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A imagem mostra o horizonte de prédios em Belo Horizonte. Ao fundo, o sol está se pondo. Galhos de árvores ocupam as laterais da imagem.
Meta do programa Belo Horizonte Cidade Inteligente é tornar o município a terceira cidade mais inteligente do país. Foto: Danielly Camargos

Belo Horizonte como Cidade Inteligente: para quem?

Investimento em tecnologia na capital mineira acende alerta sobre o uso de inteligência artificial e o acesso da população aos projetos do programa de Smart City

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Em 2012, uma forte teoria sobre o fim do mundo dominou a mente da população. Na virada do dia 21 de dezembro daquele ano, a expectativa – ou apreensão – de muitos era para descobrir se o mundo iria se transformar em pó, ser assolado por água, tal qual o dilúvio bíblico, ou, simplesmente, virar um breu. O relógio virou e nada aconteceu. Tendo o mundo sobrevivido ao seu fim, passou-se então a pensar no futuro e a sonhar com um universo totalmente tecnológico. Mais de uma década depois, esse imaginário ainda persiste, mas, finalmente, ganhou um nome: smart city. No entanto, o conceito, traduzido como cidades inteligentes, pode ser tão utópico quanto o fim do mundo.

Isso porque teóricos e pesquisadores discordam sobre o que seria uma smart city. Em tese, uma cidade inteligente é um ambiente que, por meio da tecnologia da informação e da comunicação, é capaz de criar soluções tecnológicas inovadoras que contribuam para o desenvolvimento da cidade e da população. Mas o conceito de Smart Cities busca ser tanta coisa que acaba não sendo nada. É o que defende Luana Bulcão, doutora em Comunicação e Cultura da Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (ECO-UFRJ): “A palavra Smart City tem um significante vazio por si e o universo de palavras que compõe ela também é composto de diversos significantes vazios”.

Para definir uma cidade inteligente, o Connected Smart Cities, uma plataforma com o propósito de criar espaços para integração e inovação, realiza, desde 2015, um ranking para premiar as cidades que mais se destacam.

A lista é desenvolvida com base em uma Rede de Soluções para o Desenvolvimento Sustentável (SDSN, sigla em inglês para Sustainable Development Solutions Network) que integra indicadores desenvolvidos pela ABNT Certificadora, além dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e indicadores de estudos diversos, os ODS.

Veja a série de normas utilizadas e o que cada uma mede
  • ABNT NBR ISO 37120: serviços urbanos e qualidade de vida;
  • ABNT NBR ISO 37122: desempenho das cidades inteligentes
  • ABNT NBR ISO 37123: desempenhos das cidades resilientes;
  • ISO 37125: desempenho das cidades e comunidades sustentáveis.

Em 2025, o ranking ganhou uma nova versão, elaborada com base em 13 eixos:

Economia e Finanças; Governança; Meio Ambiente e Mudanças Climáticas; Resíduos Sólidos, Esgotos e Água; Educação; Habitação e Planejamento Urbano; Mobilidade Urbana; Saúde, Agricultura Local/Urbana e Segurança Alimentar; Telecomunicações; Energia; Inovação e Empreendedorismo; População, Condições Sociais e Segurança.

No Brasil, 17 capitais desenvolvem ações consideradas inteligentes e estão no Connected Smart Cities. Descubra quais são:

Belo Horizonte participa desde a primeira edição do ranking, em 2015, e se destaca ano após ano. O melhor resultado da capital mineira foi logo no primeiro ano em que participou, ficando em 3º lugar no Ranking Geral. Dentre os eixos abordados pela premiação, Belo Horizonte se sobressai no de Meio Ambiente, conquistando o primeiro lugar em três edições consecutivas, no de Saúde, como o mais constante nas cinco primeiras colocações, e no de Tecnologia e Inovação, ficando entre os 10 primeiros colocados durante oito anos da última década.

Confira as posições já alcançadas por Belo Horizonte:

Criado com o Padlet

BH menos inteligente

Belo Horizonte decaiu expressivamente nas posições do Ranking em apenas um ano. Na categoria geral, saiu da 8º posição, em 2024, para a 34º. Fernando Lopes, presidente da Prodabel, empresa de informática e informação, responsável pelo Programa Belo Horizonte Cidade Inteligente (BHCI), classifica como um resultado natural diante das mudanças no governo municipal. O CODESE-BH, Conselho de Desenvolvimento Econômico e Sustentável do município, foi desenvolvido para garantir a execução do planejamento independente de quem vier a ocupar os postos. Ele é integrado por mais de 80 entidades da sociedade que discutem o futuro da cidade.

Na administração do prefeito Álvaro Damião (União Brasil), que assumiu o cargo em abril de 2025, após o falecimento do candidato reeleito Fuad Noman (PSD), a prefeitura reestruturou o BHCI com o intuito de colocar a capital mineira entre as três principais cidades do Brasil, explica Lopes. Ele concorda que a conceituação de smart city é complicada pela amplitude que o termo possui. A Prodabel utiliza uma definição baseada na escola francesa que busca “promover conectividade, principalmente por meios mobiles e por aplicações que podem ser acessadas via web, os principais serviços do município para o cidadão”.

