O sol da tarde, quente, caía torto sobre o asfalto irregular enquanto o carro subia devagar a ladeira que desenha a espinha dorsal do bairro. Bastaram alguns metros para que duas paisagens se revelassem, dividindo o mesmo enquadramento: de um lado, o paredão da Serra do Curral; do outro, a comunidade do Taquaril, que cresceu aos seus pés. As duas próximas demais, como se compartilhassem o mesmo fôlego.
À medida que seguimos rua acima, a Serra vai tomando forma, inteira, imensa, quase intimidante. Das encostas às antenas que pontuam o topo, tudo aparece ali, tão à vista, tão perto, que parece ser possível tocar com as pontas dos dedos.
Passamos por escolas, postos de saúde e uma loja de materiais de construção. Logo, as casas começam a surgir, simples, ocupando o espaço com a lógica possível de quem precisou erguer a própria moradia antes mesmo de construir a própria história. A vida segue em ritmo acelerado: pessoas entrando e saindo das mercearias, crianças indo para as escolas com os pais, gente esperando o ônibus, comerciantes trabalhando.
Há pressa, vozes e muito movimento, mas também há algo quase que interiorano. Galinhas, cabras e cavalos circulam pelas ruas como se fizessem parte da paisagem local. Tudo isso quase nos faz esquecer que ainda estamos em Belo Horizonte: mais precisamente, na Regional Leste da capital mineira.
Seríamos recebidas por Nilo Zack, que abriu sua casa para esta reportagem. Ao nos aproximarmos do ponto de encontro, algo chamou nossa atenção: em cada viela estreita, uma fresta se abre para a Serra do Curral, que, majestosa, quase entra pelas janelas das casas.
Logo chegamos ao encontro de Nilo. Ele nos recebeu com um sorriso tranquilo e acolhedor. Nascido e criado no Taquaril, Nilo é um homem de 38 anos, negro, com a barba cheia e o cabelo envolto por duas tranças. Naquele dia, vestia uma camiseta cinza e uma bermuda preta.
Nilo nos guiou até uma sacada de onde pudemos ver a comunidade e a Serra. O clique da câmera se misturou ao barulho de obras, ao som dos carros e ao latido dos cães, e o relato de nosso entrevistado nos transportou para o ano de 2020. Foi em meio à pandemia de Covid-19 que o morador do Taquaril começou a denunciar os impactos da mineração sobre a paisagem e a comunidade local.
Entre latas colecionáveis
Entre os egípcios antigos, o Rio Nilo era considerado uma dádiva, tendo papel fundamental na agricultura, na economia, no transporte e na comunicação daquele povo. O sagrado desse curso d’água estaria diretamente ligado à deusa Ísis, figura central na mitologia egípcia, cujas lágrimas derramadas pela perda de Osíris seriam responsáveis pelas cheias anuais do rio. Nilo representa força e esperança em meio à escassez – e é assim que começa nossa história.
Nilo César é filho do letrista Geraldo e de Natália, uma mulher apaixonada por literatura e artesanato, o que fez com que, desde criança, ele tivesse contato com o mundo das artes. Aos 4 anos, começou a desenhar. Hoje, aos 38, Nilo é formado em Cinema de Animação e Artes Digitais pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e atua como tatuador e grafiteiro, deixando sua arte estampada por onde passa.
Por considerar o grafite pouco acessível, ele resolveu buscar estratégias para aprender mais sobre essa linguagem e extrair algo dessa oportunidade. Em 2005, entrou para o Fica Vivo, programa do Governo que tem como objetivo afastar jovens da criminalidade por meio da promoção de oficinas e atividades de formação. Na turma de Nilo, o professor comprava os materiais e a turma saía para grafitar a cada seis meses.
O desejo de aprender mais sobre arte urbana levou Nilo a se tornar não apenas professor do projeto Fica Vivo, em 2007, mas também colecionador de latas de tinta: ao pintar mercadinhos, ele pedia o dobro da quantidade necessária de tinta spray para seus “clientes”, assim, poderia praticar o grafite.
