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Estátua da Mafalda em San Telmo, Argentina
Estátua da Mafalda em San Telmo, Buenos Aires, Argentina (Créditos: Nico Kaiser / Via Flickr)

O olhar visionário de Quino sobre um mundo complexo

Conheça o legado do cartunista argentino e sua relevância para a sociedade e artistas latino-americanos

Mafalda é uma das personagens mais conhecidas no universo dos quadrinhos. Sua presença é comum nos livros didáticos escolares há gerações. As ideias complexas ditas de forma simples e uma visão crítica do mundo são características da personagem que, durante anos, refletiu sobre o capitalismo, economia e diversos problemas sociais. 

Por trás do pensamento prodígio de Mafalda, existia uma mente brilhante, que colocava no papel toda a insatisfação com a sociedade, e levantava assuntos que deveriam ser debatidos. Essa mente pertencia ao cartunista argentino Joaquín Salvador Lavado, conhecido como Quino nascido em 1932, em Mendonza, na Argentina, e morto no dia 30 de setembro de 2020. 

Com a notícia de sua morte, centenas de artistas e quadrinistas argentinos, brasileiros e de todo o mundo manifestaram pesar em suas mídias sociais, desenhando homenagens e agradecimentos póstumos ao pai da pequena criança de vestido vermelho.

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Para sempre, Quino. Gracias.

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Nascida em 1964, apresentada pela primeira vez na revista Primeira Plana, Mafalda talvez tenha sido a mais conhecida personagem e obra de Quino. Traduzida para mais de 30 idiomas, as tirinhas da personagem fizeram sucesso no mundo inteiro, tornando Quino o cartunista de língua espanhola mais traduzido do mundo. Em 1973, após 1.928 tiras, Quino decidiu parar de desenhar Mafalda. Seus livros continuaram a ser vendidos e a popularidade da personagem rendeu diversos produtos como chaveiros, cadernos, coleções etc, que são sucesso até hoje.

“O Quino foi, sem dúvida, um dos maiores cartunistas da história. Ele conseguia unir um desenho tão agradável e sensível a grandes questionamentos sociais e políticos – quase sempre latinos -, criando um cenário perfeito para discutir algo tão profundo. Um cara que tinha um poderoso poder de síntese, que falava muita coisa quase sempre sem usar uma simples palavra nos desenhos”, diz o cartunista Bruno Lanza que atualmente trabalha como artista freelancer e colabora para o jornal mineiro BHAZ. 

Os ideais de Quino sempre foram bem representados em suas obras, como denúncias da ditadura na Argentina, e a influência cultural do capitalismo no mundo. Em 1984, Quino cria junto com o diretor cubano Juan Padrón uma série de curta-metragens chamada Quinoscopios. No formato de animação, Quino transmite seus pensamentos e opiniões sobre diversos assuntos que ainda são relevantes na atualidade.  

Como dizia Mafalda, “o urgente não deixa tempo para o importante”

Certamente, grande parte do sucesso da personagem está relacionado com a reflexão que fazia sobre o capitalismo, injustiças sociais e questões econômicas. O legado de Quino tem grande importância, não só para cartunistas, mas também para jornalistas, escritores, artistas gráficos etc.  

“Na área do cartum e das charges, a influência do Quino é importante, pois ele usa a ferramenta dos quadrinhos para passar mensagens de contexto político-social, reflexão e protesto para abrir os olhos da sociedade. Não só usava a arte dos quadrinhos como entretenimento/diversão, mas para um bem maior”, diz o cartunista Gilmar Barbosa, mais conhecido como Gilmar, que já publicou para diversos jornais e revistas como Folha de S. Paulo, entre outros. 

Desde sua origem, as tirinhas de Mafalda analisaram criticamente problemas na sociedade através de metáforas que desviam do universo imaginado para o público infantil. Com a sutileza de uma mensagem construída por uma criança, Quino reforçou em seus leitores  a importância em debater determinados assuntos, usando recursos capazes de atingir diferentes públicos e ultrapassar gerações.

A charge como força política

Gilmar, que também é autor do livro Brasil 2019 em Charges, comenta sobre a importância das charges diante dos problemas que enfrentamos na sociedade hoje: 

“Neste ano, mais do que nunca, a arte da charge é fundamental nas questões políticas e de pandemia. A forma de comunicação rápida que dá para fazer nas redes sociais tem grande alcance, pois contamos com uma ferramenta excessiva de comunicação imediata. Temos o comportamento de consumo instantâneo, então a charge tem feito um papel importante nesse tempo sombrio e obscuro de mostrar e alertar para as coisas que estão acontecendo”.

Para Bruno Lanza, hoje em dia, , a crítica da realidade é manifestada em grande parte via redes sociais. “Eu costumo ver a internet, acima de tudo, como uma grande aliada nesse processo de divulgação de trabalho. Acredito que ela democratizou muito a produção de arte no geral e a possibilidade de ganhar alcance, mesmo sem ter um grande canal ou empresa por trás. Os desafios existem, mas são basicamente os do nosso contexto atual: polarização extrema de opiniões, pouca (ou nenhuma) tolerância com opiniões contrárias, e uma “sede” interminável por novidades a todo tempo”. Reforça Lanza, que também usa o cartum para fazer denúncias de problemas sociais que acontecem no Brasil.

Prêmio Vladimir Herzog premia charges com temas políticos

A 42º edição do Prêmio Vladimir Herzog premiou duas charges dos cartunistas Laerte e Duke que abordam questões políticas com críticas ao atual governo. A charge vencedora é “Infernópolis” de Laerte. Publicada na Folha de S. Paulo, a arte é um retrato da ação policial em um baile funk em Paraisópolis, São Paulo, que deixou nove pessoas mortas. 

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#Laerte ☠️

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Duke recebeu Menção Honrosa pela charge que faz uma dura crítica à fala do presidente Jair Bolsonaro, que no início do ano ironizou o número de mortos por Covid-19. A fala do presidente foi retratada pelo chargista e publicada no site Dom Total.  

Maria Cecília Basílio

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