Em uma crescente urgência mundial de busca por meios mais sustentáveis e saudáveis de vida, atrelados a fatores como a ética animal, o veganismo e o vegetarianismo vêm ganhando cada vez mais espaço na sociedade.
Esses estilos de vida propõem que adotar hábitos transformadores em seu consumo pode promover ações revolucionárias e benéficas ao meio ambiente, à sociedade e à saúde. Para além de um estilo de vida ou hábito alimentar, o veganismo e o vegetarianismo podem ser vistos como um ato político, tendo em vista a prática do poder de escolha e o desvio de estilos de vida convencionais.
Tais modos de viver crescem a cada dia, convertendo hábitos alimentares, práticas de produção agrícola e de vestuário, produtos cosméticos e alimentícios, entre outros. Uma pesquisa realizada pelo Ibope Inteligência apontou o crescimento do número de vegetarianos no Brasil, principalmente nas regiões metropolitanas de São Paulo, Curitiba, Recife e Rio de Janeiro, cujo percentual passou de 8% em 2012 para 16% em 2018, constituindo quase 30 milhões de brasileiros que se declararam adeptos a essa escolha alimentar.
Você sabe a diferença entre veganismo e vegetarianismo?
Enquanto os veganos projetam um ideal de vida, adotando os valores sustentáveis e o fim de todas as formas de exploração animal, os vegetarianos compartilham dessas proposições focando mais na alimentação. Segundo a The Vegan Society, o veganismo busca o fim do uso de animais pelo homem para alimentação, produção de cosméticos, mercadorias, trabalho, caça, vivissecção, entre outros. A Sociedade Vegetariana Brasileira define o vegetarianismo como um regime alimentar que exclui os produtos de origem animal.
De acordo com a nutricionista Elaine de Moura, a procura por dietas veganas e vegetarianas tem crescido. “Acredito que o futuro é vegano, não há outra forma de sobrevivência se não for por esse caminho. Matamos 70 bilhões de animais terrestres todos os anos para consumo humano, sem contar os aquáticos, e isso não é sustentável. O meio ambiente, a saúde e a ética não podem ser sustentadas se continuarmos por esse caminho”, afirma a nutricionista.
Segundo a profissional, não é difícil manter uma dieta vegetariana/vegana, pois os ingredientes são simples, tais como: frutas, vegetais, legumes, cereais, leguminosas, oleaginosas. Os produtos vegetarianos e veganos que têm surgido, algumas vezes, são caros, mas no geral não são essenciais para a manutenção dessas dietas.
A nutricionista Jéssica Stein, especialista em dietas vegetarianas, alerta que a carne animal é um alimento com gorduras saturadas e ferro heme, que é potencialmente inflamatório. “Alguns estudos provam que tirar a carne e os derivados pode ter efeito protetor contra o câncer, diabetes tipo II, doenças cardíacas e metabólicas.” Para fazer a substituição da carne animal, podem ser ingeridos alimentos como: leguminosas (feijões, lentilhas, grão de bico, soja, tofu, ervilhas, amendoim) e cereais (arroz, macarrão, milho, trigo, centeio, cevada, etc.)
A escolha por ser adepto a esse estilo de vida pode vir pela influência de amigos, familiares ou por reflexões pessoais feitas a partir de acesso a dados e documentários, como, por exemplo, o Terráqueos, que trata dos aspectos da exploração animal.
A empreendedora Hannah Benites, 31 anos, é vegetariana desde 2012 e se tornou vegana em 2016, ela diz não ter sido difícil tomar a decisão. “Assim que você percebe que aquilo não é comida e entende todos os sofrimentos a que os animais são submetidos, fica muito fácil. A questão social é resolvida com respeito entre as partes, existem inúmeros restaurantes com opções veganas/vegetarianas para se reunir. O veganismo é, sem dúvida, o único caminho para a nossa evolução como sociedade, para um consumo sustentável e o impedimento de novas pandemias”.
Há quase dois anos sem ingerir qualquer produto de origem animal, a engenheira, influenciadora digital fitness e vegana Luisa Simei, 22 anos, declara que conseguiu obter bons resultados no ganho de massa muscular e no emagrecimento: “No começo, quebrei a cabeça para adaptar os lanches, mas logo fui pegando o jeito, e com acompanhamento nutricional não teve segredo. Dá para encaixar o veganismo em qualquer objetivo e em qualquer fase da vida”.
Já para quem tomou a decisão de se tornar vegetariano há pouco tempo e em plena adolescência, a mudança de hábitos pode ser mais complicada. Segundo a estudante Maria Clara Alvim, 16 anos, que entrou para o grupo dos vegetarianos há alguns meses, no início é um pouco difícil, por conta das “besteiras” que ela gosta de comer, como pizza e hambúrguer, mas com força de vontade, é possível. “Para ser sincera, minha alimentação até se tornou mais saudável, pois nunca fui de comer muitas verduras e legumes, e hoje são essenciais em meu prato juntamente ao típico arroz e feijão.”
