Responsável por 4,3% do PIB nacional e movimentando bilhões de reais em confraternizações corporativas e sociais anualmente, o setor de eventos foi um dos mais afetados pelas restrições sanitárias em decorrência da pandemia do novo coronavírus. Com o aumento das taxas de vacinação e a redução dos casos de covid, havia expectativas de que 2022 se tornasse o ano da retomada. Seja na geração de empregos, seja no incentivo ao turismo ou no reencontro do público com os megaeventos culturais. Entretanto, com a rápida transmissão da variante Ômicron, entre o final de 2021 e o início de 2022, tal cenário não se concretizou.
Em um comunicado no Instagram, os organizadores do Carnaval do Bem optaram pelo cancelamento da edição que iria ocorrer nos dias 27 e 28 de fevereiro em decorrência do “cenário de incertezas criado em BH para produtores e consumidores de eventos”. Também seguindo a onda de cancelamentos, o We Love Carnaval alterou a line up do evento após os cantores Saulo Fernandes e Ivete Sangalo comunicarem que não irão se apresentar.
Já a equipe do Festival de Verão, previsto para os dias 29 e 30 de janeiro, afirmou que quando o evento foi planejado, os índices apontavam para uma retomada segura, mas, devido ao recente aumento de casos na capital mineira e a orientação do Conselho Municipal de Saúde de Belo Horizonte por não realizar grandes eventos, a decisão foi pelo adiamento.
Felipe Viana de Mattos, 32 anos, trabalha na SleepWalkers desde 2019 e acredita que a decisão tomada pela produtora ao adiar o Festival de Verão foi a melhor possível, tanto para os organizadores quanto para o público . Na visão do publicitário, a probabilidade de uma parte do público ou até mesmo dos artistas e suas respectivas equipes testarem positivo para covid durante a realização do festival ou posteriormente a ele, era significativa.
Recentemente remarcado para os dias 24 e 25 de setembro, agora o Festival de Verão será mais um megaevento previsto para o segundo semestre deste ano. Sendo realizado juntamente com o Festival Planeta Brasil e o BH Dance Festival (BHDF), 90 artistas nacionais e internacionais se apresentarão entre os seis palcos dispostos em um formato inédito que ocupará todos os 360° da esplanada do Mineirão, “como se o Festival estivesse abraçando o estádio”, explica Viana.
O desejo pela festa
Lollapalooza, Só Track Boa, REP Festival, Primavera Sound, Sarará e Breve Festival são alguns dos vários eventos musicais previstos para 2022. Além destes, um dos mais esperados, o Rock In Rio, que está com as datas marcadas entre 2 e 11 de setembro de 2022, vendeu em uma hora e meia 200 mil ingressos antecipados. Para o doutor em comunicação e pesquisador da área de megaeventos Flávio Lins, esse número recorde demonstra que “apesar da crise financeira e do alto número de desempregados no país, há um desejo muito grande pela festa, sobretudo de uma geração que estava acostumada a sair”.
Na visão do pesquisador, o restabelecimento financeiro do setor de eventos poderá demorar alguns anos, perante as perdas significativas acometidas nos últimos tempos, pois, além da pandemia, a crise econômica que o Brasil já estava enfrentando, contribuiu para que empresas e prestadoras de serviços em grandes eventos encerrassem as suas atividades.
De acordo com a Associação Brasileira de Promotores de Eventos (Abrape), estima-se que mais de 450 mil trabalhadores diretos e indiretos ficaram desempregados. Diante deste cenário, Lins pontua o gosto do povo brasileiro pelo “ato de festejar” como um indicador favorável para a recuperação econômica do setor a partir da retomada dos eventos culturais.
João Pedro Rocha da Silva, 19 anos, relata que já possui planos para ir ao Rock In Rio e que está com saudades da sensação de estar em meio a multidão. O estudante de Letras da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), que já está imunizado com duas doses da vacina, afirma não ter problemas quanto ao adiamento dos megaeventos dado a situação sanitária instável que o país está enfrentando. Ele espera que até o segundo semestre de 2022 “o Brasil tenha controlado a circulação do vírus e que seja seguro frequentar shows assim como foi em 2019”.
Em nota divulgada no Jornal do Campus da USP, a assessoria do Rock In Rio afirmou que “ainda é cedo para estabelecer quais protocolos de biossegurança serão adotados no festival devido à incerteza quanto ao desfecho da pandemia”, mas os organizadores se dizem confiantes e se comprometem a seguir rigorosamente os protocolos de saúde.
O que as pesquisas científicas apontam
Visando estudar a evolução da pandemia no Brasil, o grupo interdisciplinar Ação Covid-19 simulou as possíveis situações epidemiológicas deste ano. Em agosto de 2021 os 25 pesquisadores de 13 instituições nacionais e internacionais (entre elas USP, Unicamp, UFABC, Universidade de Bristol e Universidade de Liverpool), publicaram um estudo que apontava a reabertura de estádios e a realização de megaeventos como uma “decisão precipitada”.
Nas projeções apresentadas, dependendo da densidade demográfica e do índice de proteção das cidades contra o coronavírus, a imunidade das pessoas vacinadas têm duração de 12 a 18 meses. Mas, devido a liberação de eventos, a eficácia da vacina poderá ser comprometida, ocasionando um pico de infecções no próximo mês de março.
Descrevendo a pandemia como um acontecimento traumatizante e exaustivo em sua vida, Maria Teresa Carvalho de Deus, 19 anos, afirma que apesar de estar totalmente imunizada, sente-se insegura e não pretende de forma alguma frequentar megaeventos. Na sua visão, grandes aglomerações em meio à circulação de novas variantes do coronavírus são um risco.
“Eu acho que ainda não é o momento para voltar a frequentar eventos dessa magnitude.” A estudante teme um próximo pico de infecção antes do esperado, mas acredita que a vacinação infantil contra a covid “é um alívio diante do cenário atual”, finaliza.
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