quando houve apenas uma morte. E também de 2016 e 2017, anos em que ocorreram confrontos de maior intensidade entre as gangues locais, o que representou uma alta considerável, especialmente nas vilas Santana do Cafezal e Nossa Senhora Aparecida, que abrigam os grupos envolvidos. É preciso destacar que dentro dessa conta, entram também homicídios passionais, por exemplo. Nem todas as mortes violentas estão relacionadas ao tráfico ou a desavenças entre as organizações criminosas da região.

Abaixo, o número de homicídios consumados por ano e por vila no Aglomerado da Serra, entre 2012 e 2021 (Fonte: Sejusp)

Abaixo, o mapa das oito vilas do Aglomerado da Serra, elaborado pela Polícia Militar. Cada círculo representa a área aproximada de cada vila e tem a cor correspondente à região no gráfico.

Os dados foram compilados a partir de uma planilha fornecida pela Sejusp, obtida por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI). No entanto, essas informações não são precisas. Primeiro, não existe uma contagem específica para todo o aglomerado. Por isso os números representam a soma das ocorrências nas oito vilas que compõem o complexo. Outro limitador é a falta de dados referentes ao período anterior a 2012. Isso porque as informações são compiladas com base no Registro de Eventos de Defesa Social (Reds), os boletins de ocorrência. E esse sistema só foi difundido em todo o estado em 2012. Antes disso, a contagem era feita por meio de outra metodologia, ainda que sobre administração do governo estadual.

A própria metodologia com que a base de dados da Sejusp é calculada é um outro motivo para a falta de precisão. Como os números vêm do banco de informações de boletins de ocorrência, o registro leva em conta somente as informações iniciais que a guarnição policial tem acesso durante a ocorrência. E não leva em conta os desdobramentos daquele caso ou as conclusões da investigação. Ou seja, esses números podem ser, na verdade, subnotificados. 

Além disso, a conta da secretaria estadual não bate com o que foi computado pela Polícia Militar, pelo menos nos anos de 2020 e 2021. Segundo o 22º Batalhão, responsável pelo Aglomerado da Serra, em 2020 houve apenas um homicídio dentro do aglomerado. E em 2021, foram cinco, sendo que apenas um seria motivado por disputas do tráfico de drogas. Os outros quatro seriam resultados de violência doméstica, como feminicídio. Em 21 de maio de 2022, o Aglomerado completou 140 dias sem homicídios, segundo a PM.

Era um marido que matou a mulher…Inclusive homicídios cometidos sob a égide do lar. Ou seja, em que a Polícia Militar pouco ou nada pode fazer em relação a prevenção desse homicídio.

Tenente-coronel Gilbran Maciel – Comandante do 22º Batalhão de Polícia Militar

Membros da sociedade civil criticam a burocracia e a pouca divulgação desses números pela PM. Argumentando que uma abertura maior seria importante para a definição de políticas públicas conjuntas. Uma alternativa para o registro da Segurança Pública de um homicídio consumado são as informações de mortes violentas compiladas pela prefeitura, a partir da base do SUS. O que também não é fácil de obter. 

Eu até questionei isso, porque a prefeitura muitas vezes não tem os dados do SUS. Esses dados quem tem acesso muitas vezes é a Polícia Militar. Mas da PM a gente não tem acesso e hoje a gente luta para poder ter esse acesso. Essa divulgação de dados de ocorrência muitas vezes não chega e aí ficamos fora dessa realidade.

Gilson Guimarães – Vereador

Contraste

Mesmo com a baixa confiabilidade, os números não deixam de mostrar a diferença da realidade social do aglomerado e do bairro que dá nome ao complexo. Entre 2012 e 2021, aconteceram 12 homicídios na Serra, segundo a Sejusp. Essa quantidade é a mesma registrada apenas em 2016 no conjunto das oito vilas. Na última década, foram 77 mortes violentas no aglomerado. Abaixo, a comparação entre o número de homicídios no Aglomerado da Serra e no bairro Serra entre 2012 e 2021, de acordo com a base de dados da Sejusp.

Menos roubos e furtos

A partir da mesma base de dados da Sejusp, é possível chegar a conclusão oposta na comparação entre o nível de criminalidade no Aglomerado da Serra e no bairro da Serra, dessa vez em relação a furtos e roubos. Esses crimes contra o patrimônio são mais comuns no bairro e são bem mais raros na comunidade. Em 2016, por exemplo, o conjunto de oito vilas registrou 24 roubos e 73 ocorrências de furto. No mesmo ano, no bairro Serra a secretaria contabilizou 379 roubos e 1168 furtos. 

O aglomerado é um lugar onde você pode ir, é um lugar tranquilo. Ali dentro não tem roubo, você não é roubado.

