Em um cenário de crescentes incertezas e falta de oportunidades no mercado tradicional de trabalho, uma nova realidade tem ganhado espaço no meio do jornalismo: a rotina como freelancer. Com seus prós e contras, o trabalho freelancer pressupõe a ausência de um vínculo empregatício com uma empresa do ramo, sendo feito por conta própria e com remunerações variáveis, de acordo com a produtividade, por exemplo. Esse modelo de trabalho ganhou mais força com a pandemia de COVID-19, quando muitas empresas se viram obrigadas a reduzir os quadros de funcionários pensando em cortes de gastos.
O freelancer dita o seu próprio ritmo de trabalho, assumindo apenas aquilo que acredita que será capaz de produzir em tempo hábil – sempre com prazos para entregar pautas e/ou matérias, no caso específico do jornalismo. Na maioria dos casos, quem trabalha assim tem flexibilidade para escolher o local onde produzirá, com opção, inclusive, de trabalhar em casa. Essa modalidade também permite a escolha de tarefas de acordo com o interesse do trabalhador, optando por empregar suas energias apenas naquilo que lhe desperta mais atenção.
Por outro lado, o freelancer abre mão de todos os direitos e garantias trabalhistas assegurados pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Não há férias, 13° salário, FGTS, aposentadoria no modelo tradicional, nem benefícios como vale-alimentação e planos de saúde. Neste sentido, o profissional que opta por trabalhar como autônomo precisa se organizar para definir tempos de descanso e projetar a independência financeira no futuro.
Outro problema decorrente do trabalho como freelancer é a incerteza do rendimento mensal. Como a produção é realizada por demandas, não se sabe a quantidade de serviço disponível para o produtor, que pode se tornar “refém” de trabalhos mal remunerados. Esse cenário pode gerar também uma sobrecarga de tarefas, principalmente quando o freelancer visa obter maiores recompensas financeiras.
Tempo livre, desafios e busca pela independência financeira
Para a jornalista Daniela Castro (36), o trabalho como freelancer é muito mais autônomo do que qualquer outra opção de trabalho celetista. A jornalista é auxiliar e produtora de reportagens de pautas extraordinárias relacionadas à Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).
Tenho uma rotina muito mais autônoma e independente do que qualquer outro profissional contratado e/ou listado. Eu me preparo de acordo com as demandas de trabalho e aos horários que, na maioria das vezes, são flexíveis.
Daniela Castro, jornalista freelancer
Na visão de Daniela, a incerteza é um dos principais pontos negativos do trabalho como freelancer. Ainda assim, ela destaca que tem mais tempo livre para buscar novos conhecimentos e se aprimorar como profissional. “Procuro preencher o tempo vago para me preparar para possíveis atuações em áreas em que não tive a oportunidade da experiência”, comenta. Ela acredita que, embora não tenha vantagem financeira com o tempo vago, consegue tirar vantagem para o próprio desenvolvimento profissional.
Perigo para os jornalistas
Ainda que sinta-se contemplada pela escolha de atuar como freelancer, Daniela Castro reforça que a maior consequência negativa do trabalho nesta modalidade é a ausência de direitos trabalhistas. “Uma desvantagem é não ter clareza sobre qual o próximo trabalho. Profissionais fixos em uma empresa sabem, minimamente, suas funções já estabelecidas e métodos a serem seguidos, o que, na minha visão, somente auxilia e agrega na vida de um jornalista”, pondera.
Ainda assim, a jornalista acredita que a procura pela educação financeira seja o caminho para “driblar” a falta de garantias na nova modalidade de produção. “A esmagadora maioria de freelancers, não somente jornalistas, procuram adquirir conhecimentos financeiros em aplicações, investimentos a longo prazo e alguma ação que no futuro, minimamente retornará um valor para viver em melhores condições. É claro que se assume mais uma responsabilidade, de buscar mais habilidades e o risco de não alcançar a tão sonhada independência financeira. Porém, ainda assim, vejo que existem soluções e saídas para que tapemos esse buraco”, conclui.
Para Alessandra Mello, presidente do Sindicato dos Jornalistas Profissionais de Minas Gerais (SJPMG), uma grande preocupação da instituição tem relação com o fato de que freelancers podem ser contratados para “mascarar” uma relação real de trabalho celetista: “Contratam como PJ, como freela, mas, na verdade, você trabalha como celetista”, reforça.
Ela reforça a necessidade de que os jornalistas estejam sempre atentos aos seus direitos como profissionais. No site do Sindicato, há orientações para que os profissionais não confundam o trabalho temporário com o trabalho fixo, além de dicas para que tomem cuidado nas emissões das notas fiscais, entendam o que significa ser PJ e MEI.
Leia também neste Dossiê: Lugar de jornalista é no Sindicato?
Reportagem desenvolvida por Lucas Bretas, Marcelo De Angelis, Márcio Vitor Pereira, Ruan Santos e Victor Martins para a Disciplina Produção em Jornalismo Digital no semestre 2022/1.
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