Desenhos que simbolizam o Projeto de Belo Horizonte como Cidade Inteligente.
PBH

Wi-Fi gratuito

O acesso ao Wi-Fi público de forma gratuita também é uma das metas da Prodabel, de acordo com Fernando Lopes, principalmente nas regiões mais carentes. Em 2023, o projeto de internet gratuita em vilas e favelas foi premiada no prêmio Cidades do Futuro, na categoria Conectividade, em evento da Associação Nacional das Cidades Inteligentes, Tecnológicas e Inovadoras (ANCITI). O reconhecimento se deu devido ao número de beneficiários do programa, que já ultrapassa 4,9 milhões de usuários.

Para Fernando Lopes, administrador da Empresa de Informática e Informação de BH, A inclusão digital é uma premissa básica do projeto de cidade inteligente: “um trabalho exclusivo de inclusão digital para que a gente possa ampliar o acesso à informática e ao Wi-Fi público e gratuito, principalmente nas regiões em que a cidade mais precisa”. A meta, segundo a PBH, é instalar nas vilas e favelas da cidade pontos de internet gratuita, que chegarão aos moradores das vilas e favelas por meio de fibra óptica e aparelhos que funcionam como roteadores para transmitir o sinal de Wi-Fi até casas, celulares e tablets. 

Pontos de Wi-Fi gratuitos também estão espalhados pelo município, incluindo espaços e equipamentos públicos como escolas, praças e em todas as estações do Move, totalizando 5.200 equipamentos.

Renata Baracho, professora da UFMG e doutora em Ciência da Informação, entende a cobertura completa de Wi-Fi como um meio de integrar todas as classes sociais. No entanto, ela alerta para que não seja algo elitizado, sendo necessário que a população tenha acesso.

O avanço das cifras no setor tecnológico

Assim como o restante do globo, o Brasil vem investindo em tecnologia. Dados da Associação Brasileira das Empresas de Software (ABES) sobre o  mercado de software revelam que o país gastou mais de R$320 bilhões em 2024, representando uma alta de 13,9% em em comparação ao ano anterior. 

O mesmo documento revela que tal investimento por região pode ser equiparado ao nível de pobreza medido na área. Os dados são discrepantes. Enquanto no Sudeste o mercado brasileiro de TI, composto por Software, Serviços e Hardware, representa 60,84%, o Norte do país é ocupado por apenas 3,98%, uma diferença de mais de 56% de investimento. Logo em seguida, vem o Nordeste com 9,46%. O Centro-Oeste e o Sul ocupam o meio da tabela, com 11,83% e 13,89%, respectivamente.

Em 2024, Fuad Noman, prefeito da época, autorizou, por meio da Lei 11.778, o empréstimo de R$110 milhões com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para serem aplicados no Programa Belo Horizonte Cidade Inteligente (BHCI). A área de aplicação de tais investimentos, tanto nacional como municipal, deve ser motivo de atenção.

Passagem cara, evolução paralisada

O transporte público na capital foi amplamente debatido em 2025. Isso porque logo no início do ano, as tarifas de ônibus pagas pelo usuário aumentaram de R$5,00 para R$5,75. A medida está prevista no atual contrato de concessão do serviço de transporte coletivo por ônibus, que prevê anualmente o aumento da tarifa ao fim do ano. Para que o custo para o passageiro não aumente exorbitantemente, a Prefeitura de Belo Horizonte paga subsídio às empresas que fornecem o serviço de transporte coletivo, com base na Lei n°11.367/2022. 

O custo da tarifa levou à protocolização de um projeto na Câmara Municipal de Belo Horizonte que buscava realizar o caminho inverso. O Projeto de Lei (PL) 60/2025, encabeçado pela vereadora Iza Lourença (Psol), previa a implementação da Tarifa Zero na capital mineira. O economista André Veloso, um dos responsáveis pelos estudos da viabilidade do projeto e integrante do movimento Tarifa Zero BH, explica que a ideia era  substituir o vale-transporte por uma taxa de disponibilidade do transporte público. De acordo com ele, o projeto propunha trocar essa lógica por uma taxa fixa por número de empregados. “A proposta descontava até nove taxas por estabelecimento. Se você tem nove empregados, não paga nada; se tem dez, paga uma taxa; se tem onze, paga duas; e assim por diante”.

A iniciativa foi a votação em 1º turno no dia 3 de outubro. Dos 41 vereadores presentes, 30 votaram contra o projeto. Os outros dez votaram a favor. O presidente da Casa, Juliano Lopes (Pode), não vota. Protocolado em fevereiro, a proposta sofreu embates com a gestão municipal desde o início. Em entrevistas públicas, o prefeito Álvaro Damião criticou o projeto de lei, questionando quem iria arcar com os custos do transporte e chamando-o de uma “utopia”. 

Grupo de manifestantes jovens seguram cartazes vermelhos e uma faixa com o desenho de um ônibus e o número “0800” (que significa, gratuidade), em protesto à favor do transporte gratuito e pela participação popular nas decisões públicas.
83ª Reunião – Ordinária
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Em entrevista ao Colab, a vereadora Iza Lourença, que apresentou a proposta, caracterizou a postura do prefeito como uma covardia em não querer mudanças no transporte. Ela ainda afirmou que os votos contrários a Tarifa Zero foram motivados pela prefeitura: “Todos eles [vereadores] me falaram que foi por pressão da prefeitura de Belo Horizonte”. Um dia após a votação, a edição do Diário Oficial anunciou a exoneração de nomes ligados aos vereadores que votaram a favor do projeto, como Helton Júnior (PSD), desligado do cargo de vice-líder de governo na CMBH, Edmar Branco (PCdoB), Wagner Ferreira (PV) e à bancada do PT.

