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Fachada do Mercado Central de Belo Horizonte, um edifício com arquitetura tradicional de tijolos e detalhes em vermelho e branco. A imagem mostra o cruzamento de ruas em frente ao mercado, com pedestres e árvores ao redor, em um dia ensolarado.
Documentação histórica do Mercado será recolhida e preservada pelo Arquivo público da cidade de Belo Horizonte.

95 anos de Mercado Central: o terceiro melhor do mundo

Mercado Central KTO, eleito o 3º melhor do mundo em 2016, une tradição e modernidade, sendo um dos principais pontos turísticos de BH.

Localizado no centro de Belo Horizonte, com oito entradas em diferentes ruas, como a Avenida Augusto de Lima e a Avenida Amazonas, o Mercado Central foi considerado o terceiro melhor do mundo pela revista de bordo TAM nas Nuvens, em 2016. A instituição, que é um dos principais pontos turísticos da cidade, vendeu o naming rights para uma plataforma de apostas esportivas e jogos online, e agora carrega o nome de Mercado Central KTO.

Atualmente, o Mercado conta com mais de 400 lojas em seus corredores, que exalam aromas de temperos, queijos, frutas e o famoso fígado com jiló bastante característico. O Mercado começou a funcionar em 1929, quando a cidade tinha apenas 31 anos. O prefeito da capital na época, Cristiano Machado, criou um centro de abastecimento único para atender toda a população, com diversas barracas ao ar livre. Em 1964, quando a cidade alegou não conseguir mais administrar a feira, os próprios comerciantes do local resolveram comprar o imóvel da Prefeitura, e construíram um galpão fechado, tornando-o um mercado privado.

Por ter se tornado um mercado privado há uns bons anos, acho que ele acabou sendo um mercado bem cuidado, sabe? A gente sempre preza para que lojas estejam mais arrumadas, o estacionamento… Estão sempre fazendo obras, melhorias”, conta Marcela Duarte, proprietária da Du Artes Artesanato.

A essência do mercado

Em uma loja de condimentos, em um bar onde é servida uma cerveja gelada em um copo lagoinha, ou até mesmo em meio aos longos corredores, memórias são construídas e ajudam a moldar a identidade cultural do Mercado. Assim como no relato da médica veterinária Jéssica, que decidiu comemorar sua despedida de solteira no espaço, junto de todos os seus amigos, no Bar Zé da Onça. “Hoje é a minha despedida de solteira e eu escolhi aqui para fazer história, exatamente por isso”.

Grupo de pessoas sorrindo dentro de um mercado. Elas estão vestindo camisetas brancas personalizadas e aparentam estar celebrando um evento descontraído. O local apresenta estandes comerciais ao fundo, com diversas placas e produtos expostos.
Mercado Central recebe eventos diversos, como a despedida de solteira da veterinária Jéssica / Foto: Gustavo Oliveira

A mineiridade presente no Mercado, no atendimento das lojas e o público simpático também são fenômenos que tornam o local único e que continuam atraindo tantas pessoas até os dias atuais. É por isso que Ricardo Andrade, representante comercial que frequenta o Mercado desde criança com seu pai, comenta:

Eu acho o seguinte: primeiro o mineiro é muito aconchegante, e o Mercado daqui é ‘mineirado’, todo mundo aconchegante. Você vê o pessoal aqui das barracas, das lojas, esse ‘trem’ todo, todo mundo aconchegante, não tem ninguém de cara feia. Todo mundo te trata bem, você anda aqui pelos corredores, todo mundo tranquilo, todo mundo pelo mesmo ideal, tipo assim, curtir, aproveitar, isso é muito importante”.

Corredor interno de um mercado com várias lojas e placas indicando estabelecimentos como 'Comercial Sabiá' e 'Ponto das Farinhas'. O local está movimentado, com pessoas caminhando e conversando entre os estandes, que exibem produtos como grãos, farinhas e itens diversos.
O Mercado é uma das paradas do Circuito Cultural da Praça da Liberdade Corredor R-14 do Mercado / Foto: Gustavo Oliveira

Café Dois Irmãos

Quem visita o Mercado Central em busca de um café pode acabar sendo atraído pelo tradicional estabelecimento Café Dois Irmãos. Fundado há 39 anos, o comércio, que antes era muito procurado em razão do preço, agora atrai o público pelo bom sabor, que se tornou essencial para a conquista de seus clientes e turistas.

Sidney Gonçalves, fundador do estabelecimento, conta que não apenas o café é famoso, mas a broa de fubá se tornou um prato bastante procurado no local: “Sempre vem alguém… turista querendo comer pão de queijo, mas chegou aqui no Café Dois Irmãos, na hora que experimenta a broa, é a broa que se destaca, por isso nos destacamos com a broinha”.

