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Especialistas se preocupam com pessoas com TDAH no pós-pandemia

Adolescente recostada sobre uma mesa com dificuldade de prestar atenção na aula on-line. As palavras desatenção, hiperatividade e impulsividade sobrepõe a imagem.

Adolescente estuda diante do computador. Os dizeres "desatenção, hiperatividade e impulsividade" sobrepõe a imagem com letras coloridas.

Com o retorno das atividades escolares presenciais em Belo Horizonte e região metropolitana, especialistas e profissionais da educação se preocupam com as pessoas com TDAH (transtorno de déficit de atenção e hiperatividade), especialmente crianças e adolescentes. Após 16 meses sem frequentar as escolas, quem sofre com o transtorno tem apresentado dificuldades em retomar a rotina de aulas presenciais desde agosto de 2021.

Segundo a Associação Brasileira do Déficit de Atenção (ABDA), o TDAH “é um transtorno neurobiológico, com origem genética, que aparece na infância e frequentemente acompanha o indivíduo por toda a sua vida. Ele se caracteriza por sintomas de desatenção, inquietude e impulsividade”. O TDAH prejudica o neurodesenvolvimento e provoca uma disfunção no comportamento social.

Especialistas se preocupam com futuro das pessoas com TDAH

Em julho de 2021, a revista Psicologia em Ênfase publicou o artigo Os Impactos do TDAH na Interação Social da Criança: uma revisão de literatura, escrito por Rebecca Andrade, João Paulo di Vellasco e Sara Ribeiro. Segundo os autores, os prejuízos desse transtorno podem ser evidenciados pela dificuldade de crianças diagnosticadas estabelecerem relacionamento com seus pares, buscando meios alternativos de socializar. Como consequência, a criança desenvolve um exacerbado sentimento de culpa, descontrole das emoções e baixa autoestima.

No artigo, os autores ressaltam que, no futuro, será preciso aprofundar os estudos sobre o transtorno no contexto da pandemia de covid-19, uma vez que “[a] pandemia alterou os principais meios de socialização infantil, como casa/família e escola, ambientes que normalmente se expunham em situações sociais com pais, professores e pares”.

As consequências do período de isolamento em decorrência da pandemia ainda estão sendo percebidas. Rebeca Andrade e os demais autores do artigo destacaram a importância de se desenvolverem investigações futuras acerca do impacto do TDAH em crianças no contexto da covid-19, visto que os principais meios de socialização se alteraram.

Para os autores, as escolas, ambientes que mais expunham crianças às situações sociais, precisam incluir nos planejamentos as orientações da Associação Brasileira do Déficit de Atenção (ABDA) disponíveis no site da organização a fim de minimizar os impactos negativos desse período e colaborarem com o desenvolvimento dessas crianças.

Segundo o professor e pesquisador de Neurociências e Comportamento Motor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Guilherme Menezes Lage, a dinâmica de rodízio utilizada pelos sistemas escolares dificultava a readaptação das crianças com o transtorno. “As crianças com TDAH precisam de um grau de rotina em relação a realização de tarefas diárias. Organizar os dias de forma a torná-los mais previsíveis para ‘enxergarem’ continuidade, facilita a organização mental delas. Ir revezando semanas com idas à escola e semanas em casa não favorece a organização da rotina, impondo altas demandas de flexibilidade mental que são fatores que dificultam a atenção, a concentração e funções de memória”, enfatizou o professor. Guilherme ressaltou que, com o retorno das aulas presenciais em sua totalidade, as escolas, os professores e os pais precisam caminhar juntos para minimizar os danos desses meses. Segundo ele, essa cooperação é fundamental.

Por dentro da escola

No que se refere ao papel da escola, a pedagoga e professora Beatriz Claret, que atua no ensino fundamental em uma escola particular em Belo Horizonte,  aponta que as instituições devem buscar resgatar a autonomia que o ambiente escolar proporciona às crianças. Ela explica que o contato frequente com os pais no período de isolamento fez com que muitas crianças perdessem a própria autonomia de pensamento e esperassem por respostas prontas dos pais.