Iza Lourença destaca que o preço da passagem eleva a desigualdade. Atualmente, a capital mineira tem a terceira passagem mais cara do Brasil:

O transporte público é um direito que permite você acessar os direitos ou ele te impede de acessar os direitos, no caso, de uma tarifa tão alta como é a de Belo Horizonte, hoje é o impeditivo para as pessoas acessarem direitos. – Iza Lourença, vereadora de BH

O membro do Movimento Tarifa Zero BH, André Veloso, acrescenta que existe um problema de fundo ideológico. Para ele, a população mais pobre não ter acesso à cidade é uma forma de os manter enclausurados em seus bairros, sem incomodar a elite: “o fim da catraca também representa o fim do controle sobre os corpos e sobre quem pode circular pela cidade”. A tarifa zero seria o fim do afastamento social, de acordo com Veloso. 

Tarifa Zero rejeitada: e agora?

Dois meses após a rejeição do projeto, o prefeito Álvaro Damião divulgou em suas redes sociais que Belo Horizonte terá passagem gratuita aos domingos e feriados, a partir do dia 14 de dezembro de 2025. Ele justificou dizendo que a medida foi pensada em quem não podia aproveitar as opções de lazer da cidade por não conseguir arcar com o custo da passagem.

Iza Lourença celebrou o anúncio, declarando que a vitória foi fruto de um ano de muita luta. A vereadora ainda afirmou que a mobilização vai continuar na busca por mais direitos. Ela credita que a gratuidade total do transporte público pode vir a nível nacional.

Na COP30, Conferência das Partes, a passagem gratuita foi tema de debate na Zona Verde, também chamada de Green Zone, área pública que reúne a sociedade civil, instituições públicas e privadas, e demais atores não-governamentais em torno de projetos de tecnologia e inovação em soluções para a crise climática. 

Uma resolução também foi aprovada na Cúpula dos Povos, evento que ocorre de forma simultânea a COP, realizado por movimentos populares. A Carta Final entregue ao presidente da COP30, André Corrêa do Lago, propõe a construção de cidades justas e periferias vivas através da implementação de políticas e soluções ambientais, entre elas as tarifas zero no transporte público.

Além disso, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) solicitou ao Ministro da Fazenda Fernando Haddad um estudo sobre os custos de implantar a gratuidade do transporte público urbano em todo o país e, ao que tudo indica, essa deve ser a aposta do presidente em sua campanha de reeleição para 2026.

No Senado, já existem propostas que avançam essa discussão. O projeto de lei do senador Rogério Carvalho (PT-SE), Programa Tarifa Zero, de número 2.121/2024, está em análise na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) e prevê, sem limitação de viagens, dias e horários, uma credencial para trabalhadores dos municípios que aderirem à medida.

Uma faixa escrito "Tarifa Zero já" ocupa o centro da imagem. Duas pessoas seguram a faixa no meio da rua do viaduto Santa Tereza, em Belo Horizonte
Desde 2013, passagem gratuita no transporte público é tema de debate político. Foto: Tarifa Zero BH

Outra proposta que está sendo discutida sobre a passagem gratuita é a alternativa da Deputada Estadual de Minas Gerais Bella Gonçalves (Psol), com a criação do Programa Metropolitano de Incentivo ao Uso do Transporte Público Coletivo, que busca a implantação da passagem gratuita no transporte intermunicipal da Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH). De acordo com a deputada, a ideia se diverge da apresentada na CMBH porque oito municípios da região metropolitana já têm Tarifa Zero: “O transporte metropolitano é consideravelmente pior do que o municipal e acho que essa pauta teria mais apelo”. 

O economista André Veloso concorda. Para ele, em relação aos estudos para avaliar a viabilidade do projeto a nível estadual, a dificuldade aumenta. Ele explica que o acesso à informação dos dados referentes ao transporte metropolitano é dez vezes pior que no municipal, mas que pretendem realizar os estudos conforme o projeto avançar na Assembleia. 

O PL 4.538/25 prevê o financiamento a partir do fim da isenção do Imposto sobre Propriedades de Veículos Automotores (IPVA) para jatinhos e iates. Além disso, busca a equiparação do imposto cobrado das locadoras de veículos ao valor pago por pessoas físicas. A deputada Bella Gonçalves defende a necessidade de persistir no debate na luta sobre Tarifa Zero: “É um tema que não vai retroceder no Brasil, muito pelo contrário, vai avançar. Esse é um debate muito importante”.

O problema do transporte público em BH

O contrato da Prefeitura de Belo Horizonte com as empresas de ônibus, assinado em 2008, se encerra em 2028. No entanto, a CMBH já debate alternativas para melhorar o serviço. O presidente da Comissão de Mobilidade e Transporte, vereador Bráulio Lara, reconhece as falhas no modelo atual e declara que a Câmara está mobilizada nessa discussão: “A gente não quer que aconteça um control C, control V na licitação anterior e a gente viva um ciclo longo de 20 anos ainda agonizando dos mesmos problemas”. 

