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BH registra crescente número de queimadas e desmatamento

Área verde do Parque Municipal de Belo Horizonte

Índices ameaçam posição da capital no ranking de “Cidade Mais Verde” do IBGE

Em 2010, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) classificou Belo Horizonte como a terceira capital mais verde do Brasil, ficando atrás apenas das cidades de Goiânia (89,3%) e Campinas (87,5%). Na época, a cidade mineira possuía 82,7% de taxa de arborização em vias públicas por um milhão de habitantes. Passados 12 anos, devido ao aumento dos registros de desmatamento, queimadas em períodos secos e interesse empresarial nos espaços verdes, a expectativa é que BH caia no ranking do Censo Demográfico 2022.

De acordo com a meteorologista Anete Santos, do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), mesmo que Belo Horizonte possuísse mais áreas verdes, devido a sua localização geográfica e climatológica, a cidade “ainda teria o registro de baixos índices de umidade, principalmente, entre os meses de julho e setembro”.  Diante desse fato, ambientalistas reafirmam a importância da preservação dos espaços que resistem em meio a “selvas de concreto”. Na visão do geógrafo Antoniel Silva Fernandes, especialista em Licenciamento e Impacto Ambiental, o contato com a natureza, que é cientificamente comprovado como benéfico para a saúde física e psicológica, também tem um papel fundamental ao atuar na diminuição de poluição e do calor.  

Menos verde, mais enchente

Para Fernandes, que desenvolveu a pesquisa “Análise Espacial das Áreas Verdes Urbanas”, esses espaços são indispensáveis não apenas do ponto de vista social, mas também ambiental. Com o asfaltamento de ruas e avenidas, Belo Horizonte perde uma importante funcionalidade destes espaços: a contenção de água, que sem local suficiente para escoamento, causa enchentes.

Esse é um problema antigo que os belorizontinos enfrentam há muitos anos, entre os meses de dezembro e fevereiro. Ultrapassando os 923,3 milímetros, de acordo com o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), em janeiro de 2020 a capital enfrentou um período chuvoso que destruiu significamente parte da cidade. Cenários como este, faz com que o geógrafo reitere que “As áreas verdes podem conter os processos erosivos, ajudar a preservar o solo, elas funcionam como uma esponja, contém os processos de inundação.”.

Tendo em vista essa questão relacionada aos períodos de chuva e inundações na cidade com as áreas verdes, em entrevista, o diretor de gestão ambiental da Prefeitura de Belo Horizonte, Dany Silvio Amaral, fala sobre o chamado Plano Diretor.  Essa é uma lei municipal instituída em 2019 e descrita como um instrumento básico da Política Urbana na cidade. Nesse aspecto, Amaral descreve o Plano Diretor como sendo uma mecanismo que irá implementar o aumento da estrutura ambiental de áreas verdes permeáveis na cidade, para ajudar no escoamento superficial e na absorção das águas de chuva, com o objetivo de reduzir as inundações. 

Uma cidade desigualmente verde

Por mais que haja um grande esforço de diversos atores da sociedade civil para a promoção da importância da causa ambiental, esse assunto ainda não é visto como prioridade para agentes governamentais e setores da sociedade civil. A desigualdade na distribuição de áreas verdes nas cidades se torna um problema silencioso e a partir do artigo intitulado “Uma análise espacial das áreas verdes de Belo Horizonte”, de autoria de Antoniel Silva Fernandes junto ao arquiteto Altino Barbosa Caldeira, sobrepondo ao mapa da cidade disponível no site da Prefeitura, pode ser percebido que as áreas verdes se concentram em bairros da região Centro-Sul e Pampulha, consequentemente os locais mais abastados do município. Enquanto isso, regiões como a Norte, Nordeste, Noroeste, e até Venda-Nova, registram a falta de áreas verdes. Ainda tenham espaços arborizados, são poucos e esporádicos. 

Mapa das áreas verdes de Belo Horizonte
Créditos: Pesquisa “Análise espacial das áreas verdes de Belo Horizonte”

Outro ponto a ser ressaltado, é a questão da localidade, moradores das regiões onde se concentram os locais verdes possuem o privilégio de poder acessar esses lugares até mesmo andando, pois são perto dos bairros, e ainda desfrutam de um leque de opções dessas áreas. Em outras regiões, para chegar a esses locais, como parques municipais e estaduais, é necessário automóvel, transporte público ou outras formas de mobilidade, pois elas estão situadas perto das fronteiras das regiões, como as regiões Oeste e do Barreiro

Os especialistas afirmam ser preciso pensar na problemática, pois um trabalhador comum enfrenta diversos obstáculos para chegar a esses locais. Privar grande parte da população da cidade ao pleno acesso às áreas verdes, não é só negar o direito ao lazer, mas também a uma melhor qualidade de vida e bem-estar. 

A cidade de Belo Horizonte foi planejada desde a sua fundação, e sua distribuição é feita de forma estratégica para beneficiar os pontos mais importantes. No contexto atual, é necessário ações para combater a desigualdade de áreas verdes, pois é um problema que afeta silenciosamente grande parte da população da cidade. Nesse aspecto, Dany Silvio Amaral ressalta mais uma vez o papel da Prefeitura mediante ao Plano Diretor, de mapear as possíveis áreas nas regiões mais pobres e a partir daí trabalhar no processo de revitalização e revegetação delas.  

