Por Luiza Barbosa
Doloroso para alguns, e incrível para outros, assim, é o amor. Essa montanha-russa que nos enlouquece ou nos cura “de uma loucura qualquer” é o grande tema do filme mais aclamado das comédias românticas dos anos 2000, Como perder um homem em 10 dias (2003), do diretor Donald Petrie.
Os grandes atores, Kate Hudson, estrelando como a jornalista de moda Andie, e Matthew McConaughey, como o publicitário Ben, formam a dupla principal da trama de um complexo caso de amor dirigido por Donald Petrie.
Tudo começa com uma aposta de trabalho em que Ben poderia fazer qualquer mulher se apaixonar por ele em uma semana e, então, suas colegas escolhem aleatoriamente uma bela loira no bar. Ele só não contava que essa loira seria uma jornalista na missão de “perder um homem em 10 dias”. Essa coluna foi criada com a inspiração em sua melhor amiga que, aparentemente, é a típica emocionada que afasta todos os homens que namora. O humor do longa-metragem é justamente ver o homem numa relação estereotipada com uma mulher instável e hipersensível que impõe situações absurdas para levá-lo ao limite. E quando pensamos que ele vai desistir da aposta, ele sugere uma terapia de casal, e na sessão surge a ideia da Andie conhecer a família de seu namorado.
No fim de semana, o casal visita Staten Island, cidade natal de Ben, e se encontra com seus familiares durante um jogo de cartas apelidado de Bullshit. Após esse momento divertido e descontraído, em que a imagem do galã se dissolve para um indivíduo único, acessível e com um grande coração, faz com que a jornalista se enxergue dentro de um dilema ético. Até onde seria possível enganar alguém pelo benefício de uma tarefa do trabalho? Principalmente quando este alguém é uma pessoa sobre a qual você gosta e se importa muito.
Aparentemente, o preço que se paga é muito caro por manipular alguém, como se vê no conflito final em que os dois saem magoados. Logo, fica a pergunta: quem estava certo? Se você assistiu o filme, provavelmente vai concluir que nenhum dos dois. Mas se você assistiu atentamente, vai dizer que nenhum deles teria o “direito” de ficar chateado, afinal, eles concordaram com a pergunta inicial. Tudo vale no amor, menos quando somos nós os enganados. Essa é uma profunda reflexão para os relacionamentos contemporâneos, que se constituem essencialmente de mentiras e enganações para o bem do status, quando, no fundo, todos almejam por uma conexão verdadeira. Podemos entender essas relações como certos reflexos dos vazios que cada indivíduo carrega, como os milhares de filósofos e conceitos filosóficos criados sobre a dinâmica individualista que a modernidade estruturou, por exemplo, o conceito de sociedade de massa de Hannah Arendt, e amor líquido de Zygmunt Bauman. Guiados a pensarmos em suas próprias vidas, ignorando a importância do outro e do coletivo, nós voltamos todos os espelhos da vida para nós mesmos e enxergamos apenas nossos problemas. Isso faz com que as relações se enfraqueçam, sem um pingo de empatia, o outro se vê sem suporte para crescer e construir um relacionamento vulnerável e honesto. Estamos focados nas aparências, assim como Ben no momento que ele se preocupou apenas com sua aura de conquistador, e não pensou nos sentimentos de outra mulher estaria em jogo, e também como Andie que visou somente o sucesso de sua carreira e não imaginou como outro homem se sentiria com a montanha russa de jogos de manipulação que ela faria, e vice-versa.
Para fazer um paralelo com aplicativos de namoro que são o ápice do amor líquido, pois criam relações a partir de dados de algoritmos para aproximar pessoas meramente compatíveis para se venderem tal como sapatos numa vitrine para durar dois minutos de troca de conversas. Isso tudo para levar ao sexo e nunca mais se falarem novamente. Dessa forma, não estamos interessados em esperar uma conexão genuína e espontânea com uma pessoa real multifacetada que possui interesses, defeitos e qualidades e não apenas um lado bom. Estamos interessados em rápidas conexões e zero solitude, esse é o medo da geração. Olhamos tanto para nós mesmos e escondemos tantos defeitos, ao invés de abraçar a pluralidade de lados sombrios que possuímos.
E isso é o que se ausenta durante todo o filme na dupla amorosa do nosso filme queridinho, menos no final em que dois seres humanos persistem na ideia que poderia existir reais sentimentos dentre o jogo que aconteceu. Quando Ben corre atrás de sua paixão pela ponte de Nova York e chamando por Bullshit (blefe), ele mostra a Andie que ela estava fugindo de uma real conexão para procurar emprego em Washington. E como uma boa comédia romântica, o casal acaba juntos para felicidade dos espectadores. O mais interessante é que mesmo sendo sacanas, eles conseguiram encontrar um amor verdadeiro, portanto, fica a questão: tudo vale no amor?