Gilson Guimarães – Vereador

O que os números mostram é confirmado pelos relatos de quem mora no aglomerado. Em parte, isso pode ser atribuído a uma determinação do tráfico de drogas, que proíbe, e pune com violência os criminosos que tentam roubar na região, para servir de exemplo para quem tentar o mesmo. Uma ordem que também tem motivação financeira: quanto mais pessoas assaltadas e furtadas, menos vendas de drogas. Ao mesmo tempo, há também a análise de que se deva ao fato do Aglomerado ser uma comunidade mais fechada a moradores de outras partes da cidade. E é raro que vizinhos roubem bens de outros vizinhos. 

Major Renato Quirino, Tenente Coronel Gilbran Maciel e Luiz Flávio Sapori abordam a diminuição dos crimes dentro do aglomerado.

Solução ainda parcial

Todos os relatos apontam para uma melhora, mas a segurança está longe de ser uma questão resolvida na região. Depois de 2011, os homicídios não deixaram de representar fatos relevantes no cotidiano do aglomerado. As histórias desses crimes muitas vezes estão ligadas a conflitos entre as diferentes vilas, mas também entre moradores da Serra e pessoas que vêm de fora. 

Mortes em bailes funk

Os bailes funk, que reúnem milhares de pessoas, são uma oportunidade para que inimigos de diferentes vilas ou regiões se encontrem. E quando há uma execução em eventos desse porte, as vidas de muitas pessoas são colocadas em risco. Em pelo menos três ocasiões na última década, situações parecidas terminaram em morte. 

Em março de 2013, um homem morreu e 13 pessoas ficaram feridas em um tiroteio durante um baile na esquina das ruas Bandonion e Capivari. Pelo menos 500 pessoas estavam no local quando quatro homens chegaram em motos e começaram a atirar. Entre os baleados, estava uma criança de seis anos.

Já em julho de 2017, na Vila Cafezal, menores de idade foram novamente envolvidos nesse tipo de ocorrência. Um adolescente de 14 anos morreu depois de levar um tiro nas costas, segundo testemunhas. Os tiros teriam sido disparados por traficantes, que atiravam contra a polícia, que foi acionada por denúncias que indicavam ostentação de armas e venda de drogas. Duas jovens e um outro rapaz também foram atingidos. 

Por fim, em dezembro de 2019, em um evento na Praça do Cardoso, um rapaz de 19 anos foi morto e outro de 23 ficou ferido. Segundo a polícia, a dupla morava na Pedreira Prado Lopes, e o crime seria motivado por disputas do tráfico daquela região. 

Nos trechos a seguir, o Major Renato Quirino, comandante da 127ª Companhia de Polícia Militar, e o jornalista Renato Rios Neto falam sobre as implicações negativas desses eventos. E o tenente-coronel Gilbran Maciel, comandante do 22º Batalhão, cita os casos que explicam a posição de atenção da polícia com os bailes funks, que seriam clandestinos na visão da corporação. Enquanto o líder comunitário Rogério Rêgo afirma que considera uma violência institucional a proibição dos bailes e outros eventos do tipo. 

Barril de pólvora

Recentemente, os confrontos atingiram picos de violência nos primeiros meses de 2016 e em meados de 2017. Moradores tiveram que conviver com tiroteios, restrições de circulação e fechamento de serviços públicos como postos de saúde. De acordo com a PM, em 2016 quatro gangues estavam em conflito: Del Rei, Pau Comeu, Sacramento e Bandonion. Já em 2017, o atrito foi protagonizado apenas por Del Rei e Pau Comeu, segundo a polícia.

Essas conflitos armaados não se devem necessariamente a disputas do mercado de entorpecentes. Essa ideia foi corroborada pelo comandante do Gepar da Serra, Capitão Mauro Lúcio, na época tenente. Em entrevista concedida em 2017, o militar apontou que a origem das trocas de tiros estava nas rixas históricas entre grupos de diferentes partes do aglomerado, que seriam desencadeadas por provocações e pequenos desentendimentos. Essa percepção é compartilhada também por lideranças comunitárias, jornalistas e especialistas. Independentemente da real motivação, 2016 e 2017 foram os anos que mais registraram homicídios no aglomerado: 12 e 14 assassinatos, respectivamente.

A seguir, o líder comunitário Rogério Rêgo, o especialista em segurança pública Luiz Flávio Sapori e o jornalista Vinícius Araújo descrevem suas visões sobre as histórias e motivações dos assassinatos na região.

Relações estremecidas

Especialmente nos períodos de maior conflito, a relação dos moradores com a polícia, celebrada como uma das chaves para a paz, pode ser um agravante da situação. Ao mesmo tempo que quem mora no aglomerado parabeniza a ação estratégica dos policiais, aponta também que ainda há casos de abordagens truculentas contra trabalhadores. Também há casos em que as incursões terminam na morte de suspeitos apontados pela polícia como pertencentes ao tráfico. Como retaliação, criminosos fazem atentados para perturbar o dia a dia do local. O que aconteceu mais recentemente em junho de 2021, quando traficantes incendiaram ônibus no aglomerado como resposta à morte de um rapaz de 18 anos, que segundo a PM, era envolvido no tráfico. 

