Um estudo divulgado em 25 de setembro pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel) mostrou que 62% dos brasileiros evitam procurar médicos, mesmo quando precisam. O levantamento faz parte do programa “Mais Dados Mais Saúde”, que é uma iniciativa dos institutos Umame e Vital Strategies.
O objetivo da iniciativa é gerar dados robustos e profundos a fim de informar a população e incitar políticas que garantam acesso à saúde. A pesquisa teve apoio do Instituto Devive e da Resolve to Save Lives e entrevistou 2.458 brasileiros entre agosto e setembro de 2024.
As justificativas para não buscar ajuda especializada são diversas:

Além da desistência, os entrevistados também relataram que têm dificuldade de conseguir atendimento mesmo depois de procurar ajuda. Entre as respostas, 40,5% afirmam ter buscado atendimento médico sem sucesso. A causas também são variadas:
Caio William Machado trabalha como médico plantonista em uma unidade da UPA e acredita que: “Um dos principais fatores que aumenta esse número é o autodiagnóstico. Como hoje em dia o acesso à informação é facilitado, é comum que os pacientes procurem na internet um diagnóstico para seus sintomas e se tratem sozinhos em casa, o que não é o certo”. Ele ainda afirma que a demora do atendimento também é um motivador: “Quando o atendimento demora mais que duas horas, o paciente tende a desistir”.
O médico ainda cita que o alto preço das consultas – no caso dos atendimentos particulares – é um fator decisivo na hora das pessoas decidirem se vão ou não ao médico. No Brasil, menos de um terço da população teêm plano de saúde. Segundo a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) existem aproximadamente 50 milhões de brasileiros beneficiários de planos de assistência médica. Isso equivale a aproximadamente 25% dos brasileiros.
Um outro fator que deve ser considerado é a falta de informação que a população tem em relação a diferença entre UPA e UBS. “UBS significa Unidade Básica de Saúde e UPA Unidade de Pronto Atendimento. A UBS se encaixa no que a gente chama de ‘atenção primária de saúde’. É um tipo de atendimento no qual existe um vínculo com o paciente e uma dinâmica mais longitudinal. Esse tipo de atenção serve para cuidar de doenças crônicas e prevenir outras doenças. Já a UPA é um segmento secundário. São atendimentos de maior complexidade e servem para resolver queixas ‘“agudas’”. São atendimentos pontuais”, explica Caio William.
Outro fator relevante é que muitas pessoas só procuram a UPA, e, por isso o sistema fica sobrecarregado. Para um acompanhamento contínuo o ideal é procurar uma UBS, mas a maioria das pessoas não sabem disso. “Como porta de entrada do SUS e em seu papel de ordenadora do cuidado, a Atenção Primária à Saúde deve estar organizada de modo a garantir que a maioria das questões de saúde da população sejam preveníveis e tratáveis, sem que evoluam para quadros mais complexos. Fortalecer estes mecanismos para que a população busque cuidado oportunamente quando necessário e receba o atendimento que precisar é fundamental para termos um sistema de saúde mais eficiente e resolutivo, afirma Thaís Junqueira, superintendente-geral da Umane – que é uma das instituições que apoiaram a pesquisa.
Mesmo que o índice de desistência de procura por um atendimento seja alta, a qualidade do atendimento apresenta nuances positivas no resultado das pesquisas. A maior parte de quem respondeu avaliou bem à assistência médica que recebeu. O respeito à privacidade, a clareza das explicações e a confiança nos profissionais são os aspectos que mais se destacaram, com 79%, 75% e 68% das respostas, respectivamente. Esses resultados explicitam a qualidade do atendimento ofertado aos cidadãos, que, infelizmente é atravessado pela barreira da sobrecarga e demora do sistema, que dificulta o direito humano do acesso à saúde.