Por: Maria Eduarda Batista
Dirigido pelo renomado cineasta cearense Karim Aïnouz, o longa-metragem Motel Destino, concorrente da Palma de Ouro no Festival de Cannes, foi ovacionado por 12 minutos após sua exibição no festival, em abril deste ano (2024). A trama gira em torno de Heraldo (Iago Xavier), um jovem que se refugia em um motel de beira de estrada no litoral, o Motel Destino, onde cria um forte laço com Dayana (Nataly Rocha), esposa do cruel e temperamental Elias (Fábio Assunção), dono do motel. Ao explorar temas universais como o desejo, a luta pela liberdade e a sexualidade, o filme insere o cinema brasileiro e nordestino em posição de destaque no cenário internacional.
O filme de Aïnouz é, em todas as palavras, um produto genuinamente brasileiro. Ao se inspirar no cinema de gênero noir estadunidense, o diretor subverte todo e qualquer padrão existente nos filmes do exterior, adotando uma estética que
valoriza o tropical, a vibração e o calor do Brasil, muito inspirado nos filmes da pornochanchada. A fotografia de Helène Louvart definitivamente se destaca, a filmagem em película, em 16 e 8 milímetros, gera um contraste e uma saturação às
cores extravagantes de vermelho e azul que invadem o motel, criando uma tensão visual na mistura das cores quentes das luzes do ambiente, simbolizando a paixão e a violência que permeiam a trama. Dessa forma, o motel se transforma em um verdadeiro personagem, um lugar diferente do litoral cearense, onde tudo pode acontecer e onde ronda o perigo que invade os personagens de Iago Xavier e Nataly Rocha.
A relação de solidariedade entre Heraldo e Dayana, ambos submetidos a Elias, seja em uma relação de funcionário e empregado ou dentro de um relacionamento abusivo, se dá mediante à sua intimidade física, durante o sexo. A
força da relação entre Heraldo e Dayana acontece, primordialmente, quando eles transam, e é nesses momentos em que eles traçam seus planos de liberdade para se livrarem da subordinação a Elias. Apesar de o motel ser o acaso que salva Heraldo da morte e o apresenta a Dayana (não é à toa que o estabelecimento se chama Motel Destino), o jovem ainda procura encontrar seu lugar no mundo e sair das margens em que é colocado vivendo no litoral cearense.
Motel Destino é, esteticamente, uma obra de arte. O filme, permeado de cores extravagantes e corpos nus destacados por luzes de cores quentes assume uma estética tropical típica de pinturas de Tarsila do Amaral. Os quadros pintados
pela dona da gangue, espalhados pelo motel, com sua representação de animais selvagens que habitam o Ceará em cores extravagantes e vivas intensificam tal estética, assumidamente brasileira. As cores dos figurinos dos personagens dentro do motel, todos em cores que complementam a tintura das paredes do estabelecimento, realçam o pertencimento dos personagens ao lugar, além de intensificar o contraste das cores que induzem aos sentimentos de desejo e tensão.
Toda a riqueza que existe no cinema brasileiro está em Motel Destino, sem nenhuma pequena influência do cinema internacional. Ser Motel Destino o filme que representou o Brasil em Cannes em 2024 é a prova de que a cultura nacional e nordestina pode ser bem reconhecida internacionalmente, com toda sua força e beleza que só podem ser brasileiras.