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Os desafios de pessoas com fibromialgia no Brasil

Dores generalizadas no corpo, fadiga, distúrbios do sono, depressão e ansiedade são sintomas comuns na rotina de pessoas com fibromialgia. Classificada como doença pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em 1992, sua causa é desconhecida até hoje pela comunidade médica. A fibromialgia é uma doença crônica invisível e o processo de compreensão de seus sintomas pode ser lento para fibromiálgicos, seus amigos e familiares.

A mineira Camila Freire, de 37 anos, conta como é difícil conviver com a doença: “Eu fui em um especialista em dor e ele me disse que fibromialgia nem existia, foi uma consulta muito louca. Ele é ortopedista, mas aparecia na lista do meu plano de saúde como especialista em dor. Ele me falou como a fibromialgia foi inventada pelos americanos para receber dinheiro de seguro e que não existia”. Após a experiência, ela relata que saiu da consulta correndo. 

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Camila Freire relata quando foi ao ortopedista e a disse que fibromialgia não existia
Camila Freire, descobriu ser fibromiálgica em 2017 / Foto: Arquivo Pessoal

A mineira descobriu ser fibromiálgica em 2017, após se consultar com vários médicos e realizar diversos exames para entender as fortes dores e o cansaço que sentia no corpo.

“Eu passei por mais dois médicos e acabei achando minha atual reumatologista, que me deu o diagnóstico”. Para Camila, no período em que ainda desconhecia a doença, a parte mais angustiante foi não entender o que eram suas dores no corpo.

A dificuldade de conseguir diagnóstico é um relato comum entre as pessoas fibromiálgicas entrevistadas. A advogada Josiane Coelho Duarte Gearola, de Rondonópolis (MT) passou por experiências parecidas com as de Camila:

“Eu passei por diversos médicos e ninguém cogitou me mandar para um reumatologista. É muito assim: ‘não, não é nada seus exames estão normais’, mas não pode ser nada, não pode ser normal eu sentir dor o tempo todo”, relata. Ela desconfiou ter a doença e marcou uma consulta com uma médica reumatologista que, em dezembro de 2015, fechou o seu diagnóstico. 

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Josiane sobre a dificuldade em conseguir um diagnóstico médico

O que eu sinto é que ninguém se importa em conhecer e querer saber sobre a doença

Josiane Coelho, descobriu ser fibromiálgica em 2015

Médico especialista em dor?

No site do Drauzio Varella, o médico José Roberto Provenza explica que “o paciente com fibromialgia deve procurar um reumatologista para o diagnóstico e para o tratamento da doença”. No entanto, qualquer outro médico especialista em dor pode dar o diagnóstico, como a médica anestesiologista Ressala Castro Souza, que explica: “durante muito tempo, sabia-se muito pouco sobre a fibromialgia e os pacientes eram muito estigmatizados, considerados portadores de dores psicológicas”.

Segundo ela, hoje, já se sabe que o mecanismo de ação da fibromialgia não está exatamente nos músculos ou nas articulações, onde o paciente se refere à dor: “O mecanismo de ação está no cérebro”. É como se o cérebro dos pacientes fosse uma casa e, nessa casa, tivesse um sistema de alarme que apitasse o tempo todo, mesmo quando não tem ‘um inimigo externo’”. A médica também explica que o paciente que entende e trata a fibromialgia, lida melhor com ela: “Não tem nenhum exame que a comprove, ela é diagnosticada pela consulta médica”, completa. 

Segundo a Sociedade Brasileira de Reumatologia, a fibromialgia atinge de 2% a 3% da população brasileira, o que equivale a, aproximadamente, seis milhões e setecentas mil pessoas. Uma parcela da população que, por terem sintomas serem invisíveis, ainda pode ter suas dores questionadas por familiares, amigos e a sociedade. Quem explica isso é a psicóloga clínica Gabriela Nogueira Pinheiro da Silva:

O sofrimento vem antes do diagnóstico. Quando o paciente é diagnosticado, muitas vezes ele já não está conseguindo trabalhar por causa das dores no corpo. O paciente já deixou de sair e de encontrar as pessoas que gosta. Às vezes, as pessoas não entendem, familiares duvidam, provocando uma predisposição à depressão”.