Arte no Taquaril
Uma das marcas registradas da arte de Nilo Zack é um menino com rosto de palhaço, que estampa inúmeras ruas de Belo Horizonte. O artista contou para o Colab PUC Minas de onde surgiu a inspiração para a imagem:
Mas a atuação de Nilo, no Taquaril, vai muito além de sua proposta artística. Ele está à frente do projeto Taquaril Solidário, criado durante a pandemia de Covid-19 e funciona como uma rede de apoio para a população local. Foi também por conta desse movimento que o artista pode compreender os efeitos da mineração na vida da comunidade, que, por medo, não denunciava. Nilo resolveu, então, tomar as rédeas da situação, passando a buscar apoio de lideranças políticas na Prefeitura de Belo Horizonte e no poder legislativo. Suas queixas, porém, não eram ouvidas, e represálias contra a população se tornaram habituais.
Feridas na Terra
Vinte e dois dias antes de nossa primeira visita ao Taquaril, um acontecimento redefiniu os rumos desta reportagem. Na noite de 21 de outubro de 2025, Ella Halfeld, uma das repórteres responsáveis por esta pauta, foi apresentada ao documentário Feridas na Terra, dirigido por Helena Duarte. A obra inspiraria e orientaria a produção desta reportagem, apresentando-nos os rostos e os caminhos do Taquaril.
Ella Halfeld conta:
“Um amigo meu ia apresentar um curta metragem em animação que ele fez, e eu fui. Fui direto do trabalho e encontrei meu namorado lá. Peguei um uber e cheguei ao Teatro Espanca, um lugar embaixo do viaduto Santa Tereza. O lugar se alimenta das luzes frias dos postes, mas a quantidade de pessoas aquecia o lugar. Várias dessas pessoas estavam em pé (eu era uma delas), outras numa fila para o carrinho do chope e o restante já estava sentado naquelas cadeiras clássicas de plástico. Uma tela branca cobria a entrada do teatro. Mais tarde, seria nessa mesma tela que os curtas passariam. Esperamos começar, conversando com meu amigo, que eu não encontrava há anos. No meio de vários filmes, um deles me chamou muito a atenção: Feridas na Terra. Eu fiquei tão interessada que sentei em uma das primeiras cadeiras e fiquei lá, até o filme acabar. Voltei para casa já pensando em como seria importante nossa reportagem levantar esse tema. E foi assim que nós tivemos nosso primeiro contato com o tema e o documentário”.
Nilo Zack e Edneia Aparecida, entrevistados nesta reportagem, também são fontes do documentário Feridas na Terra. A diretora Helena Duarte, por sua vez, contribuiu para o desenvolvimento desta pauta por meio de insights valiosos não apenas sobre a mineração, mas também sobre a relação entre o Taquaril e a Serra do Curral.
Em entrevista ao Colab PUC Minas, ela falou sobre o documentário:
A terra que chora
Minas Gerais carrega em seu nome o peso histórico do suor, da terra e da devastação ambiental decorrente da corrida por metais preciosos. Essa história remonta ao século XVII, mas seus impactos se tornariam evidentes de fato somente com os desastres de Mariana e Brumadinho , ambos na década de 2010.
Pouco mais de dez anos após o rompimento da barragem do Fundão, em Mariana, um dos principais cartões postais de Belo Horizonte, a Serra do Curral, sofre as consequência da exploração ilegal do minério de ferro.
A Serra do Curral não é um cartão postal só, ela faz parte de um pertencimento da cidade, mas para além disso ela tem múltiplas relações com diferentes povos. Existem diferentes relações. A gente entender que talvez criar um novo imaginário pra cidade de que tipo assim, a Serra não é só meu papel de parede ou meu horizonte, tem muitas outras pessoas que se relacionam com ela de outra forma e a mineração que acontece ali ela não tá só tirando meu cartão postal, ela ta afetando a vida e a saúde de muita gente ali” – Helena Duarte, diretora do documentário Feridas na Terra.
Barragens de mineração são o principal marco na paisagem de um local já revirado pelas grandes corporações minerárias. A Política Nacional de Segurança de Barragens, estabelecida pela Lei 12.334, em 2010 , define as barragens como estruturas projetadas para conter e acumular as substâncias líquidas e/ou de mistura de líquidos e sólidos, derivadas dos processos de extração do minério. Segundo dados da Agência Nacional de Mineração (ANM), cerca de 13 cidades, só na região metropolitana de Belo Horizonte, possuem algum tipo de barragem de mineração, além das outras 46 cidades do estado que também possuem barragens. No total, temos 59 barragens provenientes de uma imensa destruição ambiental.
