Veja como os negócios digitais fazem uso de dados online para se beneficiarem, e como é a segurança de dados pessoais no Brasil
Com o sucesso dos negócios digitais, o número de dados vendidos no Brasil e a segurança de dados é colocada em pauta. Mas o que diz a Lei, como, e porque essas informações são compartilhadas? É impossível impedir que isso aconteça? Veja abaixo em nossa reportagem: dados online: a segurança em pauta.
Não há nada que seja mais interessante para o ser humano do que a capacidade de ampliar suas conexões pessoais. Em 1964, o filósofo canadense Marshall McLuhan defendia essa ideia e registrou suas impressões com a criação do conceito de Aldeia Global. Cinquenta e oito anos depois, o preço do compartilhamento de dados parece baixo comparado a todos os benefícios que essa plataforma (ou aldeia global) oferece. Em contrapartida, não mensurar as dimensões disso pode ser angustiante.
Segundo o levantamento do Serasa Experian, em 2020, 30,9% dos brasileiros não se sentem seguros em compartilhar dados pessoais com sites. A mesma pesquisa também apontou que 21,6% só compartilham seus dados em casos de extrema necessidade e 33,4% só fazem isso se o motivo pelo qual o site armazena essas informações estiver claro.
Apenas 13,5% dos usuários afirmaram que se sentem seguros no ambiente digital. Lucas Vieira, 25 anos, faz parte desse grupo. “Acho que a gente que usa internet tem que estar ciente disso. Para mim é uma coisa natural, não vejo esse espanto que algumas pessoas enxergam”, relata o influencer ao falar sobre.
A obtenção de dados é feita, principalmente, por meio das redes sociais e a empresa Meta, através do Facebook, é quem comanda esse grande mercado. Outros sites também armazenam dados, mas nada se compara à complexidade analítica da rede social, que tem uma política de privacidade que soa como “cuidado, não há privacidade!”. Empresas com diferentes segmentos se beneficiam disso, moldando suas estratégias para proporcionar uma maior identificação entre público e seus produtos ou serviços.
Amanda Biegas, Consultora de Soluções Sênior na Talkwalker, empresa norte americana que faz análise de dados para terceiros, contou como é possível obter e repassar essas informações de forma legal.
“A Talkwalker basicamente analisa, através de inteligência artificial, dados online de vários meios, como Twitter, Facebook, Instagram, notícias, fóruns, blogs e vídeos e faz uma análise automática deles […] isso pode ser usado para análise de mercado, de marca ou gestão de crise”, explica.
Ela pontua que todos os dados que a empresa analisa são públicos e que o foco não é trazer algo surpreendente para as marcas, mas otimizar o entendimento do comportamento das pessoas sobre determinado assunto, produto ou serviço. Assim, as empresas podem pular diretamente para a parte estratégica, sem precisar fazer esse trabalho de forma manual. Segundo ela, são considerados dados públicos nas redes sociais, no caso do Instagram e Facebook, apenas aqueles gerados por contas Business. Já no Twitter, se a conta for aberta os dados já podem ser coletados.
A inteligência artificial da empresa Talkwaker é capaz de fazer análise de imagens também, o que permite captar o comportamento sem, necessariamente, precisar de um declaração escrita, só a presença de uma logo já é suficiente para que a ferramenta conclua que aquela pessoa consome determinado produto. Apesar de ter a capacidade, a empresa não fornece análise de rostos, porque isso é ilegal.
Questionada se existe segurança no ambiente digital, ela afirmou que acredita que sim.
“Acredito que estamos seguros porque as empresas não estão compartilhando dados públicos, mas como nos expressamos muito online, elas utilizam disso para entender seus consumidores. Então se você não quer esses dados públicos, eu recomendaria não ter uma conversa na internet, o que é muito difícil hoje em dia”, brinca.
Para os que não se sentem confortáveis em compartilhar seus dados, públicos ou não, o advogado Samuel Victor recomenda ficar atento à política de privacidade. “O que se orienta é o cuidado com o que se assina e aceita, visto que, se você dar a autorização, as empresas podem sim utilizar esses dados.”Os chamados termos de uso são como contratos entre o usuário de uma plataforma digital e a empresa que rege o acesso a ela.
MERCADO ILEGAL DE DADOS
Recentemente uma reportagem do jornal Folha de São Paulo levou a público que criminosos conseguem comercializar dados pessoais de milhões de brasileiros através de logins fornecidos por funcionários públicos. A partir desse acesso, as informações são disponibilizadas em painéis e vendidas por assinatura. Os pacotes têm preços variados e, quanto maior o valor pago, mais complexos são os dados.
Mas nem todos os dados são vazados dessa forma. Existem casos em que o sistema apresenta falhas e deixa os dados vulneráveis, outros em que a senha e controle de acesso do usuário são muito fracas e ainda os mais complexos, como os capazes de manipular as pessoas a clicarem em links que parecem familiares.
Para se prevenir, é preciso manter vigilância sob todas as plataformas utilizadas, além de ficar atento a todas as ferramentas disponíveis que visam garantir maior segurança, como a autenticação em duas etapas, antivírus e senhas complexas.
O advogado Jordan Afonso explicou que, em casos de vazamento de dados, principalmente os que culminam em golpes, o direito recorre às leis que antecedem o ambiente digital para defender a vítima. “Nós temos algumas alterações que foram propostas, como a lei Carolina Dieckmann, algumas circulares e regulamentações previstas pelo Banco Central, mas em síntese, as leis brasileiras continuam aplicando as mesmas normas que eram aplicadas à sociedade de fato, só que agora estendidas ao meio digital. O estelionato via Facebook ou Instagram é o mesmo estelionato, só que aplicado ao meio digital”, exemplifica.
No caso da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), o encargo não é prever a punição para condutas errôneas, mas regulamentar como os dados devem ser tratados pelas empresas que os detém, além de explicitar quais são os direitos do titular.
Clique aqui e se aprofunde no assunto ouvindo o nosso podcast exclusivo sobre o tema.
A BANALIZAÇÃO DOS TERMOS DE USO
Recentemente o empresário americano Elon Musk adquiriu a rede social Twitter pelo equivalente a R$286 bilhões de reais e elevou os níveis de polêmica em torno da plataforma do pássaro azul. Com demissões em massa e sem definição de quem irá administrar a direção da empresa, usuários do Twitter se sentiram instáveis dentro da rede e começaram a buscar alternativas a ele nas lojas de aplicativos de seus smartphones.
Em um boom de tuítes acerca das opções para migração, uma aplicação de origem indiana chamou a atenção: o Koo. Se apoiando nos trocadilhos bem humorados feitos a partir do seu nome e com a premissa de apresentar uma perspectiva de futuro, diferentemente da rede social de Elon, a plataforma ganhou muitos adeptos e, em uma semana, registrou mais de um milhão de novos usuários brasileiros.
A entrada deliberada de tantas pessoas em uma rede social sem o suporte técnico adequado, entretanto, pode não ser o mais indicado quando o assunto é a proteção de dados no meio digital. Logo nas primeiras horas após o elevado número de novos usernames, a rede social indiana apresentou instabilidade e lentidão, além de controvérsias quanto à segurança de dados.
Conteúdo produzido por Isabela Lana, Edson Junio e Milena Amorim, para a disciplina de Laboratório de Narrativas Digitais sob a supervisão da professora e jornalista Maiara Orlandini.
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