Gabriela Nogueira Pinheiro da Silva, psicóloga clínica

O desafio do estigma e da falta de conscientização são fatores que prejudicam a qualidade de vida de pessoas com fibromialgia. Por isso, nos últimos anos, foram surgindo no Brasil associações que lutam por essa causa, como a Associação Nacional de Fibromiálgicos e Doenças Correlacionadas (Anfibro) e a Associação dos Fibromiálgicos do Vale do São Francisco (AFibroVaSF), em Pernambuco. 

As desvantagens de ser invisível

“Se não tivermos uma base de apoio, a gente não consegue dar um passo à frente”, afirma José Wilson Alencar de Oliveira, bancário, que foi afastado do trabalho por invalidez acidentária há 20 anos, após desenvolver lesão por esforço repetitivo. Ele fundou, junto com a fibromiálgica Cleudenir de Souza Silva, em 2018, a AFibroVasF. A ideia de fundar uma associação veio quando participaram do projeto de extensão Fibrovast (Fibromialgia – Encontros do Vale), desenvolvido na Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf).

O projeto teve início em 2016 e ajudou a empoderar pessoas com fibromialgia, trazendo especialistas e profissionais de várias áreas para conversar, discutir, dialogar com fibromiálgicos, seus familiares e as pessoas do Vale do São Francisco. Foi criado e formado por estudantes de psicologia, medicina e farmácia.

“Não é fácil conviver com dores 24 horas por dia, de forma moderada, intensa e crônica” relata José Wilson, que convive com as dores desde 1995, mas só teve o diagnóstico em 2006. “[Antes de descobrir a doença], achava que estava ficando doido, com um câncer incurável. A dor que eu sentia era cruel demais e eu não sabia o que era, doía de cima para baixo, nos quatro quadrantes do meu corpo”, relembra.

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Depoimento completo de José Wilson Alencar

Atualmente, a associação tem um grupo de apoio que acolhe outros fibromiálgicos, organiza seminários, palestras e atividades, como o Chá de Escuta, para criar vínculos de conhecimento e respeito entre pessoas com fibromialgia, amigos, familiares e a sociedade civil. Segundo a psicóloga clínica Gabriela Nogueira, os espaços de acolhimento são fundamentais no tratamento da doença: “Os fibromiálgicos podem ter essa sensação de incompreensão, de inadequação e, às vezes, até duvidar de si mesmos. O julgamento alheio é muito forte e quando você encontra pessoas que passam pelo mesmo que você, isso gera transferência, acolhimento e cuidado”. 

Associação ds Fibromiálgicos do Vale do São Franscisco (AfibroVaSF) / Foto: Divulgação

Fibromialgia: questão de lei 

Os associados da AFibroVasF também conseguiram pautar a fibromialgia no âmbito jurídico municipal e aprovar projetos de lei que melhoram a qualidade de vida dessa população na região do Vale do São Francisco. Em 2019, as ações do grupo desencadearam mudanças nas cidade de Petrolina, em Pernambuco, com a aprovação do projeto de lei que garante três direitos fundamentais: prioridade no atendimento em instituições públicas e privadas, estacionamentos em lugares reservados a pessoas com deficiência e direito à prioridade do acento em transporte coletivo. Além da aprovação da lei n° 3.187/2019 , que institui o Dia Municipal da Fibromialgia para realização de palestras, campanhas e debates no dia 12 de maio.

Essas cidades não são as únicas com projetos de lei garantidos. Mudanças graduais ocorrem em diferentes cidades e estados do país, segundo a advogada e fibromiálgica Josiane Coelho. Desde que descobriu ter fibromialgia em 2015, ela acompanha os trâmites jurídicos para conhecer e reivindicar seus direitos. Segundo ela, nos últimos quatro anos, “muitos estados e municípios deram um salto gigantesco em enxergar os fibromiálgicos”.

As mudanças na constituição federal, no entanto, ainda são insuficientes. Em novembro de 2021 foi sancionado o projeto de lei que estabelece o dia 12 maio como o Dia Nacional de Conscientização e Enfrentamento da Fibromialgia, mas a lei que institui a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Fibromialgia, está parada, “aguardando parecer do relator na comissão de Seguridade Social e Família (CSSF)”, segundo consta no site da Câmara dos Deputados, desde 2019.