No vídeo abaixo, o líder comunitário Rogério Rêgo e o jornalista Renato Rios Neto falam sobre a relação polícia/comunidade, que ainda é conflituosa.

Falta Estado

A atuação da Segurança Pública e as iniciativas da própria população do Aglomerado da Serra deram passos importantes na repressão e prevenção do crime,que resultaram em menos mortes violentas. Mas os lados envolvidos com a questão ainda falam em abandono de outros braços do Estado ao conjunto de vilas. Essa presença faz falta precisamente na criação de oportunidades para os jovens do aglomerado. É preciso criar condições espaciais e sociais para que eles não vejam no tráfico uma opção de renda e de vida melhor do que o trabalho e o estudo, como explica o vereador Gilson Guimarães no áudio abaixo.

Vereador Gilson Guimarães, sobre a falta de presença estatal na região

Segundo lideranças locais, a demanda por ações estatais vai desde o fornecimento de serviços públicos de melhor qualidade – como transporte – até incentivar a economia local. Políticas públicas de segurança que enxerguem a questão além da segurança propriamente dita.

O líder comunitário Rogério Rêgo fala sobre a falta de presença estatal na região, e o jornalista Renato Rios Neto sobre a ausência de uma política pública específica da área de segurança, nos trechos abaixo.

Juventude vulnerável

Se a manutenção da paz depende que os jovens tenham oportunidades de vida, ainda há uma série de obstáculos no contexto social dos adolescentes do Aglomerado da Serra que dificultam isso. A região tem um dos maiores Índices de Vulnerabilidade Juvenil (IVJ) em Belo Horizonte. O índice vai de zero a cem, e entre os 40 territórios da cidade, a região que inclui o Aglomerado da Serra é a quinta com maior pontuação, com 57, ao lado de outras duas áreas. Além do conjunto da Serra, também fazem parte desse território as vilas Acaba Mundo, Pindura Saia, Santa Isabel e Fumec.

A prefeitura da capital fez esse cálculo em 2016, em parceria com o Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública (Crisp) da UFMG. O IVJ leva em conta sete indicadores, tendo como referência dados de 2015. Quantas pessoas de 10 a 14 anos estão ocupadas; a renda domiciliar média das famílias; evasão escolar; taxa de homicídios entre homens de 15 a 29 anos; taxa de fecundidade das meninas entre 15 e 19 anos; a porcentagem de jovens entre a população geral; e quantos alunos do ensino médio têm a idade acima da esperada para a série na qual estão matriculados. No território onde a Serra está, cada família ganha em média R$ 1.341,23 por mês, e a taxa de fecunidade entre adolescentes é de 21,31 a cada cem.

Futuro

Referência de vida

Na visão de quem mora ou trabalha com o aglomerado, tão importante quanto qualquer política pública é evitar que os jovens vejam no traficante alguém em quem se inspirar. Para que o criminoso não represente um futuro que a criança e o adolescente veja como uma alternativa válida para a realidade dele. O trabalho dos projetos sociais e da própria polícia contribui para que o jovem veja que esse caminho não vale a pena. A partir do exemplo de outra pessoa ou por meio de uma capacitação.

No vídeo a seguir, o Major Renato Quirino, comandante da 127ª Companhia, explica porque acredita que os seus policiais são bons exemplos para os jovens da Serra. E o líder comunitário Rogério Rêgo fala sobre a importância das referências de vida para as crianças e adolescentes do aglomerado.

A educação tem um papel fundamental nesse contexto, na visão do vereador Gilson Guimarães.

Vereador Gilson Guimarães, sobre os projetos voltados para a educação

Caminho certo

Mesmo discordando entre si sobre o que levou a um Aglomerado da Serra menos violento na última década, polícia, profissionais de imprensa, moradores e especialistas concordam que é um caminho correto, que deve continuar sendo seguido. No termo usado pelo professor da PUC Minas Luiz Flávio Sapori, se trata de uma “janela de oportunidade” que raramente se abre outra vez. A pacificação das vilas abre espaço para que os projetos sociais atraiam os jovens e consigam dar alternativas de vida para eles, seja para buscar um emprego ou seguir estudando. Ao mesmo tempo em que a Segurança Pública tem a oportunidade de avaliar as ações que levaram aos resultados positivos e replicar o círculo vicioso que funciona entre a repressão severa dos crimes de homicídio e uma polícia comunitária que trabalhe cada vez mais alinhada com a população.

No vídeo abaixo, o tenente-coronel Gilbran Maciel e o especialista Luiz Flávio Sapori explicam como veem o futuro da segurança pública no Aglomerado da Serra. 


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Esta série de reportagens foi produzida por Ana Mendonça, Bernardo Drummond, Felipe Quintella, Marcelo de Angelis, Pedro Lovisi e Victor Silveira como Trabalho de Conclusão de Curso de Jornalismo da PUC Minas, sob orientação da professora Fernanda Nalon Sanglard.

Colab PUC Minas

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