Colab
Uma rua mão única larga preenchida por carros parados em ambos os lados, à esquerda da foto um carro tem propaganda políica em seu vidro traseiro e, no chão da rua, muitos santinhos políticos
Rua de Santa Luzia durante as eleições de 2024 / Fábio Santos

Eleições e poluição: como lixo das campanhas afeta as cidades

Iniciativas do TRE-MG auxiliam no combate ao acúmulo de resíduos deixados nas ruas.

Campanhas eleitorais têm provocado, historicamente, um crescimento de resíduos visuais (santinhos/banner/cartas), causando um impacto diretamente na qualidade de vida nas áreas rurais e urbanas. Em eleições passadas, diversos candidatos receberam críticas por práticas nocivas ao meio ambiente, com o uso excessivo de materiais físicos que poluíam os locais mais movimentados nas suas respectivas cidades.

Mesmo recebendo críticas, essa chamada de atenção, na realidade, não surte efeito. Para combater a poluição gerada pelas campanhas, o Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais (TRE-MG) promoveu uma iniciativa, em 2018, para reciclar os materiais acumulados pelos candidatos após o momento de eleições.

O Tribunal continuou com as ações e lançou, durante o pleito municipal de 2020, a campanha Eleições Sustentáveis 2020, que arrecadou 28,48 toneladas de materiais de campanha, como santinhos e panfletos, que foram entregues a 25 associações e cooperativas de reciclagem em 21 municípios mineiros. Em 2018, foram arrecadadas 11 toneladas. Anteriormente, o TRE já havia realizado a campanha “Sujeira não é legal”, que, em quatro edições, coletou quase 12 toneladas de resíduos.

A campanha Eleições Sustentáveis 2024 foi lançada este ano, com o mesmo objetivo de conscientizar candidatos, partidos e coligações sobre o descarte correto das sobras de materiais de campanha. Ao final das eleições, esses materiais foram entregues a 181 associações e cooperativas em 145 municípios. Além disso, o material de propaganda irregular apreendido foi encaminhado para reciclagem.


Leia também: Conheça as propostas dos candidatos à Prefeitura de BH


Impactos ao meio ambiente

O conhecido derrame de santinhos ainda é uma prática presente nos anos de eleição. A ação consiste em um descarte de uma quantidade elevada de panfletos do candidato com seu número e partido na porta de alguns locais de votação. Costumam ocorrer durante a madrugada do dia da eleição para os criminosos não serem pegos. Segundo o TRE-MG, essa atividade se enquadra no crime de divulgação de propaganda no dia da eleição. art. 39, § 5º, inc. iii, da lei n. 9.504/97. Vale lembrar que essa prática não afeta negativamente somente o candidato, mas principalmente o meio ambiente, podendo causar acidentes, como quedas e escorregões de eleitores.

Candidata a vereadora de Belo Horizonte, pelo PCdoB, a cientista social Sofia Amaral, luta por causas ambientais e tem como uma de suas propostas participar ativamente do plano de arborização urbana  e luta pelas metas de reflorestamento das regionais de BH. “Existem formas de minimizar os impactos ao meio ambiente, como fazer um cálculo de quantos materiais são produzidos… fazer um bom planejamento. Além disso, realizar um descarte correto. Praticamente todo material produzido é reciclável, seja de papel, plástico ou mesmo metal. Deve-se pensar também na própria reutilização… os partidos podem se organizar quanto a isso, como os wind banners que são mais difíceis de descartar corretamente. Existe também o manual de boas práticas, que ainda não é uma realidade em nosso país, como não colocar santinhos em portas de colégios eleitorais… que é uma prática normalizada, mas que é criminosa, suja, que ocorre em todo o período eleitoral”, explica.

Não só isso, mas também comentou sobre os resultados visíveis pela população por conta da poluição gerada pelos santinhos. Afirmou que os papéis acabam entupindo-os bueiros, causando problemas com os esgotos. Além disso, o acúmulo desses materiais dificultam a mobilidade das pessoas que possuem alguma deficiência.