Ônibus municipais entregues pelo prefeito da época Alexandre Kalil. Foto: Rodrigo Clemente/PBH

Ele defende a integração entre as linhas de ônibus e o Metrô. Bráulio Lara explica que, com a previsão de entrega da linha 2 do Metrô BH para o mesmo ano em que um novo contrato de ônibus será assinado, é preciso se preocupar com que a licitação de ônibus esteja em consonância com a nova plataforma, para que ambos não sigam a mesma rota.

Acidente ou sinistro de trânsito?

Para a vereadora Iza Lourença, o maior problema na mobilidade urbana é a ineficiência do transporte público, fazendo com que a população opte por carros e motos ao invés do transporte de massa. Essa escolha, além de impactar o trânsito, também reflete em outras áreas da cidade, a exemplo da saúde. 

De acordo com dados da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (Fhemig), responsável pelo Hospital João XXIII, referência nacional em traumas, o número de acidentes envolvendo motos em Belo Horizonte é alarmante. Das 10.590 admissões por acidentes de trânsito em 2024, mais de 7 mil delas foram com ocupantes de motocicleta. Em 2025, não está sendo diferente. Até novembro, mês em que os dados foram obtidos, cerca de 6 mil acidentes com motos no trânsito foram registrados. As outras 2.870 entradas no hospital se referem a acidentes com ciclistas, automóveis, caminhões e ônibus.

Ao todo, Belo Horizonte já tem mais de 65 mil acidentes de trânsito registrados em 2025, de acordo com dados do Observatório de Segurança Pública de Minas Gerais, acessados em novembro. Entre os anos registrados, BH apresenta até o momento uma queda no número. A alta vinha desde o ano de 2021, com mais de 61 mil acidentes, e teve pico em 2024, com quase 85 mil ocorrências.

Iza Lourença explica que passou a se referir a esses casos como sinistros de trânsito: “Acidente é algo que você não espera que vai acontecer, né? E a quantidade de pessoas que estão caindo das motos e se machucando é algo que a gente sabe que vai acontecer e a gente continua alimentando essa política”. 

Transporte aéreo por cabos: é possível?

Como presidente da Comissão de Mobilidade Urbana, Indústria, Comércio e Serviços da CMBH, Bráulio Lara destaca que é preciso pensar em novas alternativas para a mobilidade na cidade. A utilização de teleféricos já foi tema de estudos na comissão, proposta pelo próprio vereador. Ele explica que pelo nível de altitude de Belo Horizonte, caracterizada pela presença de morros e montanhas, o teleférico conseguiria fazer uma ligação entre os pontos da cidade:

Nós temos como pegar áreas muito adensadas, como por exemplo a região da Serra ou todo aquele vetor leste, e conectar por meio de teleférico diretamente nas estações de metrô, fazendo justamente essa perspectiva de tronco alimentador” – Bráulio Lara.

Esse tipo de transporte de massa já foi implementado em cidades mundo afora. Chamado de Metrocable, a cidade montanhosa de Medellín, na Colômbia, foi a primeira a ter transporte aéreo por cabos da América do Sul. Desde 2004, o teleférico, que é integrado ao metrô de Medellín, tem como objetivo ampliar a equalização do acesso à cidade, beneficiando áreas periféricas de baixa renda. 

Segundo estudos realizados pelo Observatório de Inovação para Cidades Sustentáveis (OICS), executado pelo Governo Federal com apoio da Organização das Nações Unidas (ONU), com o Metrocable o tempo médio de deslocamento reduziu de 120 para 65 minutos entre o Centro e a periferia de Medellín, melhorando a qualidade de vida da população. Entretanto, o documento ainda expõe que o meio de locomoção não é usado pela maioria dos habitantes da região e que a concentração dos benefícios para a economia local, valorização do uso do solo e dos imóveis se limitou ao entorno das estações. 

Em Belo Horizonte, a proposta não foi para a frente. Apesar de ter sido pautada em audiência pública, as negociações com a Prefeitura não avançaram.

Inteligência Artificial no trânsito?

Para destravar o trânsito, pesquisadores apostam na tecnologia. O termo transporte inteligente se baseia na comunicação entre infraestrutura, veículos e pessoas. Porém, assim como smart city, transportes inteligentes também beiram ao imaginário, pelo menos no Brasil.

Na imagem, um semáforo vermelho. Ao fundo, um céu azul.
Semáforo inteligente promete destravar o trânsito nas grandes cidades. Foto: Reprodução

O professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), doutor Marcelo Porto, da Escola de Engenharia, explica que no país não há uma presença significativa de transportes que possam ser considerados inteligentes, mas que cidades como Niterói, no Rio de Janeiro estão avançando. O município instalou, em 2016, semáforos inteligentes, um sistema integrado a câmeras capazes de analisar a movimentação de veículos e, a partir dos dados, tomar automaticamente decisões para melhorar o fluxo na via mais carregada.