Em uma de nossas visitas ao Taquaril, presenciamos de perto as marcas deixadas na paisagem pela mineração. Essas feridas estão presentes também em relatos de moradores, como dona Edneia Aparecida, uma mulher negra de cabelos cacheados na altura dos ombros. Ela usa óculos e acolhe diversos animais de estimação em sua casa, localizada em uma das principais ruas do bairro.
Da varanda de dona Edneia, é possível notar um dos pedaços do paredão verde da Serra do Curral já remexido por uma empresa que atuou no local. Ao lado de outros moradores, ela liderou protestos contra a mineração na região, mas conta ter sofrido represálias em decorrência das denúncias. “Se forem me processar, vão me processar pelos motivos certos. Por que enquanto estiverem dando voz, eu denuncio, denuncio, denuncio”, disse.
Edneia também questiona o silêncio dos meios de comunicação sobre a situação vivida no bairro: “Eu não tenho memória nenhuma de nenhum momento em que a mídia tenha dado espaço pra gente denunciar o que acontecia aqui. Não existe. Isso só começou a aparecer com a CPI da Mineração lá na Câmara, e quem falou foi um vereador. A partir da fala dele e lá dentro da Câmara, a gente começou a ser ouvido. Não um morador aqui do Taquaril. Morador aqui do Taquaril não falou. Quem falou foi os moradores daquela área lá, mais nobre”.
Após a entrevista com Edneia, reencontramos Nilo na porta da casa dele. Sempre animado, ele nos levou de carro até um dos pontos mais altos do Taquaril, uma área que está sendo ocupada por algumas famílias. Continuamos o caminho a pé por uma espécie de trilha, guiadas pela fala de Nilo sobre a história daquela ocupação e o fato de ser tão próxima de nosso destino final: a cava da empresa Gute Sicht.
Quando chegamos ao chão vermelho, vimos a terra devastada e repleta de pedregulhos. Depois, avançamos para a parte mais profunda da cava, acessível por um pequeno morro, que nos levou a um gigantesco buraco repleto de degraus. No interior daquela grande fissura na Serra, a terra, antes avermelhada, assume tons de cinza, e uma grande poça de água assinala a parte central e mais profunda da cava.
Segundo Edneia, quando a Gute Sicht minerava na parte mais humilde do bairro, a comunidade sofria com o barulho e explosões de dinamite 24 horas por dia. “A mineração que eles estavam fazendo é literalmente dentro da casa das pessoas e, pra piorar a situação ainda mais, é na parte mais vulnerável, mais pobre, mais necessitada, mais sem infraestrutura do bairro, onde a declividade é pesadíssima, onde os meninos não têm opção de absolutamente nada”, relatou Edneia.
A cava abandonada da empresa Gute Sicht no Taquaril, enorme e assustadora, deixa um questionamento no ar. Onde está a reparação ambiental? Em nossas visitas ao Taquaril, não testemunhamos indícios de ações de reparação em curso. Placas abandonadas em meio aos montes de terra, caçambas destruídas e as trilhas deixadas pela rodagem de caminhões dão a impressão de um longo dia de trabalho que acaba de terminar.
“Eles exploraram, destruíram, desmataram, acabaram com a saúde, que já era precária, de muitas crianças, de muita gente que já tinha condições precárias de vida. Tirou daqui muita gente que voltou pro aluguel pra preservar a vida dos filhos. Então, trouxe um prejuízo enorme pra gente. É incalculável o prejuízo que eles causaram. Não tem nem como falar. Existe reparação pra isso? Não tem como”, questiona Edneia.
Para compreender melhor o que sai da terra e o que fica para as cidades, o mapa a seguir apresenta dados da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM) consolidados pela Agência Nacional de Mineração.
A CFEM corresponde ao montante pago pelas mineradoras às Prefeituras das cidades onde detêm o direito de extrair recursos naturais. Em teoria, é uma forma de devolver parte do valor gerado pela atividade, já que os impactos ambientais e sociais permanecem no território.