Beatriz relata também que, caso as escolas não tomem as devidas providências e comecem a desenvolver habilidades socioemocionais nos alunos, as crianças poderão sofrer no futuro:

Se a escola não cuidar disso, não tiver uma visão muito cuidadosa, acho que a questão da ansiedade e do pânico vai ficar.

Beatriz Claret, pedagoga

O mesmo aspecto foi destacado pela pedagoga e psicóloga Viviane Serrocha, coordenadora de uma escola particular de Belo Horizonte. Ela relata que, durante o regime remoto, alguns de seus alunos diagnosticados com TDAH chegaram a desenvolver transtorno de ansiedade e depressão, uma vez que não conseguiam manter o ritmo de aprendizado em casa e acabavam por se sentirem inferiorizados. Viviane explica: “eles chegaram a se sentir aquém dos outros, não davam conta de acompanhar, as notas começaram a ficar comprometidas e isso desencadeou outras questões”.

A estudante Brunna Gerken, de 19 anos, relatou ter problemas de concentração no regime remoto. Em entrevista, ela conta os desafios de assistir aulas pelo computador. Diagnosticada com TDAH, a aluna de Publicidade e Propaganda na PUC Minas teve sua primeira experiência EaD no ensino médio. Brunna conta que não conseguia prestar atenção nas aulas, que ficar atenta à tela do computador era um desafio diário.

Após concluir o ensino médio, Brunna prestou o vestibular. Inicialmente, a jovem pensava em cursar Medicina, mas, após ter dúvidas sobre seu futuro, ela optou pelo curso de Publicidade. A graduanda disse ter parado de tomar seu remédio estimulante do sistema nervoso central no início da pandemia e isso afetou seu desempenho drasticamente. Ela relata não ter conseguido prestar atenção nas aulas online e que os encontros presenciais para as aulas práticas do curso de Publicidade e Propaganda foram uma experiência positiva, no qual ela pôde ter um contato maior com seu curso e chegou à conclusão de ter feito a escolha certa.

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A esfera familiar

Ao pensar nas demandas familiares, o período pandêmico exigiu muita paciência para os pais das crianças. Kátia Carla de Souza Dias é professora em Ibirité, região metropolitana de Belo Horizonte, e também é mãe de um menino diagnosticado com TDAH. Convivendo nos dois espaços, casa e escola, ela ressalta os desafios diários como mãe e professora e a necessidade de ser paciente e atenciosa: “Nós, como pais de crianças diagnosticadas com TDAH temos um grande desafio no dia a dia para educar nossos filhos, não é fácil, temos que ter carinho e paciência para auxiliar nossos amigos e professores, que desempenham um papel tão bonito na vida de nossos filhos”.

TDAH em foco

Em 2021 o transtorno de déficit de atenção e hiperatividade esteve em foco na TV aberta brasileira. Em setembro o programa Fantástico, que vai ao ar todos os domingos na Rede Globo, estreou o quadro Tudo ao mesmo tempo, apresentado pelo médico Dráuzio Varella. Na série, o médico entrevista pesquisadores, cientistas e pessoas diagnosticadas com o transtorno, a fim de compreender os desafios da vida de uma pessoa com TDAH e buscando soluções para que eles sejam superados.

O tema também foi abordado no podcast A culpa é do cérebro, apresentado por Andei Mayer, que é professor de neurofisiologia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). No episódio, ele explica que é importante que as pessoas diagnosticadas com o transtorno tenham acompanhamento médico e psicológico, para que existam estratégias – farmacêuticas ou comportamentais – para o paciente lidar com o transtorno. Segundo ele, com apoio profissional e estratégias certas, é possível conviver com o TDAH mantendo a qualidade de vida e desenvolvendo tarefas cotidianas normalmente.

Reportagem e imagens produzidas por Amanda Lopes, Alícia Teodoro, Âmale Barbosa, Danielo Valadares, Eduarda Berigo, Hadassa Victória, Helena Tomaz, Izabelly Rigueira e Leonardo soares em atividade interdisciplinar orientada pelas professoras Adriana Ferreira, Fernanda Sanglard e Verônica Soares da Costa.

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