Por: Maria Paula Resende Morais
No início de julho, a terceira temporada de Bridgerton entrou para a lista de séries de língua inglesa mais assistidas na Netflix. O que apenas demonstra a popularidade e a influência da série sobre o público.
A terceira temporada de Bridgerton foi lançada em duas partes sendo a primeira estreada em 16 de maio e a segunda em 13 de junho, ambas com quatro episódios. A trama acompanha o casal Colin Bridgerton e Penelope Featherington construindo um romance entre dois amigos de longa data.
Com um estilo conhecido por “friends to lovers” os dois passam mais tempo juntos em situações que os deixa envergonhados afetivamente despertando em Colin um sentimento que o mesmo não havia experimentado antes.
Essa é a trama que se desenrola ao longo dos oito episódios, porém algumas características específicas singularizam esta temporada se comparada às outras. Diferente das outras protagonistas, Penelope Featherington é a única protagonista gorda entre as temporadas disponíveis.
Em Bridgerton, os espectadores são confrontados com realidades que superam as vivências da Regência, momento histórico em que se passaria à história. Entretanto, se aproximam de uma realidade contemporânea que tenta incluir diversas realidades de raça, gênero, corpos e sexualidade em uma camada de poder e soberania da alta sociedade londrina. Apesar dessa ideia de mudança, Penelope é a única, entre os protagonistas, que pode ser considerada uma mulher gorda. Penelope, então, pode ser encarada como um símbolo que representa, de certa forma, sua posição como personagem da série.
Para realização da análise, fundamenta-se a ideia apresentada por Fernanda Carrera e a ideia da Roleta Interseccional, que funciona como uma metáfora utilizada para descrever como diferentes identidades sociais e categorias de opressão, como raça, gênero, classe social, sexualidade, interagem de maneira complexa e entrelaçada para influenciar a vida das pessoas. Ao aplicar essa metodologia na personagem Penelope Featherington é possível identificar três categorias de identidade principais: gênero, classe e peso.
Para trabalhar esses atravessamentos interseccionais a psicóloga e professora Valeska Zanello propõe a estrutura da prateleira do amor em sua obra A Prateleira do Amor: Sobre Mulheres, Homens e Relações (2022). Essa prateleira aborda as dinâmicas de gênero, relacionamentos afetivos e as expectativas sociais relacionadas ao amor e à sexualidade. Essa metáfora ilustra a forma como as normas sociais e culturais moldam a percepção das mulheres sobre o amor, o desejo e o valor próprio em relações afetivas.
Em se tratando de Penelope, a obra de Zanello (2022) reflete consideravelmente um posicionamento que, uma mulher com características semelhantes à da personagem não seria digna de um relacionamento a menos que fosse convencional ou dificultoso. “Produtos culturais direcionados às meninas e às mulheres elegem como tema central o amor, conquistar um homem (ou ser muito infeliz, feia ou desastrada por ser solteira) e a busca e o uso da beleza para seduzir e encantar.” (ZANELLO, 2022).
As principais conclusões dessa análise podem ser obtidas através do primeiro episódio da terceira temporada uma vez que, é através dele que o espectador decide se quer ou não continuar consumindo o conteúdo midiático seriado.
Apesar de vários momentos no primeiro episódio que Penélope é confrontada com as intersecções da Roleta e da Prateleira, observa-se um momento em que a garota tenta se destacar e mudar de visual em um baile da alta sociedade. Além de ter surpreendido a todos pela mudança visual, gerando comentários que desvinculam a maneira como se apresentou no baile da maneira comumente vista socialmente. Penelope também gera ciúmes e acaba tendo o vestido rasgado seguido de um comentário cruel vindo de Cressida, outra personagem da alta sociedade.
Cressida, uma jovem com mais dinheiro e prestígio social rasga o vestido de Penelope e sugere que foi um acidente dizendo que “talvez, se não tivesse usado um tecido tão barato ele não teria rasgado” reforçando que Penelope não teria dinheiro para se vestir com roupas melhores e um modelo bonito não resolveria o “problema” social em que se encontrava.
Esse argumento pode ser reforçado ainda na maneira em que a cena se apresenta: Penelope no canto do quadro e mais baixa do que Cressida que está no centro da tela em evidência.
Diante da abordagem teórica apresentada, é possível perceber que, mesmo com tantos atravessamentos, identificados com a Roleta Interseccional de Carrera (2021), Penelope é posicionada na prateleira do amor de Zanello (2022), em sua maior parte, pela classe social que ocupa.
Portanto, mesmo que, na atualidade perceba-se a discussão de pautas como o culto à magreza, Penelope não é diretamente confrontada com esta questão enquanto personagem. Apesar do resultado positivo em relação ao atravessamento do peso da personagem, é possível questionar a relação que Penelope tem com o restante da sociedade, inclusive a própria família, devido ao status social.