Mas o caso da cava de mineração da Gute demonstra os limites desse modelo de compensação financeira, já que a empresa atuava ilegalmente na Serra do Curral, tendo suas atividades suspensas em 2023 por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF).
Veja também:
Pedido de Suspensão de Segurança da Procuradoria-Geral do Município de Belo Horizonte, de 2022
Decisão do Supremo Tribunal Federal que suspendeu as atividades da mineradora Gute Sicht na Serra do Curral, de 2023
Eu fico indignada com essa injustiça que a gente sofreu ao longo desses anos todos. Sabe? É de um cala a boca forçado! E de um prejuízo enorme, e eu não estou falando de dinheiro. Estou falando de vidas perdidas mesmo e que a gente não vai recuperar nunca mais. E eu acho que esse povo deve muito pra gente. Se eles tiverem mais dez vidas eles não conseguem reparar o mal que eles fizeram pra gente” - Edneia Aparecida, moradora do Taquaril.
Uma comunidade devastada
A expansão da mineração na Serra do Curral trouxe consequências para a saúde dos moradores do Taquaril. O pó de minério se espalha facilmente pelo bairro. Ele entra nas casas, recobre móveis e alcança alimentos, roupas e objetos. Além disso, a poeira fina gerada pela atividade minerária acaba entrando nos reservatórios e se misturando à água usada para cozinhar, beber ou tomar banho.
“O chão da casa das pessoas está vermelho. Os móveis estão todos vermelhos. O nariz das crianças escorrendo, o catarro vermelho. Você fica pensando na tragédia na vida da gente que foi causada com uma semana. Com uma semana de mineração, 24 horas sem nenhum descanso para essa comunidade. Não tinha descanso’’, conta Edneia:
A presença da mineração tão próxima às casas afeta o cotidiano das famílias do Taquaril. Os moradores empregam mais tempo em limpeza constante, têm mais gastos com água e medicações e sofrem com o estresse causado pela sensação de risco permanente.
“Quando eu comecei a fazer vídeos aqui pra comunidade pra falar ‘gente, vai no posto de saúde de Novo Horizonte, ou pergunta pra sua vizinha que tem criança quantas vezes essa criança teve bronquite ou doença respiratória nos últimos anos’, a galera falava ‘mas eu achei que era por causa da Covid que sensibilizou meu filho’. Pode ser. Mas a possibilidade de ser por conta da mineração também era muito, muito grande”, conta Nilo.
A relação do Taquaril com a Serra do Curral também mudou com a mineração, já que o bairro perdeu seu principal espaço de convivência. A comunidade, que já enfrenta a falta histórica de parques, praças estruturadas e equipamentos culturais, viu desaparecer o lugar que supria essa ausência. Edneia relembra como era a relação da população com a Serra antes da mineração:
A gente usava toda a extensão da Serra exatamente. Usa para remédio, usa para oração, usa para descanso, usa para lazer da família, usa para passeio, usa para conhecer a natureza, usa para absolutamente tudo. Tudo a gente usava. Ali, inclusive, onde está a Empabra, tem uma lagoa que os meninos eram apaixonados com ela, e uma trilha que eles faziam de bicicleta a pé. Aqui na comunidade, a gente não tem espaços de lazer, de cultura, dessas coisas para a criançada. Então, o que eles faziam? Ficavam para o mato afora, colhendo manga, fruta, remédio. A gente tinha tipo expedição mesmo, sabe? E os meninos chegavam aqui com aquele monte de manga e falavam ‘eu vi uma saracura, eu vi não sei o que lá e tal’, lá do meio do mato. A gente tinha uma ligação muito forte com a serra" — Edneia Aparecida, moradora do Taquaril.
(Foto: Ella Halfeld)
A Serra, que antes fazia parte da vida cotidiana do Taquaril, se tornou um território marcado pela insegurança e pela impossibilidade de acessar espaços historicamente utilizados pela comunidade para lazer e convivência. “É uma das coisas que mais afetou a gente nesse princípio, aquele espaço onde estão as minerações hoje, eram trajetos nossos, nossos, da comunidade’,’ diz Nilo.
