Galerias de arte são reconhecidas como lugar onde se vendem obras artísticas, mas seus objetivos vão além disso. Esses espaços também possuem importância na divulgação de artistas, sejam eles já conhecidos ou que estão começando sua jornada profissional. Além disso, galerias também possuem valor educativo, pois em suas exposições são apresentados vários tipos de arte, como experimentações em som e imagem, e instalações, como ocorre no Inhotim – um dos maiores museu a céu aberto do mundo.
De acordo com Froiid, artista multidisciplinar e curador graduado em artes plásticas pela Escola Guignard, as exposições estão se tornando mais acessíveis, como as que acontecem no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB). O artista mineiro enxerga que “as instituições estão se movendo para isso [pessoas terem maior acessibilidade às galerias de arte], em conjunto com o hábito da população ir visitar, sabendo que muitos desses locais são gratuitos”.
Mas galerias ainda estão longe de ser um espaço aberto a todos e para todos. Yan Nicolas São Thiago, artista e bacharel em Artes Visuais pela Universidade de Minas Gerais (UFMG), destaca que, em Belo Horizonte, por exemplo, quando se pensa em galerias, principalmente as privadas, sabe-se que elas estão no centro da cidade ou em bairros de elite. “O acesso para pessoas da favela é dificultado”, reforça ele. Yan pensa que o fato de figuras brancas serem representadas em boa parte das obras e “pessoas negras colocadas no lugar de subalterno, assim como pessoas escravizadas”, acaba por afastar parte do público.
Da curadoria até a exposição
O trabalho em uma galeria pode ser intenso, como conta Bernardo Biagioni, jornalista de formação, mas amante da arte urbana que fundou a galeria quartoamado. Biagioni diz que a parte de pesquisa de artistas e suas obras é grande e demanda bastante tempo. Os funcionários da galeria quartoamado, voltada para a cena belo-horizontina, passam “boa parte do tempo lendo portfólios e pesquisando sobre a cena artística da capital mineira”, conta o curador. Mas a dinâmica pode mudar de acordo com a semana. “Tem dia que a gente está de fato trabalhando na Galeria, no espaço, mas tem outros dias que a gente está mais na rua, pintando em algum lugar, acaba sendo bem fluido”.
Laura Barbi, arquiteta e mestra em design pela University of the Arts em Londres, na Inglaterra, também compartilha do dinamismo do dia a dia de uma galeria. Barbi fundou a galeria de arte, Gal em 2017 e conta que em sua rotina ela alterna “entre funções curatoriais, administrativas, comerciais, acadêmicas, de relacionamento e planejamento”.
Enquanto trabalha para uma exposição, o curador e proprietário de uma galeria cuida de outras pendências. “[Nós da Gal] estamos sempre apresentando uma exposição e executando todas as funções que giram em torno desses eventos, como a divulgação dos artistas envolvidos, ao mesmo tempo em que estamos planejando e produzindo as próximas mostras e pensando em outros projetos de ocupação pela cidade”, comenta Barbi.
Cada exposição terá sua característica única. Froiid conta que algumas obras podem conectar com uma exposição, o resultado final dependerá do objetivo do artista e do curador. Sobre isso, Yan comenta que, “trabalhar com exposição é algo aberto, podendo depender do trabalho individual ou de um projeto feito coletivamente, existe uma conversa ou até mesmo um antagonismo entre trabalhos no mesmo espaço. Então, existe sempre a possibilidade de, durante o processo da coisa, o percurso conter mudanças do que foi planejado e projetado anteriormente”.
Froiid conta detalhes das diferenças na produção das exposições: “Tem exposição que o edital é público, ou seja, está aberto para você enviar a proposta. Existem exposições que eu já planejo fazer, e aí eu faço o projeto para depois enviar [para a galeria]. Às vezes nem passa antes por um curador”. Já Yan nos conta que alguns artistas são representados por galerias e essas fazem os trabalhos com seus profissionais, existindo a opção de também ser convidado por um outro artista para somar em seu projeto.
Cenário de galerias de arte belo-horizontino
Belo Horizonte é uma cidade nova em comparação a São Paulo e Rio de Janeiro, como diz Biagioni, uma cidade em formação, com sua arte local ainda em construção e inquietante – em constante mudança e produzindo coisas novas. O jornalista e curador complementa que “o fato de ser tudo novo aqui acaba trazendo um desafio, mas também a oportunidade de desenhar um cenário [artístico] muito positivo e muito potente”.
Em relação a dificuldades, Laura Barbi fala que enxerga na comercialização das obras o maior problema. Para ela, o consumo cultural e o colecionismo das artes visuais ainda é visto como algo inacessível e extremamente elitizado. “Penso que devemos incentivar o acesso às artes desde a infância, visitar exposições em museus e galerias com nossos filhos; cobrar políticas públicas que incluam não só a educação artística como parte dos currículos do ensino fundamental ao médio, como também que as instituições e galerias promovam atividades educativas voltadas também ao público infanto-juvenil”.
Comercialização das artes
A precária parte financeira de se trabalhar com arte faz com que os artistas acabem buscando outras atividades na área ou no design, que não exposições e comércio de artes, para garantirem sua renda, é o que explica Laura Barbi, proprietária da Gal.
Algumas peças artísticas são disponibilizadas para venda, porém o processo de precificação não parte apenas do artista. Como Froiid explica, colocar preço nas obras virá de pessoas envolvidas com arte, como o marchand – pessoa que negocia as obras -, os galeristas, os curadores e dos espaços que a obra circula, como museus, as próprias galerias e feiras de arte. Outras questões que impactam o preço são como a obra circula nesse circuito de arte e o modo que ela dialoga com temas contemporâneos. Para Yan esse processo de precificação passa também pelo material que dá vida a sua obra, podendo ser o grafite e até carvão.
Tenho desenvolvido [os desenhos] com ele [grafite], por causa disso, [a obra] ganha um preço maior.
Yan Nicolas, artista plástico
Museu ou galeria de arte?
Tanto o museu quanto a galeria comercial fazem parte do Sistema da Artes, que inclui quem realiza exposições, como as instituições (museus e bienais, públicas ou privadas) e as galerias comerciais; mas também artistas historiadores, críticos, editores, curadores, produtores culturais, professores e pesquisadores.
Os museus e galerias são essenciais para a circulação do trabalho artístico e o encontro entre obra e público, bem como para o processo de legitimação da obra e a validação do próprio artista. A diferença é que somente a galeria comercial faz parte do que chamamos de Mercado das Artes, que se refere às pessoas que vendem e compram obras de arte e/ou antiguidades, como galeristas, colecionadores, art advisors, merchands, casas de leilão, feiras de arte e plataformas digitais.