A história de Sidney é mais uma trajetória marcada pela migração do interior para a capital. O proprietário conta que veio da cidade Luz, no centro-oeste mineiro, e começou a vender verduras ganhando menos de um salário mínimo, em cruzeiros, trabalhando 18 horas por dia. Depois de muita luta, começou a trabalhar com café e, junto do seu irmão, em 1985 abriu a loja dentro do Mercado. “E é onde eu valorizo muito, quero muito, falo que o Mercado é a minha casa, é a minha praia, é a minha vida, justamente porque eu lutei muito pra chegar até lá”.

Um homem idoso com camisa verde e uma mulher jovem com tranças longas e sorriso largo posam juntos em um ambiente interno. Ao fundo, uma parede cheia de fotos emolduradas, retratando momentos e pessoas, além de prateleiras com caixas de cigarros expostas. O local tem uma atmosfera descontraída e parece ser um estabelecimento comercial.
Sidney Gonçalves e sua filha colecionam memórias dentro da lanchonete do Café Dois Irmãos / Foto: Cibelle Irias

Du Arte Artesanatos

A Du Arte Artesanatos é um comércio familiar, que começou como uma venda de hortaliças dentro do Mercado. Diante da pandemia, Marcela Duarte, filha e neta dos antigos donos, assumiu e tornou a loja um estabelecimento com especialidade em produtos têxteis artesanais.

Entre as principais peças vendidas, estão as mantas, os tapetes e as peças americanas, tudo feito em tear e algodão. A proprietária explica como isso chama a atenção do público: “Acho que o fato de serem produtos cem por cento mineiros. Isso atrai bastante o público, principalmente os turistas”

Fachada da loja 'Du Arte Artesanatos', destacando um letreiro roxo com moldura decorativa. No interior, há prateleiras organizadas com tecidos, toalhas e peças de artesanato coloridas. O ambiente é iluminado com luzes internas e detalhes de decoração como estrelas penduradas no teto.
A Du Arte recebe diversas pessoas zelosas com a casa, principalmente interessadas em fazerem mesa posta / Foto: Gustavo Oliveira

Tradicional Limonada

Com 86 anos de existência, o sabor clássico e refrescante da Tradicional Limonada atrai grande demanda de clientes fiéis e turistas. Apesar do seu carro-chefe ser a limonada, o comércio ainda dispõe de caipirinhas e se aventura na mistura da limonada com outros ingredientes, como a groselha, o chá-mate, gengibre, dentre outros.

Raí Amorim, que comanda o balcão ao lado de seu irmão, Rodolpho Amorim, conta o quanto sente orgulho de fazer parte da história do Mercado. Tendo herdado o negócio de seu avô, ambos tentam manter o bom atendimento para fidelizar seus clientes e conquistar os novos públicos, mas também para ter uma participação agradável no dia de quem passa pela sua loja: “O que nos motiva é justamente isso: Participar da vida das pessoas, participar de uma maneira positiva. Ver a satisfação das pessoas e ver que eles têm a limonada como patrimônio próprio mesmo. Não é só da nossa família, é uma parte da história de BH. Dá muito orgulho de fazer parte disso”.

Interior de um estabelecimento com uma parede decorada por azulejos em tons de verde. Em destaque, um retrato emoldurado de um homem idoso com expressão séria e camisa branca. Ao lado, adesivos com frases e desenhos, como 'Devagar também é velocidade' e outros elementos decorativos. Na parte inferior, há um equipamento cinza com detalhes verdes da marca IBBL.
A loja foi fundada em 1938 pelo imigrante português Sr. Américo e, em 1940, o “Seu Gabriel” se tornou sócio e “mineirizou” a limonada / Foto: Gustavo Oliveira
Dois atendentes sorrindo atrás do balcão de um estabelecimento, sendo um deles com óculos e camiseta clara com um logotipo de limão, e o outro com camiseta preta. O ambiente possui decoração temática de limão com cardápios detalhando bebidas como limonadas e 'Caip do Vô', além de uma vitrine exibindo opções de bolinhos de feijão. Ao lado direito, uma placa indica o local do caixa e equipamentos de cozinha completam o cenário.
Desde criança, Raí sempre ajudou sua família na loja / Foto: Gustavo Oliveira

O Mercado Central e a Geração Z

Apesar de ser um ícone turístico de Belo Horizonte, o Mercado Central parece ter dificuldade de conquistar a atenção do público jovem. Sebastião Franco, servidor público de 60 anos, conta que frequenta o Mercado cerca de uma vez ao mês, sempre que vem visitar Belo Horizonte. Segundo ele, os corredores do Mercado não possuem um grande número de jovens frequentando. A reportagem realizou uma enquete no Google Forms, que foi divulgada nas redes sociais, alcançando cerca de 87 pessoas, e revelou que, entre jovens de 18 a 25 anos, cerca de 62% visitam o Mercado Central raramente. Apenas 11% vão ao menos uma vez por mês, enquanto 17% afirmam nunca frequentar o local.

