80 mil pessoas. Esse é o número da soma dos habitantes de três países: Mônaco, Tuvalu e San Marino. É também o número de pessoas que o Hospital João XXIII atende por ano.
Fundado em 1973 e localizado na região Centro-Sul de Belo Horizonte, o João XXIII completa 50 anos em 2023. O Hospital é centro de referência em salvar vidas e prestar atendimento de alta complexidade em urgência e emergência em toda a América Latina.
O centro hospitalar abriu as portas 50 anos atrás para receber a grande demanda da cidade em urgência e emergência, substituindo o Hospital Maria Amélia Lins. Até então, a unidade era a única que prestava esse atendimento aos pacientes da capital e de toda a Região Metropolitana.
Somente em 2022, o Complexo de Urgência e Emergência (CHUE) recebeu mais de R$21 milhões em investimentos entre equipamentos, mobiliários e obras. É o que conta Fabrício Giarola, Diretor do Hospital: “Em 2019, a gente investiu mais de R$30 milhões em renovação de equipamento tecnológico. E a gente continua investindo, esse ano a gente tem uma previsão de investir mais R$ 16 milhões nesse tipo de renovação de parque tecnológico, para atender melhor nossa população”.
Hospital João XXIII em números
O complexo conta com mais de 400 leitos. Dos quase 3 mil funcionários, 800 foram treinados para operar sob as condições rigorosas do protocolo de emergência.
O Hospital João XXIII já atendeu 3 milhões de pessoas ao longo dessas cinco décadas de funcionamento. Entre esses atendimentos, estão casos de acidentes, pessoas atropeladas, feridas por armas brancas e de fogo, queimadas, crianças engasgadas ou com fraturas ocasionadas por quedas. Os casos mais graves que chegam à unidade são os de acidentes automobilísticos, cerca de 8 mil do total de atendimentos anuais. Muitas dessas ocorrências envolvem motociclistas, o segundo lugar em atendimentos no pronto-socorro. São mais de 4 mil casos atendidos por ano, sendo que mais de 3 mil são homens de 20 a 40 anos.
O HJXXIII realiza mais de 80 mil atendimentos por ano. Em 2022, foram mais de 7 mil cirurgias, 10,5 mil internações, 13,3 mil consultas especializadas e 1,3 milhão de exames realizados.
A taxa de atendimentos bem-sucedidos se deve à eficiência e aos recursos humanos que a unidade de saúde apresenta para atender todos que precisam de acompanhamento. O Hospital João XXII conta, além das equipes médicas e de enfermagem, com técnicos de várias áreas, nutricionistas, psicólogos, fisioterapeutas, assistentes sociais, fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais, servidores administrativos e tantos outros profissionais que se dedicam nos plantões.
Para os profissionais que atuam na unidade, há diferenciais que levaram o João XXIII para esse patamar de reconhecimento. Na opinião da gerente médica Daniela Fóscolo, o que há de mais rico na instituição são os recursos humanos de excelência:
“Temos reunidos aqui alguns dos maiores especialistas do estado, com a capacidade de tratar lesões muito graves. Além disso, as equipes, tanto as médicas quanto as multiprofissionais, estão disponíveis para realizar um tratamento eficaz em um tempo muito curto”.
Daniela Fóscolo, gerente médica
“Desde sua admissão no hospital, o paciente é atendido de forma global, tendo ele e sua família todo o suporte e acolhimento necessários no encaminhamento hospitalar, seja para cirurgia, UTI ou internação, até o momento da alta”, explica a assessora da gerência da equipe multidisciplinar, Andréa Mendes. “Muitas vezes, um hospital que possui recursos mais modernos, não consegue conciliar o trabalho de tantos profissionais com essa velocidade e de forma tão harmoniosa”, completa Daniela Fóscolo.
Tipos mais frequentes de atendimentos e perfil de vítimas do João XXIII
O tipo mais frequente de atendimento são as quedas: o Hospital João XXIII atende, em média, 15 pessoas por dia devido a quedas da própria altura, sendo que mulheres com idades entre 51 e 60 anos são a maioria nesse tipo de acidente.
Entre as muitas vidas que o hospital salva diariamente, estão as das crianças. Mais de 11 mil dos usuários atendidos são crianças de 0 a 11 anos, que chegam principalmente por motivos clínicos e ingestão ou aspiração de corpos estranhos, este o terceiro lugar de casos isolados atendidos no HPS – em 2022 foram 4.315 casos. Acidentes como esses acontecem principalmente em ambientes domésticos, assim como queimaduras.
As queimaduras e as picadas por animais peçonhentos também estão entre os atendimentos mais realizados na unidade. Seus dois centros especializados para tais acidentes, o Centro de Tratamentos de Queimados Ivo Pitanguy (CTQ) e o Centro de Informação e Assistência Toxicológica de Minas Gerais (CiaTox-MG), atendem quase 27 mil casos por ano. Desses casos, 1.500 são pacientes queimados e 25 mil de intoxicações por medicamentos, pesticidas, animais peçonhentos.
