No dia 18 de abril de 2021, uma tentativa de criação da Superliga Europeia, em meio aos já existentes campeonatos de futebol, causou revolta e manifestações no mundo do futebol. O novo torneio, fundado, inicialmente, por 12 poderosos times, concentraria 20 importantes equipes europeias e grande aporte financeiro, por parte de investidores.
Tal episódio representa bem a elitização e a transformação do futebol em grande modelo de negócio, em que se visa cada vez mais o lucro e a concentração de renda em detrimento da competição e da paixão que, historicamente, move o esporte.
No início do século XXI, com a expansão da globalização, houve, na maioria dos países, grandes investimentos nos mais diversos setores da economia; no futebol não foi diferente. Desde os anos 2000, grandes magnatas, empresas e até Estados Nacionais, investiram fortemente nos grandes polos do futebol europeu. Dentre os exemplos, o bilionário russo Roman Abramovich no Chelsea, da Inglaterra; a grande varejista chinesa Suning, na Inter de Milão; e o país asiático Qatar, que colocou suas fichas no Paris Saint Germain.
O dinheiro decidiu um dos campeonatos de futebol mais importantes do mundo
No sábado, 29 de maio de 2021, a UEFA Champions League, principal competição de clubes do mundo, foi conquistada pela segunda vez pelo Chelsea, em final contra o Manchester City. O embate entre os dois times reflete o sucesso esportivo que os altos investimentos estrangeiros trouxeram para as equipes.
Em seu perfil no Instagram, Roman Abramovich comemora a conquista da Champions Legue junto aos jogadores e torcedores do Chelsea.
No entanto, o sucesso esportivo não é o objetivo exclusivo dos magnatas donos dos clubes. Esses milionários executam o sportwashing, prática na qual grupos, pessoas ou até mesmo países, usam do esporte a fim de limpar sua reputação ruim perante a opinião pública ou até mesmo de se popularizar e ganhar holofotes em outros mercados.
Entre os finalistas, por exemplo, temos os Emirados Árabes Unidos, país extremamente autoritário e com histórico de constante desrespeito aos direitos humanos, e que, por meio do Manchester City, vem tentando mudar essa visão pelo mundo. Roman Abramovich, ao comprar o Chelsea, se tornou conhecido e como consequência, ganhou um grande aumento em sua influência nos meios de poder.
O impacto dos investimentos nos campeonatos de futebol
Jornalista dos canais da ESPN, Mário Marra enxerga esse processo com naturalidade, visto que o futebol tem grande alcance e, além do retorno financeiro, atende aos interesses de marketing e publicidade almejados.
Eu já convivi pior com essa informação. Hoje em dia se eu saio do futebol e procuro ver outros mercados, vejo que isto é comum. Em Belo Horizonte, por exemplo, vemos uma Araújo a cada esquina. Atualmente eles são referência no meio farmacêutico da cidade.
Mário Marra
A entrada deste novo capital trouxe grandes investimentos em contratações, infraestrutura, modernização e construção de arenas, o que rapidamente elevou o patamar das equipes europeias. O aporte financeiro rende frutos para o futebol, popularizando os clubes e competições do continente no mundo inteiro, até em países com pouca ligação cultural com o futebol, como na China. Dessa forma, transformou os times em marcas globais.
É importante observar, no entanto, que o investimento feito visa retorno financeiro. Logo, em um contexto de contratações e salários inflacionados e grandes gastos com estruturas luxuosas, é inevitável um processo de mudanças para que a rentabilidade esperada deste modelo seja alcançada. Como consequência, observa-se um grande salto no preço médio dos ingressos, mercadorias do clube e pay per view, tornando o esporte um produto dedicado a um grupo privilegiado, financeiramente.
Elitização do futebol
Para Marra, todo esse processo reflete no afastamento do torcedor que “empurra o time” visto que estes, normalmente, são oriundos das classes econômicas mais baixas da sociedade.
Nos últimos tempos, observam-se protestos entre torcedores contra esta elitização e reivindicações de mais voz às torcidas quanto aos rumos que serão tomados pelos clubes. Após a tentativa da criação da Superliga Europeia em abril de 2021, essas manifestações se intensificaram, com diversas torcidas dos clubes envolvidos indo em peso às ruas protestar contra esta medida unilateral dos donos dos times, que ignoraram completamente a ligação histórica construída durante décadas entre clube e torcida.
Histórico de protestos
Um dos mais marcantes casos de protesto nos últimos tempos se deu no ano de 2005 e foi destaque nas mídias esportivas: a revolta da torcida do Manchester United com a venda do time para o empresário estadunidense Malcolm Glazer. A insatisfação teve como pauta principal a ambição do empresário em transformar o clube em uma instituição lucrativa sem respeitar a cultura, a história e a importância dos resultados dentro do campo.
Como consequência dessa revolta, um grupo de torcedores criou um novo time, chamado United of Manchester, que surgiu como um movimento de resistência e tem como lema principal a decisão conjunta e igualitária para todos os torcedores.
Algumas coisas podem caminhar um pouco menos no lado financeiro e ficar dentro da realidade histórica dos clubes.
Mário Marra
Mario Marra está esperançoso quanto à eficácia destas manifestações contra a elitização do futebol. Segundo o jornalista, há aspectos do esporte que podem caminhar um pouco menos no lado financeiro e ficar dentro da realidade histórica dos clubes. Ele cita exemplos que fundamentam esta expectativa, como o possível acerto entre o Liverpool e sua torcida, em que os torcedores teriam direito de participar de reuniões administrativas, e até mesmo decisões do clube. Há, ainda, o modelo de sucesso “50+1”, já implementado na Alemanha desde 1998, no qual apenas 49 por cento das ações de um clube são disponibilizados para venda no mercado externo.
Reportagem desenvolvida por Gabriel Motta e Pedro Viglioni na disciplina Jornal Laboratório de 2021/1.
Pra falar a verdade, acho que dinheiro dita a regra em tudo! Mas ótima matéria, nos da uma visão melhor do todo.