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Vista panorâmica da cidade de Belo Horizonte com Praça da Liberdade ao centro.
RMBH é a maior aglomeração populacional do Brasil, fora do eixo Rio-São Paulo/ Foto: Marcus Desimoni

Setor industrial molda economia da RMBH e fortalece capital mineira

Entenda o papel que a região metropolitana de BH exerce sobre a capital e os principais setores econômicos envolvidos

Inaugurada em 1897, Belo Horizonte surge como capital desbancando a cidade de Ouro Preto, tida como ultrapassada perante o novo pensamento republicano da época. BH foi idealizada para ser uma cidade moderna, inspirada em cidades como Paris e Washington. Aarão Reis, engenheiro responsável pelo planejamento, visava manter a nova capital dentro dos limites da Avenida do Contorno e, por isso, seus arredores foram estrategicamente pensados desde o início – ao passo que outras partes da cidade cresceram com base na ocupação de seus moradores, como é o caso da região metropolitana.

Com o aumento desordenado da região, motivado principalmente por questões econômicas, o território de Belo Horizonte expandiu-se além dos limites previstos, incorporando áreas das cidades vizinhas e dando início a um processo de conurbação urbana. Para Carla Ferretti, Mestre em História pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), especializada na história de Belo Horizonte, durante a década de 1940 essa expansão foi potencializada graças à ação do então prefeito da cidade, Juscelino Kubitschek (JK): “Ele buscava ações de modernização e, na ocasião, associado a uma política de industrialização feita por Getúlio Vargas, deu origem à formação da Cidade Industrial entre Contagem e Belo Horizonte”.

Assim como no caso da Cidade Industrial, outras regiões foram se desenvolvendo e crescendo, chegando em certo momento a serem confundidas com a própria capital – sendo, por isso, chamadas de Grande BH. Composta por 34 municípios, a Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH) nasceu com o objetivo de promover um desenvolvimento urbano mais coordenado, ao integrar essas cidades que estavam em exponencial desenvolvimento. Atualmente, a região concentra atividades comerciais, industriais e culturais, influenciando significativamente o desenvolvimento de todo o estado mineiro.

Uma Região Metropolitana diferente

Além das cidades presentes na RM, Minas Gerais apresenta uma peculiaridade em relação aos demais estados do país, que é a presença de um Colar Metropolitano, que foi definido idealmente graças a cidades que não possuem necessariamente limite de município com BH, mas que também fazem parte do núcleo urbano da região. Entretanto, para Tânia Maria de Araújo, arquiteta e urbanista pela UFMG, com especialização em planejamento territorial pela PUC Minas, a expansão da RMBH e de seu Colar “apresenta uma abrangência equivocada, pois o critério de sua formação deixou de ser de uma real ‘influência sobre as demais’, para uma ‘conveniência política’”, visto que certos municípios, como Itaguara, Rio Manso e Baldim, não apresentam qualquer relação com o núcleo belorizontino.

A arquiteta afirma que, historicamente, a expansão da RMBH está diretamente relacionada a fatores como a localização estratégica da capital. A região metropolitana possui estradas de ligação importantes, como a Fernão Dias (BR-381), que conecta a capital paulista a cidades metropolitanas como Contagem e Betim, além de cidades envolvidas na exploração de minério, como Nova Lima e Brumadinho. A BR-040 é a principal rota de escoamento do minério extraído da região, ligando Minas Gerais a outras metrópoles, como Rio de Janeiro e Brasília, e contribuindo para o desenvolvimento econômico da região mineira, completa Tânia Maria de Araújo.

Também do ponto de vista econômico, a relação entre RMBH e a capital é dinâmica, de modo que, segundo o professor e economista especializado em mercado de trabalho e desenvolvimento local, Marcelo Mendonça: “As cidades da RMBH possuem vocações econômicas diferentes, o que permite a descentralização de atividades, formando um sistema econômico integrado que contemple o setor industrial, de agronegócio, de comércio, de serviços, além de um mercado de trabalho unificado”.