Mais de 160 acidentes foram registrados no município em 2016, ano da instalação dos semáforos, de acordo com os Dados Abertos da Polícia Rodoviária Federal. Já em 2017, os dados apresentaram uma redução de mais de 20%. Os números revelam a contribuição dos semáforos inteligentes implantados na BR-101 para a segurança no trânsito da cidade.

Belo Horizonte está atrás de Niterói nesse contexto. Bráulio Lara entende que a cidade está defasada com a semaforização. Com o sistema da década de 1990, o Centro Integrado de Operações (CCO), parte essencial para o controle do tráfego, ainda não pode ser considerado inteligente. Marcelo Porto explica que o CCO ainda é monitorado por pessoas e não de forma automática. Fernando Lopes, presidente da Prodabel, empresa de informática e informação do município de Belo Horizonte, responsável pelo projeto de cidade inteligente, esclarece que existe um planejamento envolvendo inteligência artificial para que esse cenário mude.

A ideia é que 99% das ações passem a ser realizadas com Inteligência Artificial. O trabalho será desenvolvido em três eixos: O primeiro deles é a atuação dos sinais sob demanda. Os semáforos inteligentes, case de sucesso no Rio de Janeiro e em cidades do mundo todo, serão implantados em BH. De acordo com Fernando Lopes, o projeto já tem um financiamento aprovado e está em fase de construção.

Para Marcelo Porto, o tempo perdido no trânsito impacta a qualidade de vida da população: “Você ficar 20 minutos a mais no engarrafamento, é 20 minutos que você não vive, você não tem o conforto da família, não tem o descanso, não tem o tempo para estudar, ou fazer qualquer atividade que você queira fazer, que você perdeu por causa de um trânsito mal planejado”. Ele defende que, por se tratar de uma tecnologia antiga, que é utilizada em outros lugares, ela já deveria ter sido implantada em Belo Horizonte:

Nós estamos muito atrasados, né? Então, por mais pareça que a nossa cidade tá sendo a criança inovadora e tudo, nós somos realmente atrasados – destaca Marcelo Porto, pesquisador de transportes inteligentes

Lopes entende que é impossível eliminar o fator humano nesses projetos, mas que a intervenção humana só será necessária quando a inteligência artificial não conseguir resolver o problema. “Você tem um evento na cidade, um jogo de futebol que é necessário inverter o fluxo da via expressa. Aí, nesses casos que são muito específicos e pontuais, a inteligência artificial vai sugerir ao agente que a alteração do fluxo ocorra naquele horário, que os sinais operem nesse formato. O operador não vai intervir, ele vai só aprovar e dizer se o que a inteligência artificial está propondo é suficiente ou não”, explica.

Pensando nos ônibus, o Corredor Verde prevê a conexão do transporte com o semáforo, por meio de um dispositivo que indicará a localização e deixará o sinal aberto para a passagem do ônibus.

Por fim, busca-se resolver um dos grandes gargalos no trânsito da cidade. a Avenida Amazonas, um dos principais corredores de BH, concentra cerca de 100 linhas municipais e metropolitanas que realizam mais de 12 mil viagens diárias, de acordo com a Secretaria Nacional de Trânsito (Senatran). Para aliviar a demanda, os eixos de BRT da avenida serão ampliados, fazendo com que o Move BH Amazonas atenda ao Vetor Oeste e Região Metropolitana, interligados com o município de Contagem por meio da Avenida Cardeal Eugênio Pacelli. A previsão é que passe a operar em 2030.

Ainda a nível metropolitano, o projeto Green Light busca a redução na emissão de CO2. Em parceria com o Google, que irá avaliar a qualidade do ar, o plano busca integrar a inteligência artificial para diminuir a emissão de carbono na cidade. Para além dos emitidos em Belo Horizonte, os gases das cidades da Região Metropolitana também afetam a qualidade do ar. A ideia é criar um programa, em parceria com as prefeituras das cidades vizinhas, para melhorar a questão climática. O projeto ainda não foi assinado entre as partes, mas Fernando Lopes, explica que sem a cooperação entre as cidades da RMBH não é possível pensar em redução de CO2: “Não existe um projeto de redução de carbono, de redução da temperatura e de observância climática para ser tratado na nossa região que não passe por um projeto metropolitano”. 

Os semáforos inteligentes ainda são tema de debate no poder legislativo. A nível estadual, a Deputada Amanda Teixeira Dias (PL) é autora do Projeto de Lei (PL) 2984/2024 que busca instalar sistemas de semáforos inteligentes em municípios do Estado com população superior a 150 mil habitantes. A proposta foi aprovada na Comissão de Assuntos Municipais e Regionalização no início de novembro de 2025 e aguarda a discussão em plenário.

Para representantes do poder público, como Bráulio Lara e Fernando Lopes, os projetos envolvendo inteligência artificial não buscam reinventar a roda, pois já é um meio utilizado em grandes centros: “É fundamental a gente pensar na perspectiva do futuro as cidades inteligentes, não só fazendo as coisas de altíssima tecnologia, mas fazendo o Para a Casa, fazendo o feijão com arroz também funcionar para que a gente colha resultados”, defende Bráulio Lara.

Muralha BH: mais câmeras trazem mais segurança?