Cartão postal da cidade corre perigo

O Estado que antes era reconhecido pelas suas serras preservadas e belas paisagens verdes, perfeitos para o turismo, agora é reconhecido pelas idas e vindas dos processos judiciais que ameaçam a existência de um dos principais cartões postais da capital. A Serra do Curral é uma área verde que abrange tanto Belo Horizonte como parte da região metropolitana, e sua importância é fundamental para seu entorno. Do ponto de vista biológico, ela é um lar que abriga uma grande diversidade de flora e fauna, muitas delas endêmicas, ou seja, que pertencem exclusivamente àquela área. É responsável também por ser uma passagem para as espécies, um local de intersecção entre vários outros pontos verdes.

A mineradora Taquaril Mineração S.A (Tamisa) teve seu projeto de mineração dentro da Serra do Curral aprovado no dia 30 de abril de 2022 pela Câmara de Atividades Minerárias (CMI), subordinada ao Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam). Desde o dia da aprovação dessa limiar, houve já diversos protestos, e a partir desse momento uma grande comoção de diversos setores da sociedade para impedir a exploração da área, assim como a mobilização para o tombamento da Serra do Curral como patrimônio estadual. 

Serra do Curral
Foto: Divulgação/PBH

A Serra do Curral, além de refúgio para fauna e flora diversificadas, ela também é responsável por intermediar duas bacias hídricas de fundamental importância para o estado de Minas, o rio das Velhas e do Paraopeba. Sua exploração colocaria em risco esses pontos, assim como o desmatamento da vegetação de Mata Atlântica presente na área. Outro ponto a ser ressaltado, é que a região pretendida para ser explorada, fica perto da área urbana de Belo Horizonte, ou seja, bairros da região Leste teriam seus moradores sofrendo consequências diretas da mineração, que afetaria a qualidade de de vida dessa população, o oposto do papel que as áreas verdes exercem.

A decisão de aprovação de exploração da Serra do Curral foi tomada em âmbito nacional, sem levar em conta a posição da Prefeitura de Belo Horizonte. A Prefeitura se diz contra o ato de exploração, e teve como uma de suas reações a criação de um corredor ecológico da Serra do Curral e do Espinhaço, visando unir as áreas verdes no entorno, de modo a potencializar a preservação desses locais. Outro ponto adotado, foi a criação do projeto “Dia Pico Belo Horizonte”, proposto pela Câmara Municipal, visando uma conscientização do patrimônio ecológico e ambiental da cidade de Belo Horizonte. De acordo com Amaral, também foi feito um levantamento de dados sobre a importância da Serra do Curral e todas as questões ambientais que ela abriga e protege. Por falta de resposta do judiciário estadual, a Prefeitura entrou com um recurso no Supremo Tribunal Federal (STF), requisitando uma avaliação para o pedido de proteção da Serra do Curral.

Como área verde, a Serra do Curral também tem uma atuação primordial no controle climático da região, e com o aumento das queimadas e do desmatamento, não só ela, mas todos os outros locais vêm perecendo, e quem sofre as consequências diretas é a população. Tendo isso em mente, cada vez mais ações de plantio na cidade seguem crescendo, sejam elas feitas por ONGs ou pela Prefeitura, se tornando  fundamentais para o combate a esses desastres ambientais. A partir disso, o presidente da Fundação de Parques Municipais e Zoobotânica, Sérgio Augusto ressalta a importância desses projetos, “É uma estratégia com muita efetividade e que dissemina pela cidade uma consciência, uma sensibilidade, uma preocupação com uma cidade mais resiliente, mais resistente às mudanças climáticas que é o que a gente quer.  Tem que ser mais verde, tem que cuidar da drenagem, da infiltração da água da chuva e da questão climática ou microclimática da nossa cidade.”

A mobilização social

Atuando há 20 anos na causa ambiental, a fundadora dos projetos Cercadinho e Ponte Queimada Córregos Vivos e Muralha Rosa, Carla Magna teme por uma decisão judicial favorável à Tamisa. Relatando que devido à construção de edifícios a circulação dos ventos na região se modificou, a ativista lamenta o possível licenciamento para a mineração na Serra do Curral: “Eu sinto uma dor imensa, porque eu sei que a gente vai perder um patrimônio visual, um patrimônio cultural e vamos ter uma consequência ambiental”.  

Durante a infância, o córrego Cercadinho que nasce na Serra do Curral, já foi o seu lugar preferido para nadar. Hoje, passando por uma recuperação ambiental após ser poluído, o local se tornou símbolo de resistência. Constantemente ameaçado pela especulação imobiliária da região sul de Belo Horizonte, e agora pela mineração, Magna apoia o tombamento da Serra em prol do bem-estar dos belorizontinos e da existência dos córregos envolvidos no projeto.

Ações dos projetos Cercadinho e Ponte Queimada Córregos Vivos e Muralha Rosa
Foto: Arquivo Pessoal

Acreditando que o movimento “Tira o Pé da Minha Serra”, organizado por ambientalistas, influenciou para atrasos no processo movido pela Tamisa, Carla Magna elogiou a postura da comunidade da capital mineira. Ao afirmar que “A comunidade desconhece o seu potencial ambiental, pois o poder econômico não tem interesse que as pessoas tenham conhecimento sobre a causa ambiental”, a ativista se mostrou emocionada diante do crescente número de apoiadores ao movimento.

Até o momento, 72.284 pessoas assinaram a petição em prol do tombamento estadual da Serra do Curral. Recomendado há mais de um ano pelo Ministério Público, a partir de um estudo realizado pelo Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (IEPHA/MG), a medida não prosseguida pelo Governo de Minas Gerais está ganhando conhecimento público. Esperançosos, os ambientalistas do movimento afirmam que “Ainda dá tempo de virar o jogo” e convidam para que mais pessoas assinem a petição.

Matéria escrita por Davison Henrique e Giovanna Minarrini

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