O mercado vegano e vegetariano
Os movimentos vegetarianos e veganos também impactaram o mercado mundial e brasileiro, abrindo novas oportunidades para a criação de restaurantes, lanchonetes, produção de vestuário, transformações na agricultura, ascensão de pequenos produtores, entre outros, com a oferta de produtos direcionados a este público. Segundo dados da Sociedade Vegetariana Brasileira (SVB), em 2017 já existiam cerca de 240 restaurantes vegetarianos e veganos no Brasil, além de um crescimento exponencial de lançamentos de pratos e lanches veganos em restaurantes e lanchonetes não-vegetarianas. Esses produtos alcançam não somente o seu público-alvo, mas também atraem uma parcela da população que busca se engajar em manter uma alimentação mais saudável e preocupada com a sustentabilidade, reduzindo o consumo de carne, leite e ovos.
A Bem te Vivo, empresa mineira que trabalha com confeitaria vegana, nasceu a partir da necessidade de atender um público que se preocupa com o bem-estar dos animais e a preservação do meio ambiente. A empresa, que faz parte da Associação Horizontes Agroecológicos, cooperativa de pequenos agricultores urbanos que plantam e colhem produtos agroecológicos e orgânicos, possui um cardápio livre de leite, ovos e glúten, atendendo pessoas que têm restrição ou alergia alimentar e buscam produtos livres de agrotóxicos. As embalagens também são sustentáveis, livres de plástico e biodegradáveis para gerar menos lixo.
‘’ Seguimos o pensamento e desejo de trazer para a nossos clientes a consciência de que podemos fazer o nosso mundo melhor através de pequenas mudanças em nossa forma de alimentar e a consciência da necessidade de cuidar e respeitar toda forma de vida existente no planeta, além de trazer sustentabilidade através de ações como reuso e reciclagem de produtos ao invés de descartes desnecessários de produtos ainda com qualidade para uso’’, relatou Silvana Edwiges, proprietária da empresa.
As empresas veganas também possuem capacidade de envolver afetividade e criatividade em suas receitas, unindo histórias de vida tradicionais a um contexto contemporâneo. A UAI Tofu, empresa vegana ativista, conseguiu propor a receita de tofu de modo inovador, através do desenvolvimento de uma receita mineira há dez anos, dando início em suas vendas a partir de 2016. O seu idealizador, Laercio Almeida, é filho de pecuaristas e desde criança aprendeu a fazer queijo minas. Há 11 anos se tornou vegano e trabalhou em restaurantes taiwaneses onde aprendeu a fazer o tofu tradicional. Ele decidiu juntar as duas receitas (de queijo minas e tofu) para criar um produto único, que atendesse veganos, vegetarianos, atletas, alérgicos, etc. ‘’Nós acreditamos que o caminho para melhorar nosso planeta está diretamente relacionado ao veganismo, empreendedorismo, feminismo e igualdade racial e dessa forma trabalhamos e vivemos com base nesses pilares’’ diz Hannah Benites, funcionária da empresa.
Além de alimentos, muitas empresas também investiram no ramo de bebidas que atendessem o público vegano, vegetarianos e de pessoas que buscam um estilo de consumo mais saudável. Assim nasceu a Wewish, fabricante dos refrigerantes e tônicas Wewi, fundada em 2010 pelo casal Eduardo Castilho e Anna Carolina Coelho. O casal fundador já havia atuado no mercado de bebidas (ele como fornecedor de matérias-primas para o segmento e ela na área de marketing da Coca-Cola).
Analisando como o cenário do mercado de refrigerantes estava decrescente nos últimos anos, em virtude da associação do produto com doenças, artificialidade e obesidade infantil, o casal teve a ideia de produzir um refrigerante que mantivesse o prazer de consumo, mas fosse natural e mais saudável. Assim foi criado o Wewi, intitulado: o primeiro refrigerante orgânico do Brasil, o primeiro refrigerante orgânico de guaraná e água tônica orgânica rosé do mundo,sem sódio ou insumo artificial e livre de transgênicos. ‘’Nossa principal diretriz é oferecer aos nossos consumidores bebidas saudáveis e que mantenham o prazer de consumo. Temos como valores adicionais fundamentais: o respeito ao meio ambiente e diversidade, a busca pela inovação e o apoio ao empreendedorismo’’ relata Roberto Lombardi, um dos sócios da empresa. Segundo ele, a Wewish está crescendo ano a ano. “Nossa estratégia é ampliar a divulgação dos nossos produtos e distribuição geográfica, tornando o produto mais conhecido, e apoiar ações que contemplem os valores e missão da Wewish’’, diz o fundador.
O mercado vegetariano e vegano está em expansão e se tornando um nicho importante para a economia internacional. De acordo com Guilherme Carvalho, secretário executivo da Sociedade Vegetariana Brasileira (SVB), em uma entrevista para o jornal Edição do Brasil, desde 2012 o número de brasileiros vegetarianos e veganos têm crescido consideravelmente, além da quantidade de pessoas que estão interessadas em reduzir o consumo de carne, impulsionando o nicho de forma significativa. Segundo Guilherme, até em 2019 o crescimento do mercado vegetariano chegou a faturar cerca de R$ 12,5 milhões anuais e o vegano injetou R$ 2,8 milhões na economia brasileira a cada ano. O lucro global desses produtos é de cerca de US$ 51 bilhões.
Reportagem desenvolvida por: Cristiane Cirilo, 4° período Isabella Alvim de Amorim, 4° período.
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