Dor em prosa: uma análise de O Peso do Pássaro Morto, de Aline Bei

Por Mariana Lima

Em uma entrevista para o canal do YouTube Litera Tamy, Aline Bei, autora de O Peso do Pássaro Morto, revelou que o título da obra lhe veio em mente antes mesmo de começar a escrevê-la. Passado um tempo, ela se lembrou de um acontecimento marcante de sua infância: enquanto segurava seu passarinho na palma da mão, esperando sua mãe retornar com um cortador para aparar as unhas do animal, assustado, ele morreu. Essa imagem, então, serviu como inspiração para o tema central do livro — perdas.

Nesse sentido, o romance de estreia da escritora é um livro em prosa que acompanha a história de uma mulher, dos seus 8 aos 52 anos, com alguns saltos temporais, assim como as dores que a vida lhe impõe. A obra retrata a forma como a protagonista, cujo nome não é revelado, enfrenta seus traumas completamente sozinha, e como eles afetam, principalmente, os seus relacionamentos, além de fazer uma reflexão acerca da existência (ou inexistência) de um processo de cura. Ao apresentar uma perspectiva feminina, torna-se provável que as mulheres se identifiquem mais profundamente com a obra, ainda que os relatos abordem experiências que ultrapassem barreiras de gênero.

Sendo assim, a primeira parte do livro apresenta a infância da protagonista. A autora nos leva a enxergar o mundo por meio do olhar inocente de uma criança que, cedo demais, precisou lidar com o luto e a rejeição. O romance também passa pela adolescência da personagem que, aos 17 anos, é vítima de violência, sendo obrigada a carregar consigo um sentimento de culpa que lhe acompanha até a fase adulta, fazendo com que ela se feche cada vez mais e a impeça de desenvolver laços afetivos.

Além disso, a passagem temporal é um fator muito bem trabalhado no livro. O processo de amadurecimento da personagem é percebido a partir da forma como o seu discurso ganha, aos poucos, novos tons. Ademais, o fato do livro ser narrado em primeira pessoa cria a sensação de proximidade do leitor em relação a protagonista, e a liberdade quase poética em relação ao uso da pontuação permite que a escrita flua em ritmos que acompanham o seu estado emocional. Além disso, a maneira como as palavras são distribuídas no texto confere peso a cada uma delas, enquanto a presença de metáforas colabora na compreensão dos sentimentos da narradora. 

 

– não me importo – eu disse pra ele – que seja breve o 

           nosso encontro.

porque no tempo da minha 

memória 

somos pra sempre. não existe morrer dentro, é como 

           uma canção. 

as canções não morrem nunca porque elas moram 

           dentro das pessoas que gostam delas. (2017, p. 112)

 

Por fim, O Peso do Pássaro Morto é, acima de tudo, um livro sobre a experiência de ser humano. Aline Bei descreve, com maestria, sentimentos que muitas vezes não conseguimos colocar em palavras. Com isso, a autora consegue nos transportar para dentro da história através de uma leitura que aborda relatos difíceis de serem digeridos, ao mesmo tempo em que apresenta uma escrita marcante pela leveza e sensibilidade. 

Referências:

GHANNAM, Tamy. A vida como inventário de perdas nO PESO DO PÁSSARO MORTO. LiteraTamy. Diaponível em: <https://www.literatamy.com/post/o-peso-do-passaro-morto-aline-bei>. Acesso em: 1 de maio de 2025.

Litera Tamy. O PESO DO PÁSSARO MORTO, por Aline Bei (entrevista) | LiteraTamy. Youtube, 30 de outubro de 2018. 19min37s. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=bohKftiJYQw&t=183s>. Acesso em: 1 de maio de 2025.

PENZANI, Renata. ‘O peso do pássaro morto’ narra o impacto das primeiras perdas. Lunetas, 18 de setembro de 2019. Disponível em: <https://lunetas.com.br/o-peso-do-passaro-morto/>. Acesso em: 1 de maio de 2025.

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