Sofia Amaral ex- assessora parlamentar da Deputada Federal Duda Salabert (PDT) com vestes brancas por baixo de um blazer em estampa composta por linhas pretas e brancas horizontais e verticais em um fundo cinza. Atrás de Sofia está o Mercado Central do outro lado da rua preenchida por veículos.
Redes Sociais / Arquivo Pessoal. Instagram: @sofiaamarall

Sofia Amaral já trabalhou como assessora parlamentar da então vereadora Duda Salabert (PDT), que adotou, em sua campanha à prefeitura de BH, a meta de “Lixo Zero”. A ex-assessora falou sobre a experiência: “Não só nessa campanha de 2024, mas quando trabalhei com a Duda em 2020, essa medida do ‘Lixo Zero’ também foi adotada, mesmo sendo ano de pandemia. É uma estratégia extremamente interessante e importante, sobretudo no contexto de emergência climática e de construir uma política cada vez de forma mais limpa. É uma forma inovadora para provocar as pessoas no nível de consciência de ‘é uma possibilidade, trocar um wind banner por uma planta’, é muito rica nos detalhes de disputa de consciência. A Duda é uma ambientalista e ela traz consigo uma resposta sobre o que ela pensa do mundo”.

A política também declarou durante a entrevista que é um sonho seu realizar uma campanha “Lixo Zero”, mas que o papel físico é muito importante para se apresentar para as pessoas, além de atingir eleitores que tenham dificuldades com o digital. O material físico é fundamental para os candidatos que não possuem muita visibilidade e repercussão pública, que estão começando a sua trajetória, mas completou dizendo que em breve, se for possível, com certeza adotaria essa medida, que seria um grande objetivo e a deixaria muito feliz.

O que a população pensa?

A reportagem entrevistou cidadãos nas ruas da região metropolitana de Belo Horizonte. Os eleitores falaram sobre a poluição gerada pelas campanhas eleitorais dos candidatos.

A neuropsicopedagoga, Andréa Gonçalves, eleitora de BH, mostrou consciência sobre o problema: “É muito comum percebermos o acúmulo de santinhos jogados nas ruas, principalmente nos locais próximos à votação. Isso é muito complicado, porque podem entupir bueiros causando enchentes, ainda mais agora nesse período de chuvas. É importante que os candidatos tenham consciência, já que eles mesmos se propõem a resolverem problemas urbanos”.

O jornalista e locutor, Maickel Anderson, eleitor de Santa Luzia, discorreu sobre a poluição visual das campanhas: “Antes o candidato colocava vários carros de som nas ruas, poluindo todo o ambiente, causando aquele ‘alarde’, durante toda a campanha. Depois foi permitido somente o carro de som se o candidato estivesse próximo, como nas carreatas, e isso diminuiu muito a poluição sonora nas campanhas eleitorais. Os programas de rádio fizeram uma diferença grande, pois caíram nas redes sociais, ajudando em uma enorme divulgação”.

A técnica de enfermagem, Maria Aparecida do Reis, eleitora de Ribeirão das Neves, lembrou que o problema é antigo: “Sou moradora da região há mais de 35 anos, moro duas ruas acima de uma escola que é utilizada para votação em eleições, e em dia e em semana de eleições, sempre acarreta muitos papéis de políticos espalhados pela rua. Geralmente são os garis que fazem a limpeza um dia ou dois após, mas existem moradores que limpam suas calçadas imediatamente para não acumular lixo. Já vi motoqueiro cair e se machucar por escorregar nesse excesso de papéis, mas querendo ou não, em época de eleição é algo normal por aqui”.

O problema do acúmulo de lixo nas campanhas é algo que afeta a população de diversas cidades. Iniciativas tomadas pelo TRE-MG são muito importantes devido à quantia de resíduos arrecadados, que superam em toneladas de papéis e cartazes. Mesmo com o acúmulo de lixo das campanhas, a legislação eleitoral não prevê regras específicas sobre sustentabilidade. Por isso, a Justiça Eleitoral não faz nenhum tipo de fiscalização quanto ao descarte de materiais. Ela apenas realiza campanhas de conscientização para que seja dada a destinação ambientalmente adequada.

Reportagem de Rafael Cruz, Fábio Rodrigues e Luiz Octávio, da turma do 2° período de Jornalismo do campus São Gabriel, na disciplina Apuração, Redação e Entrevista, sob supervisão do professor Vinicius Borges.

Colab PUC Minas

Colab é o Laboratório de Comunicação Digital da FCA / PUC Minas. Os textos publicados neste perfil são de autoria coletiva ou de convidados externos.

Adicionar comentário