Caso o governo federal aprove a legislação, os Estados e municípios não precisam mais fazer suas leis específicas”

Josiane Coelho, advogada e fibromiálgica

Na lei de política nacional, as diretrizes garantem atendimento multidisciplinar, disseminação de informações sobre a doença na sociedade, a participação coletiva na formulação de políticas públicas, incentivo à pesquisa científica que contemple essa área da saúde, entre outras. A proposta também garante a promoção de inserção dessa população no mercado de trabalho, a isenção no pagamento do imposto de renda e inclui os fibromiálgicos como pessoas com deficiência, para todos os efeitos da lei. 

Enquanto o projeto não é aprovado, a luta por direitos continua nos próprios municípios ou estados. Em Rondonópolis, por exemplo, cidade em que Josiane reside, há garantido por lei, desde de junho de 2019, o atendimento prioritário a fibromiálgicos em filas de empresas públicas e privadas. Mesmo com a garantia desse direito, ela lembra das dificuldades em emitir seu cartão de prioridade. “Eu liguei na Secretaria de Saúde do Município e ninguém que me atendeu conhecia essa lei, nem como eu ia conseguir meu cartão. Eu fiquei três ou quatro meses esperando alguém tomar alguma posição e ninguém me respondia. Eu tive que entrar com um mandado de segurança para conseguir meu direito”. 

No Mato Grosso, a Política Estadual dos Direitos da Pessoa com Fibromialgia foi sancionada em novembro de 2021. Um projeto parecido com o nacional, exceto pela emenda da isenção do imposto de renda. Em dezembro, no mesmo estado, também foi aprovado um projeto de lei que “dispõe sobre a implantação dos centros de diagnóstico de pacientes com fibromialgia e dá outras providências”.

Apesar dos direitos concedidos, a matogrossense relata uma situação recente de discriminação na fila para tomar a terceira dose da vacina contra covid-19, em que não foi atendida como prioritária. Segundo a advogada, “eles sabiam que eu tinha preferência e, mesmo assim, alegaram que, como não tinha ‘tumulto’ [na fila], não tinha porquê conceder esse direito”. Josiane denunciou o caso para a ouvidoria e o Ministério Público. 

A juíza Theanna de Alencar Borges explica: “embora não haja previsão expressa na legislação federal quanto aos direitos das pessoas com fibromialgia, entendo que elas podem ser enquadradas como pessoas com deficiência. Para tanto, podemos invocar a Constituição da República Federativa do Brasil, a Convenção da ONU sobre os direitos das pessoas com deficiência”. Segundo Theanna, o projeto de lei federal que institui a política de proteção dos direitos de fibromiálgicos foi inspirado no artigo “Da necessidade de enquadramento dos pacientes de fibromialgia como pessoas com deficiência e da concessão de horário especial de trabalho”, escrito por ela e publicado em novembro 2014.

A ideia de escrever o artigo veio após uma familiar da juíza, com fibromialgia, necessitar de tratamento multifatorial, mas não conseguir fazê-lo em virtude da carga horária de trabalho. “Após pesquisar o tema, observei que era viável a busca do enquadramento dela como pessoa com deficiência e daí surgiu a ideia de escrever o artigo, pois a questão ainda não era objeto de grandes discussões”, explica. “A referida pessoa é servidora pública federal e buscou o enquadramento como pessoa com deficiência administrativamente. Entretanto, sua pretensão foi indeferida. Após isso, meu irmão, que é advogado, acionou a Justiça Federal, representando-a, e obteve tutela em sentença que determinou o enquadramento dela como pessoa com deficiência e, ainda, que ela trabalhasse em horário especial imediatamente”, completa Theanna sobre o caso. A decisão já foi julgada e definida pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).  

A Associação Nacional de Fibromiálgicos e Doenças Correlacionadas (Anfibro), fundada em setembro de 2018, elaborou a Lei Daniel Lenz – em homenagem ao ex-presidente do grupo que faleceu em decorrência da covid-19 – , aprovada em abril de 2021. Por meio do Mapa das Leis, criado também pela Anfibro, é possível conferir diferentes projetos de lei ,em cidades e estados do Brasil, aprovados ou que ainda estão em andamento. A associação também realiza congressos, palestras e cursos para informar e debater sobre a doença na sociedade. Para a membra diretora e do Comitê Médico Científico da Associação, Genilza Valente da Silva: “o impacto da Anfibro na sociedade foi trazer à tona a problemática da falta de políticas públicas voltadas para o tratamento de fibromialgia. Além de contribuir para que o executivo, o legislativo e os profissionais da área de saúde colocassem um olhar mais sensível à causa da dor dos fibromiálgicos”. 

