Por: João Fernandes
“Nada” é um curta-metragem dirigido por Gabriel Martins e produzido pela Filmes de Plástico. Com 27 minutos de duração, o filme se destaca pela sua abordagem minimalista e profunda, explorando temas como o vazio existencial, a alienação e a busca por significado em meio à aparente banalidade do cotidiano.
A narrativa centra-se na personagem principal, interpretada por Clara Lima, que enfrenta uma crise existencial enquanto lida com a monotonia de sua vida. O título, “Nada”, reflete a sensação de vazio e a falta de propósito que permeia a história. A protagonista, uma jovem negra de periferia, passa seus dias de forma mecânica, sem grandes ambições ou perspectivas, até que um evento catalisador a obriga a confrontar seus sentimentos mais profundos e questionar seu lugar no mundo.
Gabriel Martins adota um estilo contemplativo e realista, utilizando longas tomadas e um ritmo deliberadamente lento para capturar a rotina tediosa da protagonista. A cinematografia, assinada por Leonardo Feliciano, é marcada por uma paleta de cores apagadas, que reforça a sensação de apatia e melancolia. A câmera frequentemente se fixa em detalhes aparentemente insignificantes, como o barulho de um ventilador ou a repetição de gestos cotidianos, sublinhando o caráter introspectivo e reflexivo do filme.
Clara Lima entrega uma performance sutil e contida, que comunica mais através de expressões faciais e linguagem corporal do que por meio de diálogos. Sua atuação transmite de forma convincente o estado de desolação e busca interna da personagem, tornando-a uma figura com qual muitos espectadores podem se identificar. A escolha de uma atriz não profissional adiciona uma camada de autenticidade e veracidade ao retrato da protagonista.
“Nada” também funciona como uma crítica social, abordando as limitações impostas pelas condições socioeconômicas e o racismo estrutural. A ambientação na periferia, a falta de oportunidades e a sensação de estagnação refletem a realidade de muitos jovens brasileiros, especialmente aqueles de origem negra e de classe baixa. O filme não oferece soluções fáceis, mas convida à reflexão sobre as injustiças e desigualdades que moldam a vida de tantas pessoas.
A força de “Nada” reside na sua capacidade de transformar o ordinário em um espaço de reflexão filosófica. Através de um olhar atento sobre o cotidiano, o filme revela a profundidade oculta na superfície da vida aparentemente banal. Ele nos desafia a olhar além do superficial e a reconhecer a complexidade e o valor inerente nas experiências humanas mais simples.
“Nada” é um exemplo marcante de como o cinema pode explorar questões existenciais e sociais de forma poética e impactante. Com uma direção sensível, uma atuação poderosa e uma abordagem visualmente evocativa, Gabriel Martins oferece uma meditação profunda sobre o sentido da vida e a busca por identidade e propósito. É um filme que, apesar de seu ritmo deliberado e sua estética minimalista, deixa uma impressão duradoura e significativa.