Setor industrial

Caracterizada por uma indústria diversificada, com destaque para os setores de siderurgia, metalurgia, automotivo, químico e tecnologia da informação. Cidades como Betim, Contagem e Ibirité se destacam como fortes polos industriais, sediando multinacionais como: FIAT (montadora de veículos), Vallourec (manufatura) e grandes siderúrgicas. Essas empresas impactam direta e indiretamente na economia mineira, visto que: “empresas de logística que atendam essas grandes indústrias se fazem necessárias, além da presença de outras empresas que processam minérios ou produzem máquinas e equipamentos voltados para o setor”, completa Marcelo Mendonça.

O impacto econômico proporcionado por essas empresas faz com que o executivo governamental ofereça programas de incentivo fiscal. Vantagens como a redução de alíquotas de ICMS, o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços, entre outros benefícios e isenções, são concedidas com o objetivo de atrair e manter indústrias na região e, consequentemente, movimentar a economia local. Além disso, o governo investe em programas de capacitação de mão de obra especializada, em parceria com instituições como o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI) e universidades, para qualificar trabalhadores para setores industriais de alta tecnologia, fortalecendo ainda mais o desenvolvimento econômico e social da área.

Segundo dados do Boletim Econômico do Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG), a partir de levantamento do IBGE, a produção industrial de Minas Gerais cresceu acima da média nacional em 2023 e fechou o ano com avanço de 3,4%, enquanto a média nacional foi de 0,2%. Embora o setor seja um dos principais motores da economia mineira, a infraestrutura logística ainda é um desafio, com estradas e ferrovias que precisam de melhorias para facilitar o transporte de bens e insumos. Para Marcelo Mendonça: “Os governos estadual e federal não têm a capacidade de investimento necessária para atender à demanda do setor”. Muitas indústrias ainda precisam se modernizar para se tornarem competitivas no mercado global, principalmente quanto à adoção de novas tecnologias e práticas de sustentabilidade. “Algumas empresas ainda utilizam de processos da Segunda Revolução Industrial e necessitam de investimentos para a transição para a Terceira Revolução Industrial, com uso de informática, eletrônica e robótica”, completa o professor.

Agronegócio

Por mais que a RMBH seja industrializada, ela também apresenta áreas rurais que desempenham papel fundamental no abastecimento local e da própria capital, com distribuição de alimentos como hortaliças, legumes, frutas, leite e derivados, além de flores e plantas ornamentais. A proximidade geográfica facilita o transporte rápido de produtos agrícolas, garantindo maior frescor e reduzindo custos logísticos, o que é uma vantagem competitiva para os produtores locais. Pequenos produtores da região metropolitana abastecem mercados e feiras de Belo Horizonte, como o Mercado Central, sacolões e outros pontos de venda de produtos agropecuários.

Conforme explica Marcelo Mendonça, “A maior parte das propriedades agrícolas é de pequeno ou médio porte, voltadas principalmente para a agricultura familiar. Esses produtores atendem prioritariamente ao mercado interno, devido à escala. Muitos dos produtos cultivados são perecíveis, o que dificulta sua exportação em larga escala, pois o transporte a longas distâncias exige uma logística mais complexa e cara. Existem alguns nichos com potencial para exportação, como o setor de plantas ornamentais e flores, mas ainda em escala modesta”.

Embora, em 2023, o setor tenha tido o maior crescimento do PIB percentualmente, com um aumento de 11,5% na comparação com o ano de 2022, e Minas Gerais seja um grande exportador de café, soja e carne bovina, esses produtos são mais provenientes de outras regiões do estado, como o Triângulo Mineiro e o Sul de Minas. A preocupação perante o agronegócio da RMBH, se intensifica com o avanço da urbanização na região metropolitana pode pressionar áreas rurais e diminuir o espaço disponível para a produção agrícola, representando um  potencial desafio.