Associação Nacional de Fibromiálgicos e doenças correlacionadas (Anfibro) / Foto: Divulgação

Mulheres de “Fibra”

Segundo a Sociedade Brasileira de Reumatologia, de cada dez pessoas com fibromialgia, sete a nove são mulheres e ainda não existe uma causa descoberta. Na Associação de Fibromiálgicos do Vale do São Francisco, a maior parte dos membros são mulheres e, de acordo com a membra diretora Cleudenir da Silva Souza, 90% não conseguem trabalhar. Destas 90%, apenas 10% conseguem algum auxílio ou até mesmo aposentadoria. “Graças a Deus, eu e a Sueni fazemos parte desse grupo [que conseguem trabalhar]”, relata a agente comunitária de saúde de 40 anos. Sueni Damaceno Rodrigues também é membro da Direção da AFibroVaSF e administradora de 30 anos.

Entrevista com o diretor e as diretoras da AfibroVaSF e a monitora Bárbara Faria / Arquivo Pessoal

A administradora trabalha na Prefeitura da cidade de Petrolina junto com outras duas mulheres, também fibromiálgicas – uma delas era gari e teve que ser realocada, porque as dores a impediam de realizar o trabalho que demanda muito esforço. “O que a gente sente no administrativo é muita dor na lombar, na mão, nos dedos. Os dedos travam, o braço inteiro. Tem horas que você precisa levantar, fazer um exercício, porque a dor é intensa, principalmente na região dos ombros, nuca”.

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Depoimento completo da fibromiálgica Sueni Damaceno

A gente vai se adaptando… É uma luta, dia a dia. Se a gente não tiver força de vontade, a gente nem sai da cama”

Sueni Damaceno, fibromiálgica e membra diretora da AfibroVaSF
Josiane Coelho Gearola, mãe, advogada e fibromiálgica / Foto: Arquivo Pessoal

Em Rondonópolis, no Mato Grosso, a advogada Josiane Coelho Duarte Gearola, de 34 anos, conta como lida com as dores e a maternidade. “Eu sempre tive dores nas pernas, aquela dor do crescimento, muita dor de cabeça, dor prá lá, dor pra cá, tanto que a minha mãe brincava ‘ai, você tinha que chamar Maria das Dores'”. A advogada tem dois filhos, um menino de 10 e uma filha de 13. Segundo ela, as duas gravidezes foram tranquilas, mas se tivesse que ter filhos hoje em dia, não daria conta.

A minha filha, às vezes, reclama […] Como é que você vai explicar que não é porque você não quer, é porque você não ‘tá’ dando conta?!

Josiane Coelho, fibromiálgica e mãe
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Depoimento completo de Josiane sobre sua relação com a fibromialgia e maternidade

Dá pra respeitar os limites do corpo?

A psicóloga Gabriela Nogueira, com experiência no tratamento de fibromialgia em uma paciente, conta que o impacto da doença é maior porque “as mulheres têm uma ideia social maior de ser útil, de trabalhar muito, de cuidar da casa e da família”. Com o diagnóstico de fibromialgia, elas precisam se reinventar, trabalhar menos e entender o limite do seu corpo.

Para Cleudenir da Silva, o que a motiva sair de casa é o seu trabalho. “Como eu trabalho com pessoas, eu vou lá ouvir o outro, as queixas do outro. Enquanto isso, eu estou tentando controlar a mente para burlar a situação das ‘serods’ [significa ‘dores’ ao contrário, um trocadilho interno entre os membros da Afibrovasf]”. Mas, ela ressalta, se tivesse que respeitar os limites do meu corpo, eu não iria

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Depoimento completo de Cleudenir sobre a sua relação com seu trabalho e as dores das fibromialgia

A mineira Camila Freire, citada no início da reportagem, é advogada formada, mas atualmente não trabalha pelo incômodo das dores. Ela tentou começar outras faculdades, mas não conseguiu terminá-las. Um dos motivos: a falta de acessibilidade na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), onde se matriculou em Filosofia. “Uma cadeira desconfortável vai me dar uma dor horrorosa depois, e não é óbvio para as pessoas que seja assim. Por exemplo, eu fazia letras na UFMG, as cadeiras eram confortáveis. Mas depois eu fui fazer filosofia, cadeiras horrorosas e eu não dei conta de ficar lá, porque eu sentia muita dor”. 

