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Epidemia de desinformação

Imagem meramente ilustrativa via Pexels

Assim que cheguei em casa, segui em direção ao banheiro clamando por um banho quente. O dia, mais uma vez, não havia sido nada fácil. Somando-se aos incontáveis dias anteriores, eu estava exausta do trabalho. Com tanta coisa acontecendo no Brasil e no mundo nesses últimos meses, meu papel de checagem na agência ficou mais essencial que nunca.

Desmentir as notícias falsas tinha se tornado um pesadelo nos últimos  quatro anos, quando a prática de disseminação de fake news se tornou massiva e descontrolada. Tentei parar de pensar um pouco nisso e fui direto pro chuveiro. 

Esperava visitar meus pais em minha cidade natal no feriado que viria. Já que estava pegando um pijama para vestir, tirei também algumas outras roupas do armário para fazer minha mala. Com a pandemia de covid-19, não consegui viajar para ver minha família, então, agora que a situação está mais controlada, quero aproveitar todas as chances possíveis para encontrá-los. 

Enquanto arrumava a mala, liguei a TV e deixei que o som do noticiário invadisse meu apartamento sempre silencioso. Fui à cozinha e coloquei ração para meu gato, que provavelmente estava enfiado em alguma caixa de papelão ou embalagem de presente no quarto ao lado. Não entendo como ele prefere brincar com essas coisas, sempre compro brinquedos. “Vai entender o que se passa naquela mente felina”, pensei alto. 

De repente, ouvi algo que me puxou para fora dos pensamentos sobre gatos e brinquedos. Era a voz da repórter na televisão no meu quarto: “Foi confirmado o primeiro caso da varíola dos macacos no Brasil, em São Paulo”.

Andei em direção ao quarto para ouvir o restante da notícia. Assim que o jornal acabou, sentei na cama e comecei a pesquisar mais sobre a tal doença que já estava sendo comentada há algumas semanas.

Meu celular tocou enquanto eu me preparava para uma longa noite. Era Bruno, meu colega de trabalho. Atendi e escutei sua voz como sempre efusiva e agitada.

– Alô? Tudo bem, Verônica? Desculpa o horário mas acabei de ver a notícia sobre o caso da varíola em São Paulo, você viu? – perguntou apreensivo.

– Oi Bruno, estou bem e você? Eu vi, sim. Já estava até dando uma pesquisada para… – não consegui terminar a frase, Bruno me atropelou com seu falatório.

– Pois então, já sabe né? Amanhã os grupos de Whatsapp e o Twitter vão estar transbordando de informações falsas e vai sobrar para nós a trabalheira de confirmar o que é verdade ou não. Eu vou te contar uma coisa, viu? Quando penso que vou aproveitar o feriado, me aparece essa. Já não basta ser ano de eleições. Brasileiro não tem um dia de paz!

Olhei, desiludida, para minha mala semi-feita do outro lado da cama enquanto Bruno despejava seu desespero em meu ouvido. Finalizei a ligação dizendo que na manhã seguinte nos reuniríamos como Batman e Robin no combate ao crime, mas, no nosso caso, lutaríamos contra as notícias falsas que circulariam com toda certeza sobre o novo surto da doença. Encerrada a ligação, decidi deixar a pesquisa para o dia seguinte, coloquei a mala no chão, num canto do quarto, e me deitei, sonhando com a viagem, mais uma vez adiada.

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