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Ar da Região Metropolitana de Belo Horizonte pode causar de doenças cardiovasculares a câncer

RMBH tem poluição do ar acima dos níveis recomendados pela OMS | Créditos: Guilhemar Caixeta Filho

A pesquisa Qualidade do Ar da Região Metropolitana de Belo Horizonte, do Instituto de Energia e Meio Ambiente (IEMA), revelou que a Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH) tem concentração de poluentes acima do nível recomendado pela Organização Mundial de Saúde (OMS). O estudo, publicado em julho de 2023, analisou os poluentes material particulado inalável (MP10), material particulado fino (MP2,5), dióxido de enxofre (SO2), dióxido de nitrogênio (NO2) e ozônio (O3). O cenário mineiro não é diferente da maior parte do mundo. A OMS afirma que 99% da população mundial respira ar com qualidade inferior à recomendada pela organização. Além do impacto ambiental dos altos níveis de poluentes, a saúde humana é extremamente prejudicada.

Riscos à saúde e ao meio ambiente

Nelson Gouveia, epidemiologista e professor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), afirma que a poluição do ar pode causar inúmeras doenças. O ar seco, comum nesta época do ano, é um agravante que deixa a parede respiratória mais frágil e propensa a irritações por poluentes.

Gouveia ressalta que não são somente as doenças respiratórias que são preocupantes. “Uma vez no pulmão, essa poluição passa para a nossa corrente sanguínea. Então, ela praticamente vai ter efeito em todo o organismo. O segundo órgão de ataque, que tem bastante evidência e muitos estudos mostrando, é nosso coração. As doenças cardiovasculares estão bastante correlacionadas com o efeito da poluição também”, afirma o médico. Ele destaca as consequências sistêmicas que podem afetar diversos órgãos e causar diferentes cânceres, demência, déficit cognitivo, AVC, derrame, aceleramento do envelhecimento da pele, diabetes e, até, má formação congênita e defeitos de nascimento.

Poluição do ar afeta o organismo de forma sistêmica | Créditos: Guilhemar Caixeta Filho

O meio ambiente também é extremamente prejudicado pela poluição atmosférica. De acordo com Ricardo Passos, engenheiro ambiental, professor e pesquisador do Centro de Desenvolvimento da Tecnologia Nuclear (CDTN), os efeitos incluem poluição do solo e dos rios, aquecimento global, e chuva ácida, fenômeno caracterizado pela acidificação da água da chuva que prejudica solos, plantas, animais, e corrói monumentos ao ar livre.

Material particulado é o mais perigoso

Entre os resultados mais graves obtidos no estudo do IEMA estão todas as estações de monitoramento do ar terem registrado valores de material particulado fino (MP2,5) acima da concentração das diretrizes da qualidade do ar da OMS de 2021. Essas normas têm caráter de referência para legisladores, de modo que o Brasil segue a Resolução CONAMA nº 491/2018, que permite níveis maiores de poluição atmosférica, já que se baseia nas diretrizes de 2005 da organização. Entretanto, a maioria das estações têm teores que ultrapassam até mesmo os padrões do início do século.

O material particulado, hoje em dia, é o principal vilão.

Nelson Gouveia, epidemiologista

Dos poluentes monitorados, o material particulado é o de maior preocupação para especialistas. Ricardo Passos explica que essas minúsculas partículas de composições diversas ficam suspensas no ar, não têm cheiro e são imperceptíveis ao olho humano. Entretanto, seus danos podem ser imensos, já que elas se depositam nos alvéolos pulmonares e podem chegar à corrente circulatória. “É um processo inflamatório de estresse oxidativo no organismo, que vai desencadeando doenças”, afirma o médico Nelson Gouveia.

Estresse oxidativo: de acordo com o artigo “Estresse oxidativo: conceito, implicações e fatores modulatórios”, de Barbosa et al, esse fenômeno acontece por causa de um desequilíbrio entre a geração de compostos oxidantes e o sistemas de defesa antioxidante, que reduz os danos causados pelos radicais livres. Esse processo é associado ao envelhecimento precoce e ao desenvolvimento de alguns tipos de cânceres.

A origem é a solução

Apesar de as substâncias terem a concentração facilmente medida pelas estações de monitoramento, a fonte delas é incerta. Os principais agentes poluidores da RMBH são apontados como mineração, polos industriais, veículos, queima de biomassa, refinaria de petróleo e produção de cal e cimento, de acordo com Ricardo Passos. Entretanto, os poluentes podem percorrer longas distâncias, como aponta o estudo “Imprints of anthropogenic air pollution sources on nitrate isotopes in precipitation in a tropical metropolitan area” (Pegadas de fontes de poluição antropogênica no ar em isótopos de nitrato em precipitação em uma área metropolitana tropical) do pesquisador. A equipe coordenada por Passos combinou a análise de isótopos de nitrogênio com modelos matemáticos e meteorológicos, e, assim, concluiu que parte da poluição aérea de Belo Horizonte vem de queimadas no norte do Brasil e de navios que passam na costa do país.

A poluição não tem limite, ela não tem dono.

Ricardo Passos, engenheiro ambiental

Mesmo que descobrir as fontes não seja um trabalho fácil, Passos afirma que, para frear os poluentes, a primeira etapa é fazer um diagnóstico tanto das concentrações quanto das fontes de poluição. A segunda fase é o adequamento das leis de acordo com as diretrizes da OMS e a fiscalização dos agentes poluidores. Por último, a utilização de fontes limpas. Por mais clichê que soe, a mudança nos recursos energéticos é essencial para uma melhor qualidade do ar e de vida na RMBH.

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