Em sua quarta viagem internacional no ano de 2025, o prefeito Álvaro Damião foi à China, tendo como foco da visita a avaliação de tecnologias e sistemas asiáticos que poderiam ser implementados em Belo Horizonte para transformar a cidade em um lugar mais moderno, seguro e eficiente, de acordo com o prefeito.

O Muralha BH, um projeto que prevê o monitoramento inteligente da cidade, foi o grande projeto desenvolvido em 2025 no âmbito de cidade inteligente, na avaliação de Fernando Lopes, presidente da Prodabel, órgão responsável pelo desenvolvimento do projeto juntamente com a Secretaria Municipal de Segurança e Prevenção.

O sistema irá contar com mais de 12 mil câmeras distribuídas pela cidade até o fim de 2026, em parques, praças, centros de saúde, escolas, vias e o Anel Rodoviário para inibir a ação criminosa e promover a sensação de segurança e, consequentemente, melhorar a qualidade de vida do cidadão. Dentre o número de câmeras, 8 mil são de segurança, mais de 2 mil próprias para a leitura de placas veiculares e 1,5 mil com tecnologia de reconhecimento facial. De acordo com o presidente da Prodabel, até novembro, mais de 3.400 câmeras já foram instaladas.

Startups como solução

Para desenvolver a inteligência artificial nos processos de videomonitoramento, a Prodabel pretende contratar startups. Fernando Lopes acredita que essa abertura digital no município será capaz de atrair empreendimentos.

Hoje, a Prodabel é acionista do BHTEC, o maior o maior polo de incubação de empresas de startups do Brasil, em conjunto com a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e o Governo do Estado. Fernando Lopes destaca que a capacidade operacional do BHTEC será ampliada, com o objetivo de criar um ambiente de inovação que forneça mão de obra qualificada, espaço físico e laboratórios para fomentar as pequenas empresas: “Nosso projeto não é um projeto pronto, a gente não quer contratar a solução pronta do mercado. A nossa proposta é justamente construir startups para que se fomente a construção do projeto em Belo Horizonte”.

O Marco das Startups veio para facilitar esse processo. Aprovado em 2024, o Projeto de Lei (PL) 1012/ 2024, assinado pela vereadora Marcela Trópia (Novo) e outros 21 vereadores, tinha a intenção de aumentar a produtividade e a competitividade e promover a modernidade tecnológica, econômica e social de Belo Horizonte. Para Marcela Trópia, isso faz com que a cidade se torne mais aberta a parcerias com capacidade de encontrar com mais rapidez e menos custo soluções para os problemas que afetam a população: “Startups têm agilidade para desenvolver soluções de baixo custo e alto impacto para desafios, como coleta inteligente de lixo, drenagem e segurança… Conseguimos atacar problemas crônicos de forma mais moderna e eficiente”, destaca a vereadora.

Com a desburocratização do fomento às startups, Belo Horizonte já tem um processo aberto para qualquer startup do Brasil que queira resolver um problema da administração pública na capital mineira.

O interesse das empresas

Marcelo Porto destaca que quando se fala em ações concretas do governo nas três esferas existe uma lentidão, resultado da falta de recursos para o uso efetivo da tecnologia. Na visão do professor, isso poderia ser resolvido com uma Parceria Público-Privada (PPP), em que a iniciativa privada, que está mais avançada em estudos na área, contribuiria para a consolidação dos projetos.

Mais de 40 mil empresas atuaram no setor de tecnologia em 2024, de acordo com o estudo da Associação Brasileira das Empresas de Software (ABES). Luana Bulcão, doutora em Comunicação e Cultura da ECO-UFRJ, alerta para o controle da tecnologia que as empresas possuem. Para ela, isso pode representar uma smart neoliberal, voltada para o lucro, em que a economia é controlada por empresas, com intervenção mínima do Estado. “Essas corporações não têm nenhum tipo de comprometimento com a melhoria de fato da cidade. Elas estão interessadas em vender a tecnologia delas”, explica Luana Bulcão.

Ela ainda salienta que não é contra o investimento em tecnologia, mas que deve haver um equilíbrio na destinação do dinheiro público comparado a outros setores essenciais.

Iluminação pública de BH: case de sucesso?

O programa de cidades inteligentes de Belo Horizonte já faz uso de PPP desde 2017, quando o na época prefeito Alexandre Kalil firmou o contrato para que BH se tornasse a primeira capital parceira de uma empresa privada na área de iluminação pública. O acordo com a BH Iluminação Pública S.A previa a substituição de 182 mil luminárias de vapor de sódio por luminárias de LED que, alinhado com o conceito de Smart Cities, 20% delas adotariam o sistema de telegestão, que permite o monitoramento pelo Centro de Controle e, ainda, a incorporação de outras tecnologias, como internet wi-fi e câmeras.

Fernando Lopes, presidente da Prodabel, destaca que os resultados foram positivos. Com 100% da iluminação pública de LED, a cidade passou a consumir, aproximadamente, 38% a menos de energia nos horários de pico, reduzindo em mais de 50% o rendimento anual. Para ele, sem o modelo PPP, Belo Horizonte demoraria mais a atingir esses números: “A partir do momento que se assina um protocolo de PPP e a parceria com o privado esteja ativa, a execução do serviço se dá de forma mais ágil. Eu acho que é é indiscutível que foi mais eficiente”, detalha Lopes.