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Depoimento em áudio da Camila sobre as cadeiras da UFMG

Ela também comenta se sentir constrangida em reivindicar o direito de prioridade nas filas: “Em tese, eu teria direito a acesso para deficiente e condições para ficar sentada. Mas como a fibromialgia é uma doença invisível e nem todo mundo considera deficiência, a gente fica constrangido. Por exemplo, em uma fila, se a gente pegar fila preferencial, em tese a gente teria direito e se eu ficar muito tempo na fila eu vou sentir uma dor horrorosa depois, mas fica aquele constrangimento que se alguém falar que ‘não, você é uma pessoa saudável que tá pegando uma fila assim’. Eu conheço pessoas que falam mesmo, eu fico meio constrangida”.

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Relato da Camila sobre o constrangimento em filas e acentos preferências de BH

No estado de Minas Gerais, alguns municípios têm leis que garantem o atendimento prioritário para pessoas com fibromialgia, mas não é o caso de Belo Horizonte, onde Camila reside. No estado, existe a lei 24.031, que garante incentivo aos municípios de Minas para o tratamento de fibromialgia pelo Sistema Único de Saúde (SUS), mas nenhuma lei de proteção aos direitos das pessoas com fibromialgia. Atualmente, tramita na Assembleia Legislativa de Minas Gerais o projeto que reconhece os fibromiálgicos como pessoas com deficiência e está arquivado o que institui o Programa Estadual de Cuidados de Pessoas com Fibromialgia – PCPF-MG.

Tratamento e solidariedade 

Segundo a anestesiologista Ressala Castro Souza, o tratamento para fibromialgia é multifatorial e individual. “São muitos aspectos que afetam a vida do paciente. Ele tem que tentar alinhar todos os eixos [da vida] para tentar se encaixar melhor e poder tirar proveito do tratamento”. De acordo com a médica, o melhor tratamento é a atividade física aeróbica de baixo e médio impacto. Mas, também pode acompanhar uso de medicação, como antidepressivos e envolver outras áreas da saúde como fisioterapia, acupuntura, terapia para tratar a depressão, entre outras, mas isso depende de cada caso. 

Segundo a médica, aderir ao tratamento é o maior desafio para o paciente com fibromialgia. “Convencê-lo de que ele precisa fazer atividade física é complicado. A gente entende, ele tá sentindo dor, mas é o que tem de melhor resultado”. Ela ainda ressalta: “é um tratamento longo, demorado, tem altos e baixos e tem que ter participação do paciente”. No entanto, a falta de atividade física não é o único impedimento para as pessoas com fibromialgia aderirem ao tratamento. Os custos financeiros podem não ser compatíveis com a renda de todos os fibromiálgicos, por exemplo, na compra de remédios.

A Associação dos Fibromiálgicos do Vale do São Francisco (Afibrovasf), tem uma campanha de medicamentos que atende os membros associados sem condições financeiras para comprar as medicações. Segundo o diretor da associação, José Wilson Alencar de Oliveira, “mais de 90% das pessoas não têm condições financeiras para comprar medicamentos, é uma situação difícil que mexe muito com a gente”. Eles já arrecadaram em torno de R$5 a 7 mil em remédios e doaram às pessoas a custo zero. “A Campanha de Medicamentos começou quando uma das mulheres do grupo estava sem dinheiro para comprar o ansiolítico que precisava. “Ela pediu, ‘pelo amor de deus’, se alguém não podia oferecer dois ou três comprimidos [do mesmo remédio]. Então, eu fiz um apelo ao grupo, tinha 150 pessoas na época. A gente conseguiu para ela a doação de quase três frascos de remédio”, relembra. 

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