O déficit no saneamento básico brasileiro impacta de forma direta a dignidade e a saúde das mulheres. A 17ª edição do Ranking do Saneamento, do Instituto Trata Brasil, publicado em julho de 2025 mostra que apenas 12 dos 100 municípios mais populosos investem acima do necessário para universalizar os serviços. Embora a média de abastecimento de água chegue a 93,9%, a coleta de esgoto continua desigual, enquanto Belo Horizonte supera 90% de cobertura, cidades como Porto Velho e Macapá não alcançam 10%.
Em Minas Gerais, a Copasa registra 99% de cobertura de água, mas apenas 78,2% de coleta e tratamento de esgoto, revelando a distância da meta nacional de 90% até 2033. Essa lacuna compromete políticas públicas como o Programa Dignidade Menstrual, que só é efetivo quando acompanhado de acesso à água potável e banheiros adequados.
Estudo da Fiocruz em Belo Horizonte evidencia como a falta de saneamento afeta a vida de mulheres em ocupações urbanas, expondo-as à falta de privacidade, à vulnerabilidade e a riscos de saúde, como infecções urinárias e complicações na gravidez. Depoimentos de moradoras traduzem em experiência concreta o impacto da ausência de infraestrutura: “Banheiro é sua intimidade”, relata uma delas.
Os 329 municípios mineiros descobertos em alguma demanda quando o assunto é abastecimento de água ou saneamento básico ganham mais relevância ainda quando pensamos em quem menstrua. O Governo Federal promove o programa Dignidade Menstrual, buscando promover equidade de gênero, justiça social e saúde pública por meio da distribuição gratuita de absorventes, formação de agentes públicos e conscientização sobre a menstruação como um fenômeno natural que deve ser acolhido. Em nota, o Ministério da Saúde explicou que a iniciativa só é efetiva quando “acompanhada de condições básicas de higiene: água potável, banheiros adequados e infraestrutura de saneamento.”
Amanda Elias Arruda e Léo Heller, pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) em Belo Horizonte, conduziram um estudo que ilustra como a precariedade do saneamento interfere diretamente na vida das mulheres. A pesquisa entitulada “Acesso à água e esgotos em ocupação urbana na Região Metropolitana de Belo Horizonte: efeitos na saúde, qualidade de vida e relações de gênero” (2022) analisou a realidade da Ocupação Vitória, onde a ausência de banheiros adequados compromete a privacidade e a saúde das moradoras.
Uma das participante relatou: “Sempre que chega alguém eu tenho que correr e pôr um pano” . Outra destacou a prioridade de reformar o banheiro em relação à própria casa: “Banheiro é sua intimidade, né?! Então é isso, tem uma necessidade do cuidado, por isso que eu optei por mexer no banheiro primeiro da minha casa e depois cuidar do resto”. Os pesquisadores apontam que a falta de condições adequadas pode gerar infecções do trato urinário, associadas a complicações como partos prematuros e má-formação fetal.

Além da privacidade, o acesso à água também aparece como um fator de desigualdade de gênero. Sem fontes seguras, mulheres e crianças relatam percorrer longas distâncias para coletar água, muitas vezes em áreas de risco. “Os meninos já ficaram mais de uma semana sem ir à escola porque não tinha água para eles tomarem banho, nem água para fazer comida para mandar os meninos pra escola” , disse uma moradora. Outras relataram medo de violência nos trajetos: “Já teve situação de tentativa de estupro… mas é o único lugar que a gente tem”.
No estudo, moradoras contaram como a ausência de portas no banheiro afetam a privacidade: “Sempre que chega alguém eu tenho que correr e pôr um pano”. Outra entrevistada ressaltou a importância da intimidade: “Banheiro é sua intimidade, né?! Então é isso, tem uma necessidade do cuidado, por isso que eu optei por mexer no banheiro primeiro da minha casa e depois cuidar do resto”. Segundo o estudo, essa falta de condições básicas pode provocar infecções do trato urinário, associadas a complicações como partos prematuros e má-formação fetal.
O trabalho também revela como a coleta de água, na ausência de fontes seguras, recai sobre mulheres e crianças. “Cada menino pega um litro, os maiores pegam o que aguentam e vai buscando, faz uma viagem, duas viagens até encher”. Além do esforço físico, há riscos: “Já teve situação de tentativa de estupro… Tem homem que fica lá pelado, de cueca tomando banho. Eles não respeitam, mas é o único lugar que a gente tem”.
O tempo gasto para buscar água, a insegurança nos trajetos e a falta de privacidade interferem na escolarização de crianças, no trabalho remunerado e no bem-estar físico e mental das mulheres. Os pesquisadores apontam uma forte ligação entre desigualdade de gênero e saneamento precário.
Em nota, Copasa informou que projeta R$ 16,9 bilhões em investimentos de obras que vão aprimorar os serviços de saneamento e levar mais qualidade de vida à população mineira até 2029, com foco na ampliação dos sistemas de esgoto, principalmente em municípios de pequeno porte e em áreas rurais. A meta é atingir 90% de cobertura de esgotamento sanitário até 2033, conforme estabelecido no Novo Marco Legal do Saneamento.




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