“Meu filho foi queimado por uma colônia de lagartas e eu fui orientada a levá-lo imediatamente para o João XXIII”, conta Luciana Carvalho, que teve seu filho salvo pela equipe de toxicologia do hospital. De acordo com Luciana, assim que chegaram na unidade, já foram recolhidas amostras das lagartas e o atendimento foi em questão de horas, incluindo exames, raspagem do local e aplicação do soro. Após apenas três dias, seu filho recebeu alta.
A principal porta de entrada de casos de emergência é a sala de trauma e as operações de urgência. O Hospital João XXIII tem um centro de trauma reconhecido internacionalmente. Um dos diferenciais é a Sala da Onda Vermelha, localizada dentro do bloco cirúrgico, em que casos gravíssimos chegam após o soar de uma sirene e são estabilizados. “Quando um paciente chega na onda vermelha, toda a equipe já se desloca para a porta da sala. Tudo isso acontece em torno de 1 minuto, 1 minuto e meio”, conta a coordenadora do bloco cirúrgico, Janaína Rodrigues.
“As vítimas foram encaminhadas ao Hospital João XXIII”
Saber que vítimas foram encaminhadas ao João XXIII, no senso comum, pode ser um alerta para associação à morte, ou casos graves de acidentes e situações extremas de saúde. Na cobertura midiática, cria-se um imaginário do hospital sempre associado a temas negativos e de grande sofrimento. No entanto, para os profissionais da área, o sentimento é de satisfação por poder atender a população.
“Trabalhar no ‘João’ é saber que estamos preparados. A gente deixa pra trás todo o sofrimento que acontece dentro do Hospital, mas para nós é muito gratificante. Eu acho que a gente nasce pra isso, a gente já nasce com esse preparo”, disse a socorrista do SAMU Adriana Márcia, que atua no HJXXIII. “João” é a forma como muitos funcionários se referem ao hospital, personificando o local de trabalho.
O João é um dos poucos hospitais que mantém essa missão de atendimento ao politraumatizado. Quando existe um trauma grave, eu acho que seja quase cultura geral, as pessoas já tem essa orientação de pensar no João XXIII.
Bruno Vergara, cirurgião de trauma no Hospital João XXIII
A emergência que vira notícia e fica na memória
Durante a produção da reportagem foi perguntado para todos os profissionais do João XXIII que foram entrevistados qual era a história mais marcante para eles. A maioria respondia que todas as histórias são importantes e deveriam ser lembradas.
O Hospital foi responsável por tratar vítimas de acidentes que foram notícias em todo o país e até mundialmente. Um desses momentos memoráveis foi quando acionaram o plano de catástrofe para receber as vítimas do rompimento da barragem do Córrego do Feijão, em Brumadinho, em 2019.
O ex-diretor Marcelo Lopes ainda complementa que, para ele, uma das histórias mais marcantes para foi o massacre de Janaúba, no Norte de Minas Gerais. Oito crianças e uma professora morreram após um segurança colocar fogo em uma creche. Havia 75 crianças e 17 funcionários na escola.
Eu sentei e chorei. Me emocionei depois de ter atendido tantas crianças.
Marcelo Lopes, ex-diretor do HJXXIII
A parceria entre os profissionais
Os profissionais do HJXXIII ainda contam com grandes aliados fora da unidade. As equipes de resgate dos bombeiros e do SAMU de BH há décadas estão na linha de frente da assistência pré-hospitalar e têm o João XXIII como componente fundamental nos atendimentos de urgência.
Durante a apuração da reportagem, nossa equipe acompanhou um simulado de atendimento às vítimas realizado pela ocasião do aniversário do João XXIII. Durante o evento, as equipes do SAMU e do Corpo de Bombeiros demonstraram aos representantes da imprensa a agilidade do atendimento e a necessária sincronia entre os envolvidos.
A tenente Laura Zaidan destacou as ocorrências envolvendo múltiplas vítimas, e como a parceria entre as instituições foi fundamental em episódios como o rompimento da barragem: “A cooperação entre os Bombeiros e o HJXXIII é algo emocionante de se falar e relembrar, seja como bombeira ou como mineira”.
Desvalorização dos profissionais no Hospital João XXIII
O Brasil enfrenta um grande dilema em relação ao piso salarial dos profissionais da enfermagem.
“Infelizmente, foi necessário uma pandemia para a valorização do nosso trabalho. Nós lidamos desde o início da vida, com um nascimento de uma criança, até a morte de um paciente terminal. Nós estamos ali o tempo todo. Acho que com o piso salarial nós finalmente vamos ter um reconhecimento merecido da nossa profissão.” Essa é a fala do enfermeiro e supervisor técnico Anderson Estevam.
Para além da questão financeira enfermeiros do hospital relatam preconceito e hierarquias veladas entre médicos e outros profissionais, que enxergam sua área de atuação como melhor e mais relevante.
Confira o webdoc sobre o Hospital João XXIII
Reportagem produzida por Luiz Otávio Barbosa, Virgínia Caetano, Estêvão Valentim, Poliana Cestari e Lucas de Carvalho, na disciplina laboratório de jornalismo digital, no semestre 2023/1, sob a supervisão da professora Verônica Soares da Costa.
que matéria incrível. O João XXIII é realmente parte da nossa história belo-horizontina.