Extensa plantação de milho, com árvore ao centro e céu nublado.
Bom desempenho do setor se deve pela alta principalmente das produções de café, milho, soja e cana-de-açúcar/ Foto: Gabriel Ribeiro

Comércio e serviços:

A RMBH impacta o comércio da capital de forma expressiva, especialmente no que diz respeito ao fluxo de consumidores e à distribuição de mercadorias. Os moradores das cidades vizinhas à capital frequentemente se deslocam para Belo Horizonte em busca de maior variedade de produtos, serviços e centros de compras, o que aumenta o volume de vendas no comércio local. Segundo Marcelo de Souza e Silva, presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas de Belo Horizonte (CDL/BH): “A capital funciona como um centro logístico regional, facilitando a distribuição de mercadorias para toda a RMBH”. Essa conexão fortalece o comércio da capital, tornando-a um ponto de convergência para consumidores e fornecedores, além de alimentar uma dinâmica econômica de reciprocidade entre a capital e seus municípios vizinhos.

Presidente da CDL/BH, Marcelo de Souza e Silva.
Presidente da CDL/BH, Marcelo de Souza e Silva/ Foto: Divulgação CDL/BH

A disparidade na infraestrutura da capital em relação às cidades da RMBH que possuem menor oferta de serviços essenciais, como transporte público e logística avançada, surge como um dos principais desafios dos setores de comércio e serviços, limitando o crescimento econômico da região. Para Marcelo de Souza e Silva: “A centralização de serviços e comércio em Belo Horizonte torna difícil para os municípios vizinhos competirem com a ampla variedade de produtos, maior qualificação da mão de obra e melhor acesso a mercados especializados da capital”. Isso também se reflete na atração de investimentos, onde Belo Horizonte tende a concentrar empresas com maior porte, tecnologia e centros de distribuição, criando barreiras para um desenvolvimento mais uniforme entre a capital e seus municípios vizinhos.

O crescimento do comércio digital é outra questão que merece atenção. Por um lado, amplia o alcance de negócios locais, permitindo que empresas de cidades vizinhas à capital vendam produtos e serviços para um público mais amplo, incluindo consumidores de outras regiões. “Isso aumenta a competitividade e oferece novas possibilidades de crescimento, especialmente para pequenas e médias empresas”, completa o presidente da CDL/BH. Por outro lado, o desafio da infraestrutura digital nas cidades menores da RMBH, como acesso limitado à internet de alta qualidade e logística menos eficiente, pode dificultar a entrega rápida de mercadorias e a implementação de estratégias digitais eficazes.

Mercado de trabalho

Outro ponto importante é o mercado de trabalho. Muitas cidades da RMBH, chamadas de “cidades-dormitório”, como Ribeirão das Neves, abrigam uma grande parcela da força de trabalho que se desloca diariamente para a capital em busca de oportunidades nos setores de serviços, administração pública e tecnologia. Isso cria um fluxo econômico contínuo entre a capital e a RMBH, que beneficia ambos os lados. O setor de tecnologia da informação e o crescente número de startups que surgem tanto em Belo Horizonte, quanto em cidades vizinhas, evidencia o impacto econômico.

De acordo com informações do Novo Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Novo Caged) do Ministério do Trabalho e Previdência, as cidades da RMBH são maioria no Top 10 de criação de vagas no estado. Com um superávit de 144.298 empregos gerados entre janeiro e junho deste ano. O setor de serviços foi o que obteve o melhor desempenho, somando 85,6 mil postos de trabalho durante os seis primeiros meses do ano. Por outro lado, o setor de agropecuária foi o que menos avançou, totalizando 25,2 mil empregos disponibilizados no mercado. 

Vários desafios econômicos afetam tanto a capital quanto os municípios ao seu redor. Um dos principais problemas é a desigualdade socioeconômica, que resulta em uma disparidade significativa entre áreas mais desenvolvidas, como Nova Lima e Betim, e aquelas com altos índices de pobreza, como Ribeirão das Neves e Santa Luzia. Essa desigualdade dificulta a distribuição equitativa de oportunidades econômicas, acesso a serviços básicos e infraestrutura de qualidade.

Esta é a primeira de uma série de publicações sobre a RMBH. Acompanhe aqui no Colab PUC Minas  os demais textos sobre meio ambiente e mobilidade urbana.

Leia também: Centro de Belo Horizonte: mudanças geram controvérsias sobre o futuro da região

João Vitor Rangel

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