Um Total Conhecido: Dylan se torna elétrico!

Por Ana Clara Torres

Baseado no livro de Elijah Wald, “Dylan Goes Electric! Newport, Seeger, Dylan and the Night That Split the Sixties”, o filme biográfico do enigmático e revolucionário Bob Dylan, “A Complete Unknown”, foi dirigido por James Mangold, co-escrito por ele e Jay Cocks. A trama retrata os acontecimentos da vida de Bobby durante a primeira metade da década de 60, quando ele agitava a cena folk, em inúmeros sentidos.

Após cinco anos de preparação, marcados por aulas intensivas de violão e guitarra, Timothée Chalamet vive Bob Dylan e o interpreta dando destaque às características peculiares e brilhantes do músico, que sempre dividiu opiniões. Chalamet como Dylan é fascinante. Ele mergulha na caracterização, se aventura no figurino, passeia pelos traços em comum com o artista e se debruça nas técnicas vocais de Bobby, conhecido por cantar de uma maneira muito específica e única. Timmy foi indicado, pela segunda vez, ao Oscar de Melhor Ator, ao BAFTA, ao Critics’ Choice e ao Golden Globe por seu papel no longa. Além de ter vencido o Screen Actors Guild Award de Melhor Ator.

O foco da história não é Robert Allen Zimmerman – nome de registro do músico – mas, na verdade, a figura misteriosa e performática de Bob Dylan. O filme adota um ponto de vista em que Bobby era, realmente, um completo desconhecido, como uma pedra rolante, nas palavras do próprio em um de seus maiores sucessos: “Like a Rolling Stone”. Questões do passado de Dylan não eram compartilhadas nem em seus relacionamentos pessoais, suas próprias parceiras – Sylvie Russo (Elle Fanning) e Joan Baez (Monica Barbaro) – se questionavam se realmente o conheciam.

De origem folclórica e camponesa, o Folk utiliza instrumentos acústicos, em sua maioria de corda ou sopro. Bob Dylan é um artista folk. A admiração e o amor pelo estilo musical são mostrados desde as primeiras cenas do filme, nas quais Bobby visita um dos músicos que mais admira: Woody Guthrie (Scoot McNairy), que estava internado em um hospital. A cena dos artistas juntos, ao lado do cantor Pete Seeger (Edward Norton), transmite a conexão e o respeito, vividos pela música. Após o encontro, Dylan se conecta a Seeger e desbrava a cena folk dos Estados Unidos ao lado do músico, que se torna um parceiro.

Bobby se tornou um Total Conhecido na cena Folk. O público se sentia tocado, levados a uma realidade em que apenas o Folk importava e a música era o foco. Bob Dylan tocou em diversos festivais Folk na década de 60 e se consolidou como um artista importante, o queridinho do público, desejado por eles. Entretanto, o descrito “uma pedra rolante”, viria a inovar o estilo musical. Para Dylan, o Folk poderia ir além e ele fez com que fosse. James Mangold trouxe aos detalhes do longa, notados desde a fotografia até a trilha sonora, a paixão do artista pelo Folk e a sede de Bobby por viver o estilo musical.

Bob Dylan é um poeta. Suas letras são protestos, são profundas, reflexivas. Em suas melodias, uma mistura do Folk, do Rock e do Blues. Responsável por inserir a guitarra elétrica em um estilo musical tão acústico, Dylan chegou a ser chamado de “Judas” por entusiastas do Folk. Essa transição é muito bem representada em “Um Completo Desconhecido”, o espectador é inserido nos dois lados da moeda, através de uma apresentação de Bobby em um festival. O som é bem feito e a música é espetacular, porém, a plateia não buscava, nem esperava, esse tipo de melodia, eles queriam o tradicional Folk, não mudanças.

No palco, Chalamet é Dylan. Os elementos utilizados em cena reforçam as semelhanças. O figurino é excepcional, é Bob Dylan por inteiro, somando-se de forma brilhante a caracterização, a voz de Timothée, que se transforma em Dylan como uma espécie de mágica e ao uso da inesquecível e expressiva gaita.No momento de rejeição pela adição de novos elementos, como a guitarra elétrica, o ator transmite, através do olhar e das expressões, os conceitos defendidos por Bobby em sua trajetória de vida e música. Ele tinha convicção do que estava fazendo, ele amava, defendia e honrava o Folk e, com isso, o revolucionou e o reinventou.

Em 2001, Bob Dylan afirmou: “Escrevo canções, toco no palco e gravo discos. É isso. O resto não é da conta de ninguém”. Isso é Dylan, isso o torna um Total Conhecido. Em 2016, ele venceu o Prêmio Nobel de Literatura por “ter criado novas expressões poéticas dentro da grande tradição da canção americana”. Nas cenas de crédito do filme, é citado que o músico não compareceu à cerimônia de premiação. Ele aceitou e recebeu o prêmio somente em abril de 2017, através de uma reunião particular com a Academia Sueca. Um Total Conhecido, isso o torna Dylan.

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