Imagem de um gráfico em formato de rosca que apresenta a frequência de visitas ao Mercado Central por pessoas entre 18 e 25 anos. O gráfico é dividido em três categorias: "Raramente", representando 63,6% dos entrevistados, com a maior fatia do gráfico em vermelho intenso. "Não frequento", com 17,4%, em um tom de vermelho claro. "Uma vez ao mês", com 11,9%, em um tom mais claro próximo ao rosa.
Frequência de visitas ao Mercado Central de pessoas entre 18 e 25 anos

Os dados também mostram como os jovens conheceram o Mercado: 57,6% relatam que a visitação é influenciada por hábitos familiares, enquanto 24,7% foram incentivados por amigos. Apenas 9,5% conhecem o Mercado por meio das redes sociais, evidenciando o baixo impacto das plataformas digitais na popularidade do espaço. Esses números destacam a força turística do Mercado Central, mas também revelam a necessidade de estratégias mais eficazes para atrair o público jovem e diversificar a experiência oferecida.

A imagem apresenta gráficos circulares mostrando os meios pelos quais as pessoas obtiveram conhecimento sobre o Mercado Central de Belo Horizonte. Os dados estão distribuídos da seguinte forma:

56,7%: Hábito familiar.
24,7%: Indicação de amigos.
9,5%: Redes sociais.
8,2%: Publicidade de rua, televisão, rádio ou jornal.
Os gráficos destacam a predominância do conhecimento transmitido por hábitos familiares e indicações pessoais em relação a outros meios de divulgação

Tradição e Modernidade

O Mercado possui um estilo característico tradicional. Os corredores são repletos de clientes que frequentam o local desde a infância, mas, com o passar dos anos, os comerciantes precisaram se adaptar para conseguir se adequar à modernidade e à conectividade para atrair mais pessoas e chamar a atenção dos turistas.

A pandemia da COVID-19 representou um momento crítico para muitos trabalhadores do Mercado. O fechamento temporário forçado resultou na interrupção das vendas e na perda de clientes, levando aproximadamente 30 estabelecimentos a encerrarem suas atividades. Muitos comerciantes precisaram se ajustar a uma nova forma de vender suas mercadorias, com bastante foco no uso das redes sociais e das plataformas de entrega.

Sidney Gonçalves, proprietário do Café Dois Irmãos, é um exemplo de como a adaptação pode ser a chave para a sobrevivência. Com a necessidade de fechar as portas fisicamente, ele rapidamente começou a explorar o potencial das vendas online. O comerciante passou a vender pelo WhatsApp e a fazer entregas com o motoboy para conseguir manter seu negócio de pé. Essa mudança não apenas preservou a base de clientes já existente, mas também atraiu um novo público que valoriza a conveniência das compras online.

Outra história de resiliência e inovação vem da tradicional Limonada. Para continuar atraindo novos consumidores, os irmãos Raí e Rodolpho Amorim decidiram modernizar a identidade da marca, sem perder a essência do sabor da limonada, que foi transmitido por gerações, implementando uma nova identidade visual. “A partir de 2016, eu e meu irmão começamos a trabalhar na loja. Meu irmão fez a identidade visual, fez a logo, fizemos placa e a gente foi colocando os conhecimentos que a gente tem. Então, meu irmão fez Comunicação Visual no Senai e, depois, Relações Públicas na PUC. E eu fiz Processos Gerenciais. A gente foi colocando esses conhecimentos e mantendo o trabalho consistente do nosso avô”, explica Raí. Além da nova identidade visual, os irmãos introduziram souvenirs, como bolsas, bonés, camisas e chaveiros, todos carregando a marca da Tradicional Limonada. Essas inovações não apenas ajudam a modernizar a imagem do negócio, mas também criam novas formas de engajar o público e atrair turistas.

O Mercado Central de Belo Horizonte é um lugar que resiste mesmo diante dos diversos desafios. Ele se destaca como um espaço vibrante, onde a tradição e a modernidade andam juntas de maneira harmoniosa. A cultura rica e diversa que caracteriza a região, junto com a variedade de produtos oferecidos e a calorosa hospitalidade mineira, garantem que o Mercado continue sendo um ponto turístico importante na capital.

Reportagem produzida por Alice Ottoni de Oliveira, Cibellle Irias Gonçalves e Gustavo Oliveira de Almeida na disciplina Apuração, Redação e Entrevista no curso de Jornalismo do campus São Gabriel da PUC Minas, sob a supervisão do professor Vinícius Borges.

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