Atualmente, moradores do Taquaril preocupam-se que a empresa Taquaril Mineradora S.A (Tamisa) consiga reverter a decisão judicial que suspendeu sua licença para minerar na Serra do Curral. Segundo Edneia, ao mesmo tempo em que a Gute Sicht atuava ilegalmente de um lado da Serra, a Empabra estava paralisada, enquanto a Tamisa estava no meio “discutindo as licenças”. Apesar disso, ela relata que moradores do bairro viam luzes e ouviam dinamites durante a noite na área em que a Tamisa, supostamente, não estava atuando.
“Essa questão da Tamisa é uma questão muito grande que afeta Belo Horizonte de muitas formas. É uma sombra que ronda a comunidade, e acredito que ronda Belo Horizonte”, disse Nilo. Ele cita também divergências entre estudos que teriam apontado o alcance da poeira da mineração na Serra do Curral, que poderia chegar até o Boulevard Shopping ou, segundo ambientalistas, até a Praça Sete, hiper centro da capital:
Se [a poeira da mineração] vai chegar na Praça Sete ou no Boulevard Shopping, para nós, do Taquaril, não faz diferença, porque todas vão matar a gente primeiro. Ela vai chegar aqui, com toda certeza” - Nilo Zack, morador do Taquaril.
História do Taquaril
Localizado na Regional Leste de Belo Horizonte, o Taquaril se estende entre o Alto Vera Cruz, Granja de Freitas e Castanheiras, este último já na divisa com Sabará. Sua história oficial tem início em 1981, quando o Conjunto Taquaril foi construído sobre terras da Companhia de Desenvolvimento Urbano do Estado, a Codeurb. Mas o mapa real do bairro só ganharia forma alguns anos depois, marcado por luta e mobilização.
A ocupação do território nasce da urgência e da força coletiva. Em meados dos anos 1980, o Centro de Ação Comunitária Alto Vera Cruz (CAC-AVC) organizou um movimento massivo por moradia. Cerca de 8 mil famílias marcharam a pé do Alto Vera Cruz até a Prefeitura de Belo Horizonte e o Palácio da Liberdade. Era um caminho longo, repetido por meses, todos os dias, em busca do mínimo: um lugar digno para viver.
Em 1987, a pressão se transformou em conquista. Os antigos sítios da Codeurb foram parcelados em lotes de 150 metros quadrados e destinados a aproximadamente duas mil famílias. Edneia participou ativamente desse movimento e conta que, mesmo com a concessão do terreno, a construção do Taquaril só foi possível com muito suor:
Entregou pra gente esse terreno. Que estava abandonado, porque era impróprio para moradia. Entregou pra gente como desafio mesmo. Duvido que esse povo vai ficar lá. Toma aqui pra vocês. E aí, junto com isso, a gente recebeu algumas outras punições também. Por exemplo, o programa garantia a infraestrutura, o material de construção, o acompanhamento técnico, mas a gente não recebeu quase absolutamente nada disso. O material de construção chegou aqui pra meia dúzia de morador. A gente disputava quase tudo no tapa. Tinha que dormir na fila, lá no terreno, sem absolutamente nada pra você conseguir pegar” - Edneia Aparecida, moradora do Taquaril.
Pouco a pouco, o bairro tomou forma, e o Taquaril não parou de se expandir. Décadas depois, novas ocupações foram se costurando ao território. Nilo explica que a Ocupação Terra Nossa, formada entre 2012 e 2014, é a parte mais jovem do bairro. “É lá onde estão alguns dos maiores problemas”, diz. “Terra Nossa, a região que a gente também chama de Castanheiras, que é onde o córrego divide o Taquaril da parte de Sabará, não tem saneamento básico, não tem calçamento nas ruas, não tem água nem luz oficial da Copasa”, disse Nilo.
Hoje, cerca de 36 mil pessoas chamam o Taquaril de casa – e todas elas têm suas vidas ameaçadas pelo avanço da mineração sobre a Serra do Curral. A montanha que um dia foi moldura, lazer e acolhimento agora interfere no ar, água e no cotidiano.
Reportagem produzida por Ana Julia Bolognani, Beatriz Rodrigues, Julia Nicolau e Ella Halfeld para a disciplina Laboratório de Jornalismo Digital (campus Lourdes), no 2º semestre de 2025, sob supervisão da professora Nara Lya Cabral Scabin.