Luminárias da Praça da Liberdade foram substituídas por LED
Praça da Liberdade com luminárias de LED. Foto: Bruno Lavorato/BHIP

Ele ainda salienta que o modelo permitiu que as demandas da população fossem atendidas com mais velocidade. O aplicativo BHIP, da concessionária de iluminação pública de Belo Horizonte, permite que a população abra um chamado para substituir a luz de um poste que esteja apresentando falhas. A denúncia também pode ser feita pelo site da BHIP. De acordo com Fernando Lopes, o problema é resolvido em 24 horas.

Inteligência artificial x proteção dos cidadãos

O modelo PPP acende o debate sobre segurança dos dados da população. As entidades privadas terem acesso a dados é motivo de preocupação com a responsabilidade que essas empresas têm – ou não – e para que esses dados são utilizados. Luana Bulcão defende uma regulamentação em que o poder fique na mão do estado e que sejam utilizados em benefício da população: “[as empresas] não estão interessadas na privacidade dos cidadãos, não estão interessadas em como criptografar os dados… Elas estão interessadas apenas no lucro”.

Sancionada em agosto de 2018, a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), Lei n° 13.709, diz respeito ao tratamento de dados pessoais, dispostos em meio físico ou digital, sobre qualquer atividade que utiliza um dado pessoal na execução da sua operação em território brasileiro. Marcelo Porto explica que quando os dados são tratados na rede é por meio de um identificador único de forma anônima e não dados pessoais, como o CPF. “O identificador é gerado naquele dia, naquele momento, para o seu carro quando ele entrou no sistema e amanhã ninguém mais sabe que esse é o seu. Amanhã quando entrar vai ser gerado um outro identificador para você”, explica. Para ele, esse sistema é seguro o suficiente.

O último (ou primeiro) ato da humanidade

Diante da emergência climática que o Planeta enfrenta, é crucial que o contexto de cidades inteligentes perpasse iniciativas para proteção da natureza. No entanto, na visão da jornalista e ativista ambiental Juliana Minardi, as iniciativas que existem hoje são populares. As pessoas estão se dando conta da importância de se discutir a pauta ambiental vendo que o país já sofre com as consequências do descaso com o meio ambiente:

Nós precisamos decidir. Nós queremos sobreviver enquanto humanidade? Se queremos, precisamos tomar uma iniciativa agora. Para começar a preservar de fato as áreas verdes com muito mais intensidade– Juliana Minardi, jornalista

Belo Horizonte foi a capital brasileira que mais esquentou em 2023, de acordo com estudos do Centro Nacional de Monitoramento e Alerta de Desastres Naturais (Cemaden), registrando uma alta de 4,2°C. Dados revelam que mais de 3 mil pessoas já morreram por excesso de calor na capital, entre os anos de 2000 e 2018. Em razão do aumento elevado da temperatura, a Coordenadoria Especial de Mudanças Climáticas (COEMC), da Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) e a Subsecretaria de Proteção e Defesa Civil (SUPDEC) criaram um Protocolo de Calor para o município como um meio de articular e fortalecer as iniciativas municipais relacionadas à prevenção, monitoramento e enfrentamento de eventos climáticos extremos.

O documento estabelece os parâmetros técnicos para identificação de ondas de calor, definidas em 5 níveis, que vão desde o inicial, onde se deve ter atenção, até o nível de alerta 4, com critério de temperatura máxima diária de 35,8°C por dois dias consecutivos, classificando como Onda de Calor Extrema e Risco Muito Alto.

Juliana Minardi entende que tragédias vivenciadas hoje são fruto da ação humana. De acordo com ela, é urgente a proteção de áreas verdes, caracterizadas como um conjunto de áreas intra urbanas que contribuem de modo significativo para a qualidade de vida e o equilíbrio ambiental nas cidades, como praças, parques e florestas. Ela explica que essas áreas são uma tecnologia natural para a prevenção de catástrofes climáticas, porque auxiliam na permeabilidade do solo, como verdadeiras esponjas. 

A Prefeitura de Belo Horizonte assinou um decreto de desapropriação da Mata do Jardim América. Juliana Minardi relata que o prefeito Álvaro Damião se comprometeu a transformar o terreno da mata, hoje um local privado, em um Parque Comunitário, promessa deixada por Fuad Noman em seu primeiro mandato. Membro do movimento SOS Mata do Jardim América e articuladora da mobilização, Minardi comemorou a conquista para a população, em especial a mais jovem, que já entende a importância da preservação: “Nossas crianças estão crescendo e essas crianças que hoje estão restritas das matas, desses acessos às áreas verdes, precisam hoje viver essas áreas. Elas querem ter acesso hoje, como crianças, não amanhã, quando elas já forem adultas”.

Mata do Jardim América será transformada em Parque municipal. Foto:Reprodução

BH mais verde

Belo Horizonte possui mais de 60 Jardins de Chuva que, com solo artificialmente modificado para aumentar o armazenamento da água, ajudam no controle das inundações, reduzindo os alagamentos. Dos 69 registrados pela Secretaria Municipal de Política Urbana no Portal de Dados Abertos, 65 deles estão instalados em ruas. A Pampulha é a regional que mais possui jardins de chuva, com 53 deles. Em seguida, vem a regional Norte, com nove; a Leste, com três e o Hipercentro, com dois. Por último, Barreiro possui apenas um. As regionais Nordeste, Oeste, Noroeste, Centro-Sul e Venda Nova não têm jardins de chuva registrados.

