Vou começar essa crônica dizendo que menti: essa não foi a minha primeira vez em um estádio de futebol. Já tinha ido antes, quando era mais novo, mas não me lembro direito, e, por isso, me sinto no direito de dizer que essa foi a minha primeira vez.
Era uma terça-feira à noite e meu irmão mais velho me ligou me convidando a ir assistir com ele a um jogo do Galo na Arena MRV. O jogo era pouco importante: Atlético Mineiro contra Juventude, do Rio Grande do Sul. Nenhum dos dois times está sequer perto de ser campeão do Brasileirão. Pelo que apurei (perguntando ao meu irmão minutos antes de começar a partida) o Galo está em 13º lugar na tabela. O Juventude… nem sei. Quis ir pela experiência e para passar um tempo com meu irmão. Confesso que um convite para o cinema teria me instigado mais, mas quis viver uma miniaventura.

Como homem gay, sempre achei o futebol um contexto meio hostil. Na escola, odiava jogar futebol na aula de educação física e não me interessava em acompanhar os placares do Campeonato Brasileiro durante o ano. Estava mais interessado nos desfiles da Victoria’s Secret e nas músicas da Beyoncé. Todas essas questões clichês entre a homossexualidade e o esporte – especialmente o futebol – me afastaram de qualquer possibilidade de interesse nesse tipo de entretenimento.
Enfim, com essa bagagem encontrei meu irmão e #PartiuArena. No caminho, pegamos um motorista de aplicativo que também era atleticano. Ele também ia assistir ao jogo na Arena naquele dia. Pegou uma corrida para otimizar o tempo e lucrar um pouco (#capitalismo). Meu irmão e ele comentavam sobre a escalação e essas coisas que não sei falar sobre… eu só pensava: “Onde eu fui me meter?”. O que mais me animava era o tropeiro que eu ia comer antes do jogo. Todos os meus colegas do trabalham falaram que é uma delícia e já tinha passado da hora da janta.
Chegando lá, já fiquei impressionado com a tecnologia do estádio. A entrada é por reconhecimento facial e quase não peguei fila. O ambiente estava completamente dominado por homens héteros, mas eu não me senti pressionado. Pareciam todos animados com a partida e eu comecei a ficar também
Senti como se eu fosse um ator, porque eu estava com uma camisa do Galo que tinha pegado emprestada do meu irmão. Acho que ninguém desconfiou que eu era um impostor. Entramos no estádio e eu já fui logo pegando minha comida. Estava uma delícia – e não é publi. Antes da partida, a mascote do Galo, o famoso Galo Doido, apareceu no campo e começou a fazer umas palhaçadas que me animaram para a partida.
Eu olhei ao redor e o ambiente estava mais diverso do que achei que estaria. Havia muitas mulheres e crianças. Todas as pessoas eram bem educadas e eu me senti seguro. Comecei a reparar em quantos casais estavam por lá, e eram muitos. No entanto, a coisa que mais me intrigou foi a quantidade de pessoas bebendo em plena quarta-feira… ninguém fica de ressaca?
O jogo começou e eu, obviamente, estava torcendo para o Galão da Massa – o time do meu irmão. Por incrível que pareça, eu fiquei muito entretido. Os passes, as faltas, os cartões amarelos e os quase-gols aceleravam meu coração. Os 45 minutos do primeiro tempo passaram voando e eu estava doido para viver a emoção de um gol no estádio, o que não aconteceu: o jogo ficou 0x0.
O que eu achei engraçado foi o conteúdo do grito da torcida. Algumas pessoas perto de mim gritavam dicas para os jogadores e xingamentos para o juiz… como se eles fossem ouvir. “Toca pro fulano!”, “Ciclano tá livre aqui!”, “Você não tem mãe?” eram algumas falas recorrentes. No entanto, nem tudo são flores, ouvi bastante xingamentos homofóbicos também… menos do que eu esperava e temia, mas, ainda assim, é uma coisa que parece estar enraizada no DNA do futebol – infelizmente.
Segundo tempo: mais emoção. Eu me peguei ansioso e querendo uma vitória para o meu lado. Já tinha me permitido curtir a experiência e estava querendo muito ver um gol. Ver os jogadores de perto e as dinâmicas do time me fizeram perceber que o futebol é, sim, interessante. Tem uma ciência por trás dele, e, acima de tudo, muito investimento. É tudo feito para cativar nossa atenção e provocar emoções adversas e viscerais. Quase gritei em uma bola-fora.
Com as explicações em tempo real do meu irmão, pude entender um pouco da estratégia dos times e perceber o porquê de existirem tantos programas jornalísticos acerca desse tema. São muitas possibilidades de partida e de jogadas, por isso, tanta gente tem tantas opiniões. A maioria delas sem fundamento e estudo nenhum – como na maioria das outras coisas. Mas o fato é que uma partida nem tão importante dá muito pano pra manga. Não consegui comparar uma partida a nada que eu tenha disponível no meu universo de referências.
Na saída, encontrei uma amiga querida da minha sala da faculdade e dividimos a corrida de volta para casa para ficar mais em conta (#capitalismo). Ela veio comentando a partida com meu irmão e eu, mais uma vez, escutando, tentando decifrar alguns códigos dessa ciência complexa chamada Futebol.
O que eu levo dessa experiência é uma sensação de perda. Sinto que as barreiras que foram colocadas entre mim e o futebol por ser uma criança afeminada me tiraram uma forma de entretenimento que une o Brasil, mas ainda exclui minorias. Ao mesmo tempo, guardo também uma grata supressa de um momento de diversão com meu irmão. Uma quebra de expectativa no bom sentido. Por hora, me percebo mais interessado no futebol, mas não mais que na próxima temporada de RuPaul’s Drag Race. #rsrsrs