O potencial cultural de Belo Horizonte é reconhecido nacionalmente há anos, seja pelo sucesso de artistas locais, como as bandas Skank, o rapper Djonga e o famoso Clube da Esquina, ou pelo sotaque e pelos costumes típicos. Além de ostentar pontos turísticos com obras de Niemeyer e Burle Marx, a cidade possui outros atributos. O apelido popular de “capital dos bares” e o título de “Cidade Criativa”, atribuído pela UNESCO, em 2019, em função de sua gastronomia, são exemplos disso.
O arquiteto Felipe Martins, 37 anos, e o administrador Guilherme Pertence, 35, sentiam que faltava em BH um lugar que transformasse a cultura urbana em algo palpável, como os artefatos que os turistas costumam levar de lembrança para parentes e amigos. A dupla, então, teve a ideia de empreender na área, e assim surgiu a loja “Made in Beagá”, inaugurada em março de 2016. Os produtos criados e comercializados pelos dois, que vão de roupas a artigos de papelaria, são inspirados na capital mineira. Inicialmente, as vendas eram virtuais, mas há dois anos eles abriram a loja física no Mercado Novo, na região central. Nesta entrevista, Felipe conta sobre essa trajetória.
Guilherme (de calça bege e blusa preta) e Felipe (de calça jeans e blusa branca) criaram empreendimento ao identificar demanda por souvenirs de BH
(Imagem: Eduardo Costa - #PraTodosVerem os sócios Guilherme, usando um boné preto e branco com o escrito "beagá" em letra cursiva, relógio e pulseiras pretos, quatro anéis, calça bege e camiseta preta, escorado em uma bancada sorrindo, e Felipe, usando calça jeans e camiseta branca com o desenho uma capivara andando de skate e a frase escrita "I [coração] BH", sentado sob a bancada sorrindo. Ao fundo, uma parede com quadros de paisagens fotografadas.)
Colab – De onde surgiu a ideia de criar uma loja com produtos referentes a Belo Horizonte?
Felipe – Tivemos a ideia quando participamos do Savassi Festival e fizemos amizade com duas meninas francesas. Compartilhamos muitas experiências sobre Belo Horizonte e a França. Em um momento da conversa, elas nos pediram sugestões de lugares para comprar coisas referentes à nossa cidade, porque queriam levar de lembrança. A partir daí, percebemos que, apesar de BH ter uma cultura tão rica, não tínhamos isso explícito em produtos, então começamos a pensar no projeto. Inicialmente, seria apenas um blog, que, eventualmente, se tornaria uma loja. Depois, invertemos a ordem. Hoje temos a loja física e o blog com dicas da cidade.
Vocês acham que o projeto tem contribuído para a potencialização da cultura mineira?
Eu acredito que, criando produtos referentes à cultura belo-horizontina e fazendo parcerias com produtores locais, criamos uma relação com o produto e nos sentimos parte dessa cultura. Eu e o Gui brincávamos muito: “Eu tenho um quadro de Paris e nunca pisei na França”, ou “Tenho uma camiseta de surfing e nem sei surfar”, então, por que não ter referências nossas, do lugar onde nós vivemos? Com o caminhar do nosso trabalho, percebemos que existe um público que ama e se identifica com BH. Ao mesmo tempo, há pessoas que estão conhecendo a cidade por meio da nossa loja.
Vocês costumam fazer parcerias com outros empreendedores de Belo Horizonte. Em um ambiente que geralmente é competitivo, que aspectos positivos a união de forças pode gerar para os negócios?
A parceria é uma soma de forças. Nós pegamos o que aquele parceiro pode oferecer de melhor e juntamos com a nossa visão de cidade, marca, conjunto e curadoria. Fazemos um branding [trabalho de gestão de uma marca] e elevamos o conceito a um novo patamar. O “Azulejo Pampulha”, por exemplo, criamos em parceria com uma professora de cerâmica, que conhecemos na Feira Hippie. Ela já tinha esse trabalho inspirado no azulejo presente em três construções ao redor da lagoa. Desenvolvemos uma série de ilustrações e a convidamos para reproduzi-las, utilizando a mesma técnica. É fundamental, porque não detemos conhecimento de tudo.
Recentemente vocês lançaram produtos referentes aos doces de BH, com a participação de lojas tradicionais da cidade, como a Lalka. Qual foi a inspiração desse projeto e que impacto tem gerado?
Essa inspiração veio a partir do nosso conhecimento sobre a culinária de fora, principalmente a francesa. Pensamos que seria interessante fazer algo voltado para a cultura belo-horizontina, mas buscando fugir um pouco do óbvio, como o queijo com goiabada e o doce de leite. Procuramos quais eram os doces mais tradicionais da cidade e quem são as pessoas que os fabricam. Alguns já conhecíamos, outros corremos atrás. Os donos de lojas se sentiram homenageados e ficaram muito gratos pelo projeto, ainda mais em um momento de pandemia, em que as vendas caíram. De certa forma, a nossa divulgação do trabalho traz uma visibilidade diferente para o local.
Vocês têm algum produto “favorito” na loja?
O produto mais recente costuma sempre ser o favorito, mas, existem projetos dos quais nos orgulhamos muito, como uma grande ilustração de BH que fizemos em parceria com o ilustrador Estevam Gomes. Alguns produtos da loja foram criados a partir dela, e foi uma experiência muito satisfatória.
Qual foi o impacto da pandemia no negócio de vocês?
Basicamente houve uma redução nas vendas, mas não tivemos um prejuízo muito grande, porque temos um custo fixo e conseguimos manter as vendas online.
Em algum momento, vocês passaram por alguma situação e pensaram em desistir do projeto?
Não. Sempre trabalhamos pouco a pouco e mantemos os pés no chão, com produções muito bem pensadas. Tudo o que temos visto, desde então, é uma crescente.
Conte três experiências inesquecíveis que o Made in Beagá proporcionou a vocês.
Uma delas foi no edifício Acaiaca. Não foi bem sucedida. Nós fomos convidados para participar de um evento para apresentar o último andar do edifício. Porém, o evento “estourou” e as duzentas pessoas convidadas se tornaram duas mil. Tivemos que cancelar, porque o ambiente não comportava tanta gente. Outra coisa foi a inauguração da nossa loja física. Era nosso sonho, mas não tínhamos ideia de quando isso seria uma realidade. Quando tivemos a oportunidade, fizemos acontecer. Por fim, quando participamos do Pampulha Noturno. Ali conseguimos criar uma atmosfera, fazer as pessoas curtirem os equipamentos ao redor da lagoa e o nosso produto.
O perfil da loja no Instagram tem quase 45 mil seguidores, e os produtos de vocês já foram usados até no BBB, no horário nobre da Rede Globo. Quando criaram a loja, vocês imaginavam que daria tão certo?
Não. Tínhamos a certeza de que seria uma excelente ideia, mas não sabíamos se teríamos tanta disposição para fazer tudo acontecer. Existe muita paixão por BH e pelo projeto, temos conquistado muitas coisas por conta disso.
Como vocês imaginam que o Made In Beagá estará daqui a cinco anos?
Talvez seremos um centro cultural em BH. Isso já acontece na loja, mas poderá ser algo maior, como nos tornarmos um novo ponto turístico da cidade.
Conteúdo produzido por Amanda Pena, Anna Paim e Cler Santos, estudantes de jornalismo da PUC Minas