A ambientalista reconhece a importância da medida, mas defende que as áreas verdes são mais eficientes na absorção do solo da água das chuvas. Isso porque as raízes das árvores são mais potentes como canais de infiltração.

Em 2025, a Prefeitura de Belo Horizonte estipulou o plantio de 50 mil árvores por toda a cidade, após um recorde batido em 2024 com mais de 35 mil plantios, mesmo ano em que mais de 60 árvores foram cortadas em função da estrutura do Stock Car, evento transferido para Curvelo. Até outubro de 2025, 4.092 supressões haviam sido realizadas, segundo a Subsecretaria de Zeladoria Urbana (Suzurb). Em contrapartida, 38.755 árvores foram plantadas.

Juliana Minardi critica as políticas de compensação ambiental e cobra uma revisão de como são feitas. Para ela, o plantio de mudas é importante, mas a curto prazo, pela demora e dificuldade no processo de crescimento, não compensa a poda de árvores já formadas.

Árvores catalogadas

Para ter um controle da quantidade de árvores que a cidade possui, está em processo de construção o Sistema de Informações do Inventário da Arborização que irá catalogar digitalmente as mais de 500 mil árvores em vias públicas. O presidente da Prodabel, Fernando Lopes, explica que um projeto de georreferenciamento para identificar um mapa de cobertura vegetal da cidade está previsto para 2026. Juliana Minardi ressalta a importância dessa coleta de dados, mas cobra que o sistema precisa ser acessível para que a população consiga monitorar e denunciar a situação arboréa em Belo Horizonte. 

De acordo com Lopes, a população será parte essencial do projeto a partir do momento em que ele estiver disponível de forma digital: “A gente pode coordenar de forma sistemática a expansão e ampliação da cobertura do terreno verde do município”. 

Inteligência urbana sem inclusão

Apesar de Belo Horizonte ser considerada uma cidade inteligente, ainda há muitos gargalos a serem resolvidos para que a capital alcance o cenário ideal. A coleta de lixo, a rede de esgoto, além da captação de esgoto, que deveria ser transportada para uma estação de tratamento, ao invés de poluir os rios, são alguns dos problemas a serem solucionados. 

Segundo dados disponibilizados pela Prefeitura de Belo Horizonte, no Portal de Dados Abertos do Gov, a população que mais sofre com problemas da coleta de lixo na capital é principalmente a população residente em vilas e favelas. Isso aquece um debate social, ao refletirmos para quem as ações inovadoras das cidades inteligentes são pensadas. Os dados refletem que as ações voltadas para um cenário ambiental sustentável, pensado para uma cidade inteligente, abrange um grupo específico de pessoas. 

Confira a tabela abaixo com os dados de insalubridade ambiental por sub-bacias hidrográficas em BH:  

Imersão virtual da capital

Renata Baracho, professora da UFMG e doutora em Ciência da Informação, explica que quando se trata de patrimônios, o smart significa a interligação de sistemas ligados aos patrimônios para “usar a cidade de uma forma mais inteligente, com mais qualidade de vida, com mais opções de lazer”. Inicialmente, as pesquisas eram voltadas apenas para a tecnologia. Agora, a prioridade é valorizar os patrimônios por meio de diversas frontes, utilizando do cruzamento de informações, para entender o potencial de um lugar na perspectiva da comunidade. 

Segundo ela, o grande desafio é como utilizar as novas tecnologias para divulgar os patrimônios da cidade. A valorização da sociedade nesse processo é fundamental para a pesquisadora. Ela cita a utilização das mídias sociais como forma de atrair a geração mais jovem: “Se o patrimônio antes estava restrito a pessoas mais velhas, que estivessem mais envolvidas com a história, de repente, agora ela entra de uma forma mais lúdica, conversando mais com a nova geração”.

Na área de virtualização de espaços, Fernando Lopes destaca que Belo Horizonte ainda precisa evoluir, principalmente com um viés cultural. A ideia, nos próximos anos, é começar a construir o acervo da Pampulha para disponibilizar em formato virtual e, a partir daí, ouvir a população e órgãos de fomento cultural, para criar um programa de virtualização e digitalização do espaço público da cidade. Fernando explica que têm incentivado startups para facilitar o processo, que demanda um alto investimento. Renata Baracho avalia o custo como um dos maiores desafios da área. De acordo com ela, se soluções à nível governamental não forem implementadas, nada mudará:

Continuaremos a perder o nosso frágil e rico patrimônio para o tempo, para o fogo, e para as intempéries resultantes da célere urbanização que vivemos.

Destaca Renata Baracho, no artigo “Alternativas inteligentes para a preservação do patrimônio cultural no contexto das smart cities”. 

Reportagem escrita por Danielly Camargos, com contribuição na apuração de Ana Luiza Rodrigues, Felipe de Paula e Vanessa Novais, para a disciplina de Laboratório de Jornalismo Digital, sob supervisão e orientação da professora Verônica Soares.

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Danielly Camargos

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