“Homem-Aranha: Através do Aranhaverso”: um amadurecimento artístico

POR: Camila Freesz

      Depois de assistir à obra de arte que é “Homem-Aranha: No Aranhaverso” (2018), os sentimentos com o anúncio da sequência foram empolgação, mas também receio. Como manter o mesmo nível de qualidade artística? Seria possível? Para minha felicidade, sim!

     Com direção de Joaquim dos Santos, Justin K. Thompson e Kemp Powers, “Homem-Aranha: Através do Aranhaverso” (2023) aborda as famosas complicações em ser um super-herói, as quais o protagonista Miles Morales (Shameik Moore) é forçado a lidar como consequências de suas ações e escolhas do filme anterior. Nesse sentido, o conflito principal é um de seus maiores triunfos.

Como muitos outros espectadores, desde a infância, vi e revi a morte do “tio Ben”- entre aspas, pois, nas versões recentes da entidade Homem-Aranha, há pessoas diferentes, mas com o mesmo papel. Cita-se, ainda, outros acontecimentos denominados “canônicos” no roteiro. A partir disso, ao colocar um protagonista reacionário a esse padrão determinado, cria-se identificação com o público e uma jornada extremamente envolvente e com um tom mais dramático que o primeiro longa. Além disso, é interessante o fato de esse personagem, questionador do papel e do destino que lhes são impostos, ser negro e de descendência latina. Assim, propositalmente ou não, os criadores elaboraram uma narrativa que me agrada.

     Outro aspecto que engrandece a estória é o aprofundamento da personagem de Gwen Stacy (Hailee Steinfeld). No longa de 2018, já tínhamos sido expostos à sua origem, porém na introdução deste segundo, a vemos com mais detalhes. Isso gera empatia do espectador para com as escolhas que ela toma no decorrer dos acontecimentos e dela própria para com as atitudes de Miles. O ápice desse desenvolvimento é uma das cenas mais emocionantes da obra; um diálogo da super-heroína com seu pai.

     Essa temática familiar e paternal é ponto forte e contínuo no filme. Além de Gwen e de Peter Parker (Jake Johnson) com sua bebê, e de acompanharmos a relação de Miles com seu pai, Jeff (Brian Tyree Henry), após os acontecimentos do primeiro longa, nos são apresentados com maior profundidade os vínculos do protagonista com sua mãe, Rio. Em vista disso, constitui-se minha cena favorita, em que Miles e Rio (Luna Lauren) conversam sobre amadurecimento e independência.

    Como se não bastasse, o roteiro também acerta na construção dos seus vilões, apesar de achar que ambos terão mais evolução na parte 2, Miguel O’Hara (Oscar Isaac) e Spot (Jason Schwartzman): suas motivações são claras para o público e inteligíveis na maioria dos casos. A partir delas e da dinâmica de Miguel com Miles, a narrativa traz discussões sobre o limite tênue entre o bem e o mal, até que ponto atitudes são justificáveis e a realidade complexa dessa dicotomia, temáticas constantemente presentes no subgênero dos super-heróis. Ademais, Hobie Brown (Daniel Kaluuya), o Aranha-punk carismático que rouba toda cena, acrescenta a esse debate seus ideais anarquistas.

 

 

 

 

 

 

    Entretanto, após parágrafos de apreciação, um deslize interessante de ser abordado é o marketing, que é exterior ao longa, mas que o afetou negativamente. Soube de muitas pessoas, incluídas dentro da bolha ”cinéfilos”, as quais não sabiam que a obra era a primeira parte de uma sequência composta por dois filmes. Portanto, devido ao final em aberto, alguns dos espectadores ”desavisados” saíram frustrados, o que não condiz com a minha experiência de quem já estava ciente. Contudo, mesmo sob necessidade de certos desfechos na continuação, o longa conclui determinados arcos apresentados, principalmente acerca dos questionamentos dos personagens principais e de suas relações familiares.

     Por fim, não podia deixar de comentar sobre os aspectos técnicos. Com 6 estilos distintos e equipe com cerca de 1000 profissionais, a animação é deslumbrante. Além da estética aquarelada da animação do universo de Gwen, um dos melhores exemplos a citar é Hobie Brown: para retratar um crítico das normas, a equipe decidiu diferenciar a quantidade de quadros geralmente utilizada e a animação de cada parte do personagem (se quiserem saber mais, muito material já foi postado sobre no Twitter e no Youtube). Similarmente ao trabalho de 2018, vencedor do Oscar, é impressionante a qualidade da animação e da fotografia – cada frame composto maravilhosamente, digno de emoldurar e pendurar como uma pintura -.

     Em suma, “Homem-Aranha: Através do Aranhaverso” é uma chama para os amantes de cinema. Com personalidade, humor e talento, o filme tem um roteiro com dinâmicas de tempo equilibradas para cada personagem e qualidade técnica formidável. Ele cumpre o seu papel de sequência por meio da expansão e do amadurecimento do conceito do multiverso, do escopo das ameaças enfrentadas pelo protagonista e das ferramentas de animação utilizadas. Dessa forma, a única maneira de concluir essa crítica cinematográfica é recomendando a todo leitor que assista à obra o mais rápido possível e desejando que a ame, assim como eu!

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