POR: João Víctor Lima Plá Bento
O curta-metragem “Quem matou Eloá?”, dirigido pela cineasta Lívia Perez, debruça-se sobre o caso de feminicídio ocorrido no ano de 2008 na cidade de Santo André, região metropolitana da capital paulista, que durou cerca de 100 horas (4 dias). Logo de início, nos minutos 0 ’40’’ ao 2 ’42’’, a produção exibe, através de reportagens da época, toda a
repercussão que esse caso teve no país. Expõe, também, as ações dos policiais e a influência da mídia no decorrer desses fatídicos dias.
Eloá Cristina, de 15 anos, era ex-namorada de Lindemberg Alves, de 22. Após o término do relacionamento, Lindemberg invadiu o apartamento onde Eloá morava com mais três amigos e ameaçou-os, porém dois deles foram liberados pelo homicida uma vez que seu foco era a ex-namorada e a amiga.
No decorrer do caso, diversos programas de TV e telejornais conseguiram contato com o assassino e transmitiam isso em rede nacional, o que gerava grande repercussão no país e dava a voz que o criminoso almejava desde o início. “Queriam aumentar o IBOPE do programa, veja, isso é do negócio” disse o promotor Augusto Rossini no curta.
A obra, em todo o tempo, revela a tentativa por parte dos veículos midiáticos de moldar a pessoa do Lindemberg para os espectadores, exibiam o assassino como uma pessoa boa e assim fez o programa “Hoje em Dia” com a seguinte citação: “Era considerado, pelos amigos e pela família, um rapaz tranquilo, calmo, trabalhador, que jogava bem futebol”
(7’56’’). Outro exemplo que o curta exibe está no programa “A Tarde é Sua” na qual um entrevistado diz que o assassino está passando por uma “fase momentânea” e tenta explicar o porquê de ele estar fazendo aquilo com a menina, ele diz, ainda, que tudo ia terminar em um final feliz (8’43’’). Atos como este mudaram o rumo do caso e ofuscaram a importância da vida da vítima, que estava em risco, e deu voz ao agressor em busca de repercussões e furos de reportagem.
O curta mostra também que Lindemberg não tinha apenas a mídia nas mãos como também tinha as autoridades, o que dava a ele um poder imenso de fazer o que quisesse. Eduardo Félix, comandante do batalhão de choque disse em entrevista coletiva: “Poderíamos ter dado o tiro de comprometimento, mas era um garoto de 22 anos de idade, sem antecedentes criminais e com uma crise amorosa” (14 ’48’’). A produção deixa de forma clara que as duas meninas sofreram agressões de Lindemberg todos os dias, elas eram as vítimas e estavam sofrendo, mas a proteção e a
atenção da mídia e das autoridades foi dada ao agressor. “A vida de Eloá estava em segundo, terceiro e quarto plano.” (15 ’01’’).
Feminicídio é crime hediondo com pena de 12 a 30 anos de prisão, porém Lindemberg era tratado pela mídia como bom moço e doente psicologicamente, o que mostra, portanto, que a mídia teve, assim como a polícia, uma participação negativa no caso e não cumpriu seu papel de ajudar a vítima e dar o suporte necessário a ela e isso o curta-metragem expõe com grande clareza. “Muitas vezes as negociações eram alteradas e influenciadas pelo o que ele (agressor) ouvia nos canais de televisão” disse o promotor Augusto Rossini no programa “Hoje em Dia”.
Eloá morre por conta de um tiro na cabeça e na virilha pelo assassino Lindemberg e cerca de 40 mil pessoas comparecem ao seu enterro. Pessoas que acompanharam pela televisão todo o caso, mas que se caso não fosse transmitido poderia ter tido um final diferente e Eloá poderia estar viva.
A produção dirigida por Lívia Perez faz jus aos prêmios que ganhou uma vez que expõe com clareza o caso ocorrido em 2009 e como ele poderia ter sido evitado. O curta além de mostrar os descasos por parte da mídia e das autoridades, também alerta sobre um dos maiores dilemas hoje enfrentado que é a agressão à mulher. O curta mostra a importância da denúncia e encoraja mais mulheres a denunciarem casos de agressão. Portanto, a obra tem extrema relevância para a sociedade e se torna um objeto obrigatório no estudo sobre as grandes mídias e suas seletividades e no âmbito de estudos sobre feminicídios e agressões domésticas.