“No Escuro”: um convite a uma imersão intimista nos sentimentos da atual geração

Por: Ana Paula Valentim

Carol Biazin lançou "Amor Traumatizado" e anuncia novo álbum "No Escuro, Quem É Você?" - AgitoPOP

O terceiro álbum de pop da artista paranaense Carol Biazin intitulado No Escuro, lançado em 22 de agosto de 2024, conta com 10 faixas musicais nas quais a cantora explora temas íntimos e pessoais relacionados à família, histórias de amor, superação, liquidez de relacionamentos, religião, aprendizados e receios sobre seus sonhos. Ainda sua autenticidade e suas novas paixões sendo uma mulher natural do interior e residente da maior metrópole da América Latina: São Paulo.

No Escuro nasceu a partir de um processo de autoconhecimento realizado por Biazin, a sós, e se desenvolveu quando ela se reuniu com seus amigos artistas em Paraty, no Rio de Janeiro, para produzir novas músicas. Após retornar para a capital paulista, ela concluiu o projeto em estúdio e, no dia 12 de junho de 2024, foi lançada a faixa Amor Traumatizado isoladamente que, inclusive, foi performada por Biazin em um episódio de “Família é Tudo”, uma das novelas das 7 da Rede Globo. Essa canção aborda a volatilidade dos relacionamentos na atualidade, a sua curta duração e baixa manutenção, sendo que pares românticos rompem entre si aos primeiros sinais de desafios apresentados, como conflitos de opiniões, estresse, ausência, má comunicação e pouca dedicação. No clipe, Carol Biazin está em um bar consolando pessoas que estão abaladas em decorrência de um término e, na intenção de se curarem, dançam com outros indivíduos desconhecidos. Essa dinâmica é uma alusão à sociedade moderna, na qual as pessoas inserem-se em um novo namoro ou nova conexão de maneira abrupta, saltando as etapas necessárias para se atingir a superação de forma saudável, que são: negação, raiva, barganha, depressão e aceitação. Essas fases são evitadas, por conta da pressa em preencher um vazio com amores que apresentam-se eufóricos inicialmente, contudo são rasos em sua essência. 

De acordo com o filósofo Zygmunt Bauman, a modernidade líquida está baseada em uma sociedade cujas relações são efêmeras e pouco duradouras, principalmente devido ao capitalismo que interfere na economia, política e nas relações humanas tornando a população refém a um sistema de trabalho exploratório que visa apenas lucros, independente de desigualdades sociais e degradações ambientais. Nesse sentido, as relações amorosas não são fixas, elas são frágeis e breves, pois os casais não buscam mais fortalecê-las por meio do diálogo e da compreensão. Desse modo, a falta de confiança e a insegurança desencadeadas pelo processo de globalização prevalecem e se sobrepõem  aos esforços para preservar um relacionamento sólido, tornando-os transitórios e fluidos, com pouca flexibilidade – fator que corrobora para a eclosão de um ciclo vicioso de novas frustrações e desamores.

Análogo a isso, a artista interiorana se desdobra sobre a falta de responsabilidade afetiva, atitudes individualistas e relações pouco estáveis da era contemporânea em sua faixa Corações de Pedra, que conta com a colaboração da cantora e compositora de rap Duquesa. Em alguns versos, elas afirmam que as relações atuais são de vidro, ilustrando sua fragilidade, questionam se a recorrente busca por outras experiências íntimas, que servem como fuga da solidão, realmente funcionam e narram o medo e o receio de se conectar com alguém por meio de uma metáfora elaborada no verso “Como é que eu mergulho de cabeça se tá tudo tão raso?” evidenciando a falta de profundidade de vínculos que aparentam ser repletos de sentimentos, entretanto não passam de ilusões. Essas as quais potencialmente causarão decepções que levarão o coração a ser quebrado e, posteriormente, petrificado sendo imune à sensibilidade.

Carol Biazin destaca, assim, que não consegue ser superficial, frase que se encaixa também com sua música Conversei com Deus, na qual ela revela que, em um momento íntimo com a divindade, compreende que não precisa deixar de ser ela mesma, ainda que duvide de si e esteja em uma sociedade que prega um padrão de comportamentos já imposto. A artista também canta sobre inseguranças em Não Quero Me Apaixonar, pois, apesar de planejar se relacionar com alguém esporadicamente, ela não consegue não se apegar, e deseja estar sempre com o ser amado. Além do mais, flexiona sobre o mito de que a linha de chegada que leva ao sucesso e à prosperidade, pois na verdade o que importa é o que se vive diariamente, o processo, cada movimento que se faz e torna mais próxima a realização de um desejo ou sonho. 

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Infelizmente os sonhos podem tornar-se frustrações, tal qual é exposto na canção Você que representa as decepções recorrentes da vida. Muitas vezes elas são sentidas após desilusões desencadeadas de lutas incessantes de pessoas que não medem esforços para realizar seus desejos, porém acabam despencando de muito alto quando já estavam quase concretizando-os. Logo, “quem me deu asas me soltou a mão” é um verso que explicita como pode-se fazer de tudo por um sonho, o mesmo que traria felicidade e orgulho; entretanto, ele pode trair o sonhador e acabar causando dor e desânimo.

As demais canções do álbum, como Low Profile, 1697 e Tr*ns*nte são declarações de amor que Biazin faz a mulher que ama, e isso só reforça sua coragem e autenticidade para expôr seus sentimentos em um mundo repleto de pessoas preconceituosas e retrógradas que não compreendem o quão vasto é o campo do amor; o amor não discrimina, nem aprisiona, ele liberta. 

Enfim, a música Casula é uma variação da palavra “caçula”, pois, ao escrever uma carta para seu irmão, a artista escreve “irmã casula” ao invés de irmã caçula, fato que ironicamente leva à metáfora de que ele é o casulo dela, um lugar onde ela se sente protegida. Essa faixa se conecta com Menina do Interior pela razão de que essa obra declara a saudade de casa, a saudade da família e da infância tendo em vista que, atualmente, a vida dela e de muitas pessoas é em uma cidade grande que, de certa forma, suga-as e não permite que elas sejam elas mesmas em uma rotina no modo automático, guiada pelo capitalismo e pela frieza das conexões. Portanto, ao retornarem para casa, se afastarem do universo caótico da capital e ficarem apenas em suas próprias companhias, o que resta é a seguinte